“Nada grandioso entra nas vidas dos mortais sem uma maldição”
Sófocles
Profissionais da tecnologia da informação que contribuíram na construção do que hoje é o Facebook, Twitter, Instagram, Google, YouTube, etc., chegaram à seguinte conclusão: “fomos ingênuos e nossas criações ganharam vida própria”. 
Não é novidade que o mundo virtual nos engana. No entanto, o documentário “O Dilema das Redes”, da Netflix, descreve em detalhes como se dá a manipulação a que somos submetidos, tal qual ratazanas de laboratório. 
As engrenagens virtuais conseguem fazer com que o usuário fique o maior tempo possível na plataforma de uma rede social, enquanto empresas fazem seus anúncios. Este sistema alimenta o usuário com notícias, entretenimento, publicidade, rostos bonitos e padronizados, graças aos algoritmos que analisam a preferência de cada usuário. 
Pessoas estão viciadas pelos seus dispositivos eletrônicos. O professor de economia norte-americano Edward Tufte, sintetiza isso através da frase: “Existem apenas duas indústrias que chamam seus clientes de usuários: a de drogas e a de software.” Funciona como uma droga, há uma liberação de dopamina como recompensa. O estímulo é projetado em cima de algo que você já queria e a Inteligência Artificial (AI) identifica e entrega, através de novos conteúdos, vídeos e imagens sugeridos pela própria plataforma.
Cirurgiões plásticos norte-americanos identificaram uma nova síndrome: Dismorfia do Snapchat, adolescentes estão procurando cirurgias para ficarem parecidos com suas fotos com filtros. As mídias sociais desestabilizam a autoestima, levando a geração mais nova a buscar aprovação social padronizada, mesmo que bizarra. Uma galera ansiosa e deprimida, tentando construir uma existência através da perfeição ilusória, sendo recompensada com likes, emojis e mais seguidores. 
Ainda não acabou! A distorção da verdade continua, desta vez, no campo político. Desçamos mais um degrau na desgraça: às informações falsas que são disseminadas pelas mídias sociais, visando alcançar quem está disposto a acreditar e a propagar a ignorância. O documentário cita o resultado da eleição de 2018 no Brasil, um grande feito graças as fakes news, que tem a capacidade de se espalhar seis vezes mais do que notícias verdadeiras. Como alguém pode acreditar em absurdos do tipo: negação do aquecimento global ou qualquer outra teoria da conspiração? A resposta é simples: nem todos os usuários das mídias sociais têm acesso ao mesmo conteúdo. A Inteligência Artificial direciona os conteúdos virtuais de acordo com a preferência de cada um. Quando o indivíduo está clicando em seus conteúdos preferidos, os algoritmos monitoram cada ação sua, analisando o seu perfil sem supervisão humana. 
Daí a origem dos discursos absurdos que são defendidos como racionais, além da disseminação do ódio e da intolerância. A fala do senador da Flórida Marco Rubio sintetiza o que estamos vivendo: “Somos uma nação de pessoas que não conversam mais umas com as outras, que desfizeram amizades por causa de escolhas políticas, que se isolaram para assistir só aos canais que dizem que temos razão.”
Portanto, esses produtos tecnológicos não foram criados visando o bem-estar da criança ou do adolescente, eles foram criados para gerar algoritmos. Os protagonistas de “O Dilema das Redes” alertam que as pessoas estão sendo manipuladas, criando hábitos inconscientes, com incapacidade de enfrentar o mundo real. Tristan Harris, ex-designer ético do Google, defende a inclusão de um “design ético” aos produtos tecnológicos. Caso isso não ocorra, o escritor Jaron Lanier, que também participa do documentário, sentencia: “Se continuarmos com a rotina atual por mais 20 anos, provavelmente, destruiremos nossa civilização através da ignorância, não combateremos o aquecimento global, destruiremos as democracias do mundo e as transformaremos em uma autocracia disfuncional, arruinaremos a economia global e não sobreviveremos”