O maior clássico da ciência política brasileira é o livro “Os Donos do Poder”, do saudoso membro da Academia Brasileira de Letras Raimundo Faoro. Passados mais de meio século dessa publicação ainda se mantêm vivas as lições contidas nessa obra seminal.
 
O esforço intelectual do autor em compreender o desenvolvimento político brasileiro continua atual nas reflexões do vultoso mestre, que foi nitidamente influenciado pelas ideias do grande filosofo Max Webber. Em “Os Donos do Poder”, Faoro reconstitui       a história política do Brasil como nação.
 
Para explicar os vícios do Estado brasileiro, culturalmente atrelado ao patrimonialismo, Faoro reconstitui a formação histórica do país bem antes de sua descoberta. Para isso, volta aos tempos da Dinastia de Avis, que se deu a partir do ano de 1385, em Portugal.
 
O  extraordinário fôlego intelectual do autor vai construindo, peça por peça, nosso quebra-cabeça histórico até chegar na inferência de conceito que se mostrou constante na histórica política do país: o “estamento burocrático”.
Para esse imortal da Academia Brasileira de Letras, o “estamento burocrático comanda o ramo civil da administração e, dessa base, com o apadrinhamento próprio invade e dirige a esfera econômica, política e financeira”.
 
É a partir do estamento que se forma algo que persiste na cultura política do país desde o Brasil colônia: o patrimonialismo daqueles que se julgam os donos do poder.
 
O Estado patrimonial é a face mais visível da invasão do público pelo privado, do Estado pela família. Com essa obra, Raymundo Faoro entrou para um time muito seleto da intelectualidade brasileira, que é integrado pelo economista Celso Furtado, pelo sociólogo Gilberto Freire e pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda, este pai do cantor Chico Buarque. O grupo em questão entrou para história como sendo composto pelos intérpretes do Brasil.
 
Recorri, então, à obra-prima os “Donos do Poder” para refletir quanto ao afastamento, por 180 dias, do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel. Sua extrema ambição e sua constatada inexperiência na vida pública o levaram a cometer erros básicos.
 
O primeiro deles foi trair seu criador, no caso, a família Bolsonaro. Esse erro é imperdoável para quem almeja sobreviver na vida pública.
É como disse um velho e experiente político mineiro que, como ninguém, soube quadrar os círculos: Tancredo Neves. Para ele, “a política adora uma traição, mas é implacável com os traidores”.
 
A ambição desmedida desse ex-juiz federal o levou a tentar imitar o caminho trilhado pelo presidiário e ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral. Alicerçado em robustas provas, Wilson Witzel foi afastado temporariamente, por 180 dias, do cargo que ocupa. Duvido que ele volte. Morto politicamente, o afastado governador do Rio de Janeiro é um caso desastrado de dono do poder. Certamente, sairá da vida pública direto para o lixo da história.