O ano de 2024 guarda a característica de ser um ano eleitoral. Sendo assim, necessário se faz uma atenção redobrada nas jurisprudências dos Tribunais Superiores, tendo em vista sua plena aplicabilidade no pleito municipal deste ano. 

Posto isto, cabe aqui comentar sobre recente decisão do Supremo Tribunal Federal - STF, do dia 26 de abril de 2024, que fixou a seguinte Tese de Repercussão Geral de número 979:
“(i) No processo eleitoral, é ilícita a prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e com violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores, ainda que realizada por um dos participantes, sem o conhecimento dos demais. (ii) A exceção à regra da ilicitude da gravação ambiental feita sem o conhecimento de um dos interlocutores e sem autorização judicial ocorre na hipótese de registro de fato ocorrido em local público desprovido de qualquer controle de acesso, pois, nesse caso, não há violação à intimidade ou quebra da expectativa de privacidade.” 

Dessa forma, a Corte Constitucional decidiu declarar de uma vez por todas como ilícitas as gravações ambientais clandestinas para fins eleitorais, salvo em ambiente público sem controle de acesso. 

Para fins explicativos, gravações ambientais clandestinas seriam aquelas registradas por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, com intenção de produzir prova. Inclusive, existe a Tese de Repercussão Geral de número 237 que permite a utilização da gravação ambiental clandestina para fins de exercício da defesa na busca da verdade dos fatos sem que configure crime ou qualquer outro ilícito: 

“É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro.”. 

Mas com o passar dos anos, ficou a indagação: como aplicar essa tese no âmbito eleitoral, que guarda peculiaridades que conduzem à solução jurídica distinta da que foi fixada na Tese de Repercussão Geral 237? 

Atento às singularidades do processo eleitoral, o STF definiu a Tese de Repercussão Geral 979 baseado no entendimento de que no ambiente eleitoral, o espaço acirrado pelas disputas políticas poderiam desvirtuar o permissivo para gravação ambiental em um arranjo prévio para induzir ou instigar um flagrante preparado, o que ensejaria a imprestabilidade desse meio de prova no âmbito do processo eleitoral. Além do induzimento ao ilícito por parte de um dos interlocutores, haveria também a violação da intimidade e da privacidade, temas caros ao nosso ordenamento.

Ademais, a Corte Constitucional esclareceu que em ambientes públicos como bancos, centros e lojas comerciais, ou mesmo nas ruas, a gravação ambiental de segurança poderia constituir prova válida no processo eleitoral, pois, dessa perspectiva, em razão da perda do caráter de clandestinidade, não haveria como se cogitar de violação da intimidade em local aberto ao público. No sentido oposto, entende-se que caso a gravação ambiental clandestina ocorra em ambiente privado com controle de acesso, suscetível de ser palco de uma armação, o seu uso estaria expressamente proibido. 

O entendimento da Tese de Repercussão Geral 979 é vinculante a todas as instâncias da Justiça Eleitoral, com aplicabilidade desde as eleições de 2022, conforme informação extraída do site do STF. 

Kássio Henrique dos Santos Aires é advogado, mestre em desenvolvimento regional pela Universidade Federal do Tocantins (UFT).

Quer ter seu artigo ou crônica publicado no Jornal do Tocantins? Envie para o e-mail: contato@jornaldotocantins.com.br.