A governança é o conjunto de práticas, processos e estruturas que guiam e supervisionam uma organização, garantindo que ela opere de maneira eficaz, ética e transparente. É um sistema de tomada de decisões e responsabilidades que envolve diversos stakeholders, incluindo conselhos, acionistas, líderes, funcionários e a sociedade em geral.

No entanto, surge uma prática que ameaça distorcer essa premissa fundamental: o "governance washing". Este fenômeno, muitas vezes mascarado por práticas de relações públicas habilidosas, refere-se à criação de uma fachada de boa governança sem a verdadeira implementação de políticas e práticas éticas.

No governance washing as organizações buscam projetar uma imagem de governança corporativa robusta, ética e transparente, enquanto, na realidade, suas práticas internas podem não corresponder a essa representação idealizada. Estas empresas adotam um esforço deliberado para criar narrativas e símbolos que sugerem conformidade com padrões elevados de governança, muitas vezes para atender às expectativas dos investidores, clientes e da sociedade em geral.

As táticas mais conhecidas envolvem a publicação de extensos códigos de ética, nomeação de comitês de governança aparentemente robustos, divulgação de relatórios de sustentabilidade extensos e superficiais, conselhos de administração figurativos, compromissos sem ações concretas, campanhas de marketing enganosas, e até mesmo a prática do tokenismo, que é a  inclusão de indivíduos de grupos minoritários para criar a ilusão de diversidade, sem oferecer verdadeiramente oportunidades iguais ou influência substancial.

A ISO 37000:2021, marcou um avanço significativo ao estabelecer o primeiro padrão de referência para promover a boa governança e prevenir práticas como o “governance washing”. Esta norma trouxe um padrão mínimo e abrange uma série de princípios essenciais para uma efetiva governança, incluindo o envolvimento das partes interessadas, liderança, gestão de riscos, responsabilidade social, transparência, tomada de decisões baseada em dados, além de considerar a viabilidade e o desempenho.

Entretanto, por trás dessas ações, no entanto, existem lacunas significativas na implementação efetiva de práticas éticas e na responsabilidade corporativa.

Mas qual o problema do governance washing? O problema é que os stakeholders, ao confiarem na aparente governança ética da organização, podem enfrentar riscos significativos. Desde investidores que tomam decisões com base em informações falsas até clientes que apoiam uma empresa pensando em seu compromisso com a responsabilidade social.

Não tem receita mágica: para combater o governance washing, é fundamental promover uma cultura de transparência e responsabilidade corporativa, a partir de uma avaliação crítica das práticas internas, garantindo que as políticas declaradas sejam refletidas nas operações diárias e estabelecendo mecanismos eficazes de monitoramento e prestação de contas.

Por outro lado, cabe aos órgãos reguladores o importante papel de combater governance washing, ao estabelecer regulamentações claras e fiscalizar a conformidade.  A sociedade civil também, ao exigir transparência e responsabilidade, pressionando as empresas a adotarem práticas éticas genuínas e abandonarem a fachada do governance washing.

E as consequências? As consequências são devastadoras, pois empresas que foram flagradas adotando essa estratégia muitas vezes enfrentam consequências significativas, perdendo a confiança dos stakeholders e sofrendo até mesmo impactos financeiros.

As aparências enganam, mas à medida em que a conscientização sobre o governance washing cresce, espera-se que as empresas se vejam compelidas a abandonar práticas enganosas em favor de uma abordagem mais autêntica e responsável. O aumento da transparência e a demanda crescente por prestação de contas estão moldando um cenário em que a mera fachada de governança ética não é mais suficiente para manter a confiança dos stakeholders.

A pressão dos consumidores, investidores e da sociedade civil está redefinindo as expectativas em relação às empresas, exigindo não apenas declarações vazias, mas ações tangíveis e resultados mensuráveis. À medida que os stakeholders se tornam mais conscientes das práticas de governance washing, a reputação das empresas está cada vez mais vinculada à autenticidade de suas ações e ao alinhamento efetivo com os valores proclamados.

Para permanecerem relevantes e sustentáveis a longo prazo, as empresas estão percebendo a necessidade de não apenas comunicar seus compromissos com a ética e a responsabilidade, mas também de garantir que essas declarações sejam respaldadas por uma implementação real e mensurável. A conformidade superficial já não é aceitável, pois os stakeholders buscam relações autênticas com organizações comprometidas genuinamente com a governança ética.

Nesse cenário em evolução, as empresas têm a oportunidade de se destacar não apenas pelo que dizem, mas pelo que fazem. Aquelas que adotam práticas transparentes, implementam medidas concretas e corrigem as lacunas existentes entre discurso e ação estão posicionadas para construir relações mais sólidas e duradouras com seus stakeholders.

Sabe-se que a conscientização sobre o governance washing está impulsionando uma mudança cultural, onde as empresas são desafiadas a serem agentes verdadeiros de transformação ética e responsável. À medida que essa conscientização se aprofunda, a expectativa é que as empresas não apenas abandonem as práticas enganosas, mas também se tornem catalisadoras de uma governança verdadeira, transparente e alinhada com os valores essenciais da sociedade em que estão inseridas.

Danila Duarte
é mestranda em Gestão de Políticas Públicas pela UFT é formada em ciências contábeis com pós-graduação em auditoria e controladoria. Auditora Independente/CNAI. Coordenadora Regional do Compliance Women Committee no Tocantins e do Comitê de Compliance da Rede Governança Brasil. Possui certificações em Compliance Anticorrupção CPC-A e Compliance Público CPC-P. Auditora Líder na ISO 37:001 Sistema de Gestão Antissuborno e na ISO 37.301 Sistema de Gestão de Compliance. Atua como mentora para implementação de programas de integridade para prefeituras. Autora dos livros: Guia Prático do Consultor de Compliance e do livro Mulheres no Controle do CONACI. Foi uma das autoras da Cartilha para Estruturação de Programas de Integridade para Prefeituras da RGB. Currículo lattes: https://lattes.cnpq.br/7113743009012323. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7966-259X. E-mail: danila@ddcompliance.com.br.

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REFERÊNCIAS

YU, Ellen Pei-yi; VAN LUU, Bac; CHEN, Catherine Huirong. Greenwashing in environmental, social and governance disclosures. Research in International Business and Finance, v. 52, p. 101192, 2020.

ASIF, Mohammad et al. Is gender diversity is diversity washing or good governance for firm sustainable development goal performance: A scoping review. Environmental Science and Pollution Research, p. 1-16, 2023.