Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou a restrição de acesso de partidos e candidatos à segunda fase de distribuição das sobras eleitorais, que são as vagas não preenchidas nas eleições proporcionais. Com a decisão proferida na noite do dia 28 de fevereiro, todos os partidos participarão da última etapa de distribuição dessas vagas, anteriormente reservada apenas àqueles que alcançavam a cláusula de desempenho.

Prevaleceu, por maioria, o entendimento de que a aplicação da cláusula de desempenho, que exigia que os partidos atingissem 80% do quociente eleitoral e os candidatos 20%, na última fase da distribuição de vagas, impediria a ocupação de lugares no parlamento por partidos menores e por candidatos com votação expressiva.

Também por maioria, foi declarada pelo pleno a inconstitucionalidade de uma norma do Código Eleitoral, introduzida pela Lei 14.211/2021, e de uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que estabelecia que, caso nenhum partido alcançasse o quociente eleitoral, as vagas seriam preenchidas pelos candidatos mais votados. Neste caso, o entendimento foi de que essa regra comprometeria a proporcionalidade nas eleições parlamentares.

Ainda, decidiu o colegiado de ministro que a aplicabilidade decisão terá vigência apenas a partir das eleições de 2024 e não afetará o resultado das eleições de 2022.

O Que São As Sobras Eleitorais?

Nas eleições para os cargos do Poder Legislativo - deputados e vereadores, o sistema eleitoral é proporcional, diferente da eleição majoritária, para a escolha de prefeitos, governadores e presidente.

Na eleição pelo sistema majoritário, o candidato com a maior quantidade de votos é o vencedor.

Já na proporcional, o eleitor tem a opção de votar no partido ou no candidato, sendo que o voto no candidato é contabilizado também para o partido.

Além disso, a eleição pelo sistema proporcional incorpora uma característica específica: a utilização do quociente eleitoral, um número calculado pela Justiça que considera a quantidade de eleitores e de vagas em disputa.

Quanto aos termos técnicos, o quociente eleitoral é obtido pela divisão dos votos válidos pela quantidade de vagas a serem preenchidas, enquanto o quociente partidário, que determina o número de vagas de cada partido, é calculado pela divisão do total de votos da agremiação pelo quociente eleitoral.

O quociente eleitoral define a quantidade mínima de votos necessária para que um partido possa eleger um candidato. Caso o partido alcance esse valor uma vez, terá o direito de eleger o candidato mais bem votado. Se atingir esse quociente duas vezes, poderá eleger seus dois candidatos mais votados, e assim por diante.

A problemática reside no fato de que a soma dos votos recebidos por todos os partidos não representa o número exato do quociente eleitoral; trata-se de um número não inteiro, razão pela qual surge a necessidade de se contabilizar as sobras.

Para entendimento, apresenta-se um exemplo prático.

Suponhamos que a cidade “A” teve o total de 250 mil votos válidos para as 10 vagas do legislativo naquele município.

Depreende-se que o quociente eleitoral obtido na cidade A é 25 mil.

Os partidos 1 obteve 125 mil votos: elegeu 5 vereadores. O Partido 2 obteve 75 mil votos e, por isso, pode eleger 3 dos seus candidatos mais votados.

Contudo, os partidos 3, 4 e 5 não conseguiram o quantitativo de 25 mil votos – quociente eleitoral, logo, há uma sobra de 50 mil votos.

STF decide acerca das sobras e distribuição das vagas.

No que se refere à distribuição de vagas, a legislação estabeleceu três fases. Inicialmente, as vagas são destinadas aos partidos que atingiram 100% do quociente eleitoral e preenchidas pelos candidatos com votos igual ou superior a 10% desse quociente.

Na segunda fase, que abrange a distribuição das sobras, participam os partidos com pelo menos 80% do quociente eleitoral e os candidatos com votação igual ou superior a 20% desse quociente.

Se ainda houver vagas remanescentes, a lei determina que as cadeiras sejam distribuídas aos partidos com as maiores médias. Neste ponto, a maioria do colegiado entendeu que, para garantir a conformidade com a Constituição Federal, é necessário permitir a participação de todas as legendas, independentemente de terem alcançado a cláusula de desempenho.

Como fica a Câmara dos Deputados?

Além de votarem acerca da constitucionalidade da da lei 2021 sobre a distribuição das sobras em eleições proporcionais, o STF também formou maioria pela aplicabilidade da norma apenas a partir das eleições de 2024.

Se prevalecesse o entendimento proposto inicialmente pelo Relator da ADI, ex-ministro Ricardo Lewandowiski, os seguintes deputados perderiam os mandatos: Silvia Waiãpi (PL-AP); Sonize Barbosa (PL-AP); Goreth (PDT-AP); Augusto Pupiu (MDB - AP); Lázaro Botelho (PP- TO); Gilvan Máximo (Republicanos-DF) e Lebrão (União Brasil-RO)

Portanto, a decisão não afetará a atual composição da Câmara dos Deputados do Congresso Nacional.

Dhiogennes Araújo, advogado eleitoralista e assessor jurídico parlamentar, formado no Centro Universidade Luterano de Palmas, pós-graduado em Direito e Gestão Eleitoral pelo Instituto De Direito Aplicado ao Setor Público (IDASP) e pós-graduado em Direito e Processo Civil pela Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS).