Atrativo garantido pela legislação eleitoral para servidores públicos, a licença remunerada para fazer campanha sem precisar dar expediente na repartição alcança até agora 336 servidores nos três poderes do Estado e Tribunal de Contas. O quantitativo representa um custo médio de R$ 2 milhões por mês, considerando os salários que cada um dos beneficiados recebeu em julho de 2020. 
 
Como são três meses de licença, o custo total deve passar de R$ 6 milhões. Os servidores deixaram os postos no dia 15 de agosto, prazo final para desincompatibilização dos cargos efetivos, até o dia da eleição, este ano adiada para 15 de novembro, em razão da pandemia de Covid-19.
 
São 326 servidores do Executivo, 5 do Judiciário e mais 2 do Legislativo e 3 do Tribunal de Contas, segundo dados levantados e confirmados pelo JTo junto à Secretaria Estadual da Administração (Secad), Tribunal de Justiça (TJTO), Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas do Estado (TCE), no Diário Oficial e nos portais de transparência. 
 
Nessa conta não entram os servidores dos 139 municípios do Estado nem os do Ministério Público do Tocantins ou órgãos federais. Há ainda uma relação de nomes com pedidos de licença ainda em análise nos três poderes do Estado, que não estão confirmados, como no governo estadual, com pelo menos mais 36 nomes.
 
No Executivo, as secretarias da Educação (38%), Saúde (21%) e Segurança Pública (14%) são as pastas com o maior número de licenciados. Entre os cargos em disputa, a maioria dos servidores (80%) vai disputar as vagas de vereador. Outros 36 (11%) se licenciaram de olho na chefia do executivo municipal, enquanto 5% assinalaram candidatura para vice, outros 3% tanto faz saírem na cabeça de chapa ou de vice e outros 2 % vão definir nas convenções dos partidos, que têm até o dia 16 para serem realizadas.
 
No Judiciário, três dos cinco licenciados são oficiais de Justiça e há ainda um técnico judiciário e um servidor cedido da Secretaria da Cidadania e Justiça (Seciju). Do Tribunal de Contas os três servidores são do Controle Externo, com dois auditores e um assistente licenciados até agora. Na Assembleia, um técnico e um agente legislativo se afastaram para disputar eleições.
 

Qualidade na gestão

Presidente do Sisepe (Sindicato dos Servidores Públicos Estaduais), Cleiton Pinheiro destaca o lado da vivência administrativa do dia a dia do servidor como fator de qualificação dos políticos. “Os servidores têm experiência com a administração pública, seja no aspecto de gestão, na área contábil, jurídica ou na área administrativa e esses servidores se candidatando e sendo eleitos, exercerão o mandato com poder maior de cobrança e de fiscalização, no caso de vereadores, ou mesmo o que se candidata ao Executivo, por ter conhecimento da administração e da máquina pública, faz com que tenha um quadro de políticos mais qualificados”.
 

Reconhecimento ou promiscuidade 

Doutor em sociologia e professor da Universidade Federal do Tocantins, Marcelo Brice destaca a legitimidade do desejo dos servidores públicos em participar nos processos políticos institucionais e a vantagem da licença remunerada garantida em lei, mas alerta para os usos eleitoreiros da atividade. 
 
 “É possível verificar uma relação genuína, mas também promíscua. Genuína pois as atividades que têm proximidade maior com o público são as com maior afastamento, o que motivaria, portanto, o reconhecimento das necessidades da população. Promíscua por isso também. Já que muitos servidores são ‘incentivados’ pelas lideranças ou caciques políticos locais a aproveitarem as licenças e figurarem como candidatos, mobilizando a sua relação com um público mais amplo e trabalhando para elegerem os verdadeiros interessados – os que estão no topo da lista de elegíveis”, avalia. 
 
Ele também pondera sobre os riscos de alguns não conseguirem a aprovação em convenção e seu retorno ao trabalho. “Importa que os que tiraram licença e não foram confirmados candidatos retornem aos seus postos e os que confirmados façam o papel que o processo eleitoral tem de mais significativo: formação política emancipadora. ”
 

Fiscalização para coibir fraudes

A promotora eleitoral Isabelle Rocha Valença Figueiredo demonstra preocupação com possíveis fraudes de servidores que pedem licença remunerada para se candidatar, sequer fazem campanha, e continuam recebendo remuneração. 
 
“O Ministério Público eleitoral analisará desde as convenções partidárias e se o servidor foi escolhido, o registro de candidatura do servidor na Justiça Eleitoral, e, notadamente, os gastos de campanha, o quantitativo de votos recebidos e a verificação da prática de uma campanha efetiva”, afirma. 
 
“Candidaturas fraudulentas não serão concebidas e as investigações serão rigorosas”, assegura a fiscal da lei. Isabelle afirma que se fica constada fraude nas candidaturas de servidores, há possibilidade para aplicação da lei de improbidade e mesmo criminal. 
 
“O servidor que realiza candidatura fraudulenta pratica ato de improbidade administrativa, e está sujeito a sanções como a perda da função pública, pagamento de multa, ressarcimento aos cofres públicos dos valores recebidos indevidamente e proibição de contratar com o Poder Público e de receber incentivos fiscais ou creditícios em instituições financeiras. Além disso, pode vir a incidir na prática de crime, o que, em último caso, pode ensejar uma pena de prisão”.

Confira os servidores do Executivo.