Luiz Armando Costa
 
Siqueira Campos completa no próximo sábado 92 anos. Deve ser um dos raros casos da política brasileira (como JK ou Pedro Ludovico) que entrará para história como criador de um Estado e uma cidade. Ainda que JK (com Brasília) não tenha criado o país, nem Ludovico um Estado com Goiânia. Referenciais que impulsionam a biografia de Siqueira a mais além. Conclusão lógica.
 
Siqueira deve, intuo, observar, do seu conservadorismo político, entretanto, com perplexidade, o pensamento obtuso de Bolsonaro na Covid-19 que prega serem os idosos as vítimas do vírus, como de fato o são (não somente eles), mas tratando a questão como destino inexorável que não é. Idosos não precisam morrer de Covid por que são idosos. Siqueira, pelo contrário, criou um programa de atendimento aos idosos.
 
Se alguém pensa diferente, basta colocar-se no plano de uma pessoa que perdeu um pai, mãe, avô para o vírus. Siqueira integra um conservadorismo pensante e, creio, guarda seu isolamento social na crise. Como diz minha mãe, não é “mouquinho da lata”. 
 
Minha mãe que toda eleição era instada a escolher em quem votar na quantidade de políticos que endereçavam-lhe cartões de natal e aniversário: Siqueira Campos. Zé Freire, José de Senna Junior, Coronel Pereira, Jarmund Nasser (eram os mais frequentes) e tantos outros que se misturavam, nos Correios, às suas correspondências com o seu procurador em Goiânia (Rosarito Martins Batista/que descobri depois ser tio da advogada e amiga Angela Marquez) que conseguiu driblar a burocracia para o seu apostilamento como porteira servente no governo de Goiás na década de 60. 
 
Vive hoje de sua aposentadoria no Igeprev, onde orgulha-se ter colocado meu pai, Augusto, como dependente do Plan-Saúde, com que conseguiu, aos 88 anos, tratar-se, com dignidade, de um câncer na garganta.
 
Uma das minhas obrigações quando, apoiado por meu pai, decidi sair de casa para estudar em Goiânia com duas mãos atrás, foi ter com Rosarito, ali num velho prédio de dois pavimentos na confluência das avenidas Araguaia e Anhanguera, em Goiânia.
 
Siqueira defendeu o regime militar ao lado de pessoas com inteligência como Jarbas Passarinho e até onde se conhece o fez em defesa da Amazônia, onde estava (e está) o Tocantins. Não se tem conhecimento de Siqueira defendendo torturas durante a Revolução que Bolsonaro idolatra. Raciocino que, para Siqueira, é possível inferir, o regime militar era só uma etapa de sua tática de movimentos com fim determinado.
 
Nas discussões antecedentes ao protocolo das assinaturas para criação do Estado, o Comitê de Criação (que reuniu as assinaturas necessárias) teve que decidir-se entre Siqueira Campos e José Freire para a empreitada. Como é lógico, aquele escolhido terminaria por obter condições práticas e políticas de ser eleito o primeiro governador. 
 
Optaram por Siqueira que, para eles, seria o mal menor. De outro modo: o Estado teria mais problemas com o José Freire e o MDB. Se a criação do Estado e da Capital receberam (e até hoje as recebe) críticas (na forma) políticas, tudo indica, pelos líderes da época, poderia ser pior, caso não fosse Siqueira o escolhido.
 
Mas retornando a Bolsonaro. Stalin havia sido treinado para padre na Geórgia. Misturando religião com política, os bolcheviques argumentavam que a história se desenvolveria por leis imutáveis que existem por vontade de Deus. 
“Uma dessas leis é a luta de classes, o século XX marca a vitória do proletariado que é conduzido em sua luta pelo Partido Comunista. Stalin, o líder do Partido Comunista, cumpre a lei da história. Em outras palavras, age pela vontade de Deus, portanto é preciso obedecê-lo”. Ou: Stalin era considerado o Cristo, filho de Deus, ainda que comunista.
 
Ditaduras de esquerda e direita tem a mesma potência. De valor invertido. Siqueira não fez nada disso. Ainda que se discorde de seus métodos, meios e formas, não ousou tanto. Mesmo que seu comportamento (político e administrativo) sugerisse ser este um fim. Chega aos 92 anos com biografia limpa e coerente com o que acredita. E que não são os mesmos valores do conservadorismo em curso.