O número de pessoas mortas por policiais militares e civis no estado do Tocantins aumentou 200% no período de 2018 a 2021, correspondente à gestão do ex-governador Mauro Carlesse (Agir) e do ex-secretário de Segurança Pública, Cristiano Sampaio. Os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e comparados pelo JTo.

Ano a ano, o total de mortes decorrente de intervenções policiais em serviço e fora de serviço apresentou um aumento contínuo. No ano de 2018 houve 14 mortes por policiais, em 2019 o número subiu para 16, o que dá um crescimento de 14%.

No ano seguinte, os casos aumentaram para 24, um acréscimo de 50% no comparativo. No ano de 2021, o último coletado pelo anuário, o total chegou a 42 mortes (aumento de 54%) ocasionadas por policiais, o que representa, de 2018 para 2021, um crescimento de 200% no total.

O aumento no estado vai na contramão dos dados gerais do País, que indicam queda nesse tipo de morte. Os registros caíram de 6.220 em 2018 para 6.145 no ano passado, uma diferença de -1,2%.

Para Cássio Thione, representante do Fórum de Segurança Pública, o aumento alcança questões como o ânimo no front na criminalidade. “Isso reflete que não só a polícia do Tocantins, mas do Brasil todo apresenta algum tipo de crescimento nesse índice. Então não tem como apontarmos os fatores que justificam tamanho crescimento, mas temos algumas ideias, como por exemplo, a falta de treinamento de policiais que vão muitas vezes ao confronto sem preparo”, pontua.

O especialista comenta que falta mais fiscalização do Ministério Público e das corregedorias para verificar as ações policiais. “É claro que não podemos esquecer que existe uma lei que ampara esses policiais, para que possam se defender em confrontos com criminosos, mas isso tem que ser transparente e seguindo os protocolos policiais”.

Cássio comenta que esse crescimento no estado pode ocasionar mais temor na população em confiar nas ações policiais. “Tem um discurso que diz que bandido bom é bandido morto. Será mesmo? Porque esse mesmo policial que vai e mata por qualquer motivo será que não vai se voltar para os cidadãos, e justificar qualquer crime?”, questiona.

O especialista afirma que em muitos casos no estado, como também em todo o Brasil podem ser evitados. “Existe um número muito grande de mortes por decorrência de policiais, alguns estão se defendendo, mas muitas dessas ocorrências poderiam ser evitadas”, disse.

Por sua vez, o doutor em direito Tarsis Barreto aponta algumas possíveis causas para esse aumento no estado do Tocantins. “Dentre as possíveis causas desse aumento está a política de flexibilização da posse e porte de armas de fogo promovida pelo governo federal nos últimos anos, a falta de treinamento adequado dos agentes policiais para a atuação no enfrentamento ao crime, a ausência de investimento em inteligência policial, além da adoção de políticas de segurança pública dissociadas de políticas de inclusão social para a prevenção da criminalidade. É preciso também que os direitos humanos sejam não apenas ministrados nos cursos de formação das Academias, mas verdadeiramente incorporados e internalizados nas práticas policiais”, pontua.

O especialista comenta ainda que outra temática que deve ser discutida é racismo cometido pelas unidades policiais em todo Brasil. “Considerado o perfil majoritário de vítimas da letalidade policial no Brasil (homens negros), é preciso também ampliar a discussão sobre o racismo estrutural presente na sociedade brasileira, bem como sejam desenvolvidas ações estatais que atraiam os jovens ao estudo e ao trabalho, afastando-os das drogas e do mundo do crime”, disse.

Em contrapartida, o doutor afirma que apesar desse aumento no número de mortes, os policiais também são vítimas da criminalidade. “Não se pode, por fim, esquecer que os próprios policiais têm sido vítimas da criminalidade, já que tem aumentado o número de agentes mortos em operações, o que está atrelado, sobretudo, à atual política de enfrentamento das drogas”, disse.

O que dizem os órgãos de segurança

Em nota conjunta, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) e a Polícia Militar na qual defendem que o aumento do percentual é “reflexo do crescimento do número de resistência armada por parte dos autores dos crimes, em especial, crimes contra o patrimônio”.

Além desta explicação, os órgãos de segurança ressaltaram a missão de promover a segurança pública e a paz social no Estado. Da Polícia Militar, a nota destaca a competência para o “policiamento ostensivo e da preservação da ordem”. Na Polícia Civil, o texto afirma que as investigações criminais “visam solucionar crimes contra à sociedade tocantinense”.