O juiz Allan Martins Ferreira, da 4ª Vara Criminal de Palmas, decidiu por volta das 17h56 desta segunda-feira, 20 de março, que a denúncia e o pedido de prisão preventiva do ex-governador Mauro Carlesse (Agir), delegados e policiais acusados de armar um falso flagrante por tráfico de drogas contra um desafeto do político deve ser julgada em Gurupi. 

Denunciados em dezembro, até hoje a denúncia não foi recebida. Inicialmente, a ação foi endereçada primeiro para a 1ª Vara Criminal de Palmas, que julga outra ação decorrente da Operação da Polícia Federal, mas, ao ser autuada no sistema eletrônico acabou vinculada à 3ª Vara Criminal. A 3ª Vara Criminal, por sua vez, se declarou incompetente para decidir pelo recebimento da denúncia, pois quatro dos alvos são acusados de terem cometido o crime de tráfico de drogas, que é de responsabilidade da 4ª Vara Criminal, onde atua o juiz Allan Ferreira, que também declinou a competência sobre o caso.

Em dezembro, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público do Tocantins (MPTO) denunciou e pediu a prisão preventiva do ex-governador, que se estendem a três policias civis já recolhidos preventivamente pela Operação Caninana, que investiga suposto grupo de extermínio por agentes policiais. Nesta situação está o delegado Enio Wálcacer Oliveira Filho, 42 anos, os policiais civis Antônio Martins Pereira Júnior, identificado como “A. Júnior” (38) e Carlos Augusto Pereira Alves, o “Bolinha” (38), todos recolhidos preventivamente na sede do Batalhão de Operações Especiais (Bope) em Palmas.

Os demais alvos da denúncia e pedido de prisão preventiva são o policial civil Santhiago Araújo Queiroz de Oliveira (40), o escrivão da Polícia Civil Victor Vandré Sabará Ramos (39) e os agentes José Mendes da Silva Junior (38), Marcos Augusto Velasco Nascimento Albernaz (44), que estava lotado como assessor especial da Governadoria, e Ricardo José de Sá Nogueira, o “Pernambuco” (49), vários deles, inicialmente lotados na Delegacia de Narcóticos (Denarc ) de Palmas, que tinha como delegado titular Enio Wálcacer.

Eles são acusados de formar uma organização criminosa entre abril e junho de 2020, de conduzir uma investigação policial clandestina sobre um suposto caso extraconjugal da então ex-primeira-dama do Estado e de traficar cocaína de Palmas a Gurupi, para forjar um flagrante, por tráfico de drogas, contra um DJ apontado como responsável pela divulgação do vídeo com cenas da suposta traição. O caso apareceu durante a Operação Éris, da Polícia Federal, que investigou o aparelhamento da Polícia Civil no governo de Carlesse, em outubro de 2021.

Para o Ministério Público, Carlesse, Enio Wálcacer, Bolinha e Júnior “associaram-se para o fim de praticar o crime de tráfico de drogas”. Esta parte se refere à droga que teria sido plantada na moto e em um vaso de planta da casa do DJ.

Competência pelo crime de maior pena, decide Allan

Para o juiz, a “prática e os atos executórios da ocorrência do crime de tráfico de drogas se deram na comarca de Gurupi” e o artigo 70 do Código de Processo Penal prevê que a competência para julgar um crime será determinada “pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução”.

O juiz também afirma que o entendimento do Supremo Tribunal Federal é que em caso de haver mais de um juízo para a mesma categoria de crime,  prevalece a que é responsável pela infração com pena elevada.

“Nesse sentido, no caso em concreto, entre os delitos tipificados na denúncia, o crime de tráfico de drogas ocorrido na comarca de Gurupi, possui pena em abstrato mais elevada, local este, mais adequado para a instrução do feito”.

Relembre a denúncia do falso flagrante

Assinada por cinco promotores, a denúncia afirma que após a divulgação do vídeo da ex-primeira-dama, Carlesse usou o aparelhamento estatal para descobrir os responsáveis pela produção e divulgação do vídeo em redes sociais.

Conforme a denúncia, por determinação do ex-governador, policiais militares ligados à Casa Militar, um agente da Polícia Civil lotado na Governadoria e agentes distribuídos pela Secretaria de Administração, Secretaria da Segurança Pública, Núcleo de Inteligência do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) e Delegacia de Narcóticos (Denarc) iniciaram a investigação para descobrir o autor do vídeo, sem nenhum procedimento oficial, ou seja, de forma clandestina.

Na deflagração da Operação Éris, policiais federais encontraram celulares do suposto amante e a mulher dele, moradores de Gurupi, ilegalmente apreendidos na operação clandestina, além de relatórios e outros documentos relativos ao caso, em poder de Mauro Carlesse em um cofre dentro do Palácio Araguaia, sede do Executivo. Um dos relatórios, segundo a Polícia Federal, foi criado pelo escrivão Victor Sabará.

Um HD também apreendido continha pelo menos 9 arquivos de áudio, de escutas ambientais, com os “interrogatórios” de alvos dos policiais, entre eles a mulher e o marido dela, suspeito de ter tido o caso, o pai dele.

Conforme a denúncia, os agentes utilizaram uma caminhonete reservada pela Governadoria para ir a Gurupi diversas vezes para monitorar o DJ, afirmam os promotores. O veículo era abastecido com a senha do policial Bolinha. Em uma dessas viagens, os envolvidos levaram drogas e ocultaram porção de cocaína na carenagem da motocicleta do DJ e porções de cocaína, de maconha e uma balança de precisão, em um vaso de planta no quintal da casa do DJ. Por esta ação, para o Ministério Público Carlesse, Enio Wálcacer, Bolinha e Júnior “associaram-se para o fim de praticar o crime de tráfico de drogas”.

De acordo com a denúncia, o agente Antônio Júnior comunicou a Polícia Militar em Gurupi sobre o suposto traficante e o DJ acabou abordado pela Força Tática. No relatório, citado pelos promotores, os militares informaram que o flagrante se baseou em informações da Denarc de Palmas.

Ernandes da Silva Araújo Júnior, o DJ Juninho, ficou preso por 13 dias, após o flagrante, concretizado dia 11 de junho de 2020, um mês depois da criação do núcleo de inteligência do Detran. O flagrante também foi investigado pela Polícia Civil em Gurupi e o inquérito foi arquivado na semana passada após a Justiça em Gurupi decidir que não houve nenhum crime cometido pelo DJ.