Casar-se ou descasar-se? Viajar ou não? Engenharia ou medicina? Pelé ou Garrincha? Beatles ou Rolling Stones? Vida ou morte? Dúvidas, sempre dúvidas, eis uma característica que une a nós, seres humanos. Passamos a vida inteira a tomar decisões, desde as mais fáceis e prazerosas, como ir ao cinema ou teatro, até as mais difíceis, como uma contenda familiar entre pai e filho.

Talvez, a dúvida mais famosa do mundo seja aquela do “ser ou não ser”, contida na peça Hamlet  do maior dramaturgo inglês, William Shakespeare. A meu juízo, a maior dúvida existente para alguns pode ser uma certeza para mim e uma inverdade para os ateus: sim, Deus existe.

A dúvida é algo que nos acompanha durante a vida. É bem verdade que ela vai mudando à medida que vamos envelhecendo. Na alma da primeira infância de uma criança não existem dúvidas, só há aprendizado. Vejo isso no meu filho Pedro, de 3 anos. Tudo que ele pega ou vê me pergunta.

Outro dia, estava eu lendo no escritório quando meu garoto entrou  com o dedo apontando para a estante, repleta de livros.
-- Papai, o que é aquilo?
-- É uma cópia da estátua da liberdade, filho.
-- Quero conhecer essa estatua, vamos lá hoje à tarde.
-- Não é possível, Pedrinho. Para irmos até lá é preciso tomar um avião e seguir para a cidade onde se encontra a estátua: Nova Iorque, nos Estados Unidos.
-- O senhor me leva lá?
-- Sim, mas, primeiro, vamos, no ano que vem, a um lugar mais apropriado para a sua idade: a Disneylândia.

Creio que, na infância, a presença do pai e da mãe seja fundamental na formação do indivíduo. Criança feliz é algo que carregamos para outras fases de nossa existência. Criança infeliz reflete, muitas vezes, em maus tratos ou na carência de mãe ou pai ausente.

Aproveito o tema para reproduzir o depoimento do ator Fiuk, filho do cantor Fábio Júnior, quando lhe perguntaram a respeito da sua relação com o pai. Ele, hoje, um rapaz bem resolvido, foi sincero na resposta:

“Eu sempre tive um vazio, desde criança, acho que ficou um buraco de aprovação, de ter que mostrar e tal. Que passou pelo que a gente passou olha e meio que faz vista grossa. Então isso refletiu em vários momentos da minha vida que eu não percebia”, finalizou.

A vida, vista como um sistema, é como um rio que flui. Chegamos à adolescência com o que trazemos armazenado na nossa infância. O adulto que hoje somos e o velho que amanhã seremos são parte de um todo integrado com a infância. Sem querer estereotipar, creio, com exceções à regra, que uma criança feliz se reflete em uma adolescência mais segura de suas próprias verdades.

Ao concluir estes escritos, o que hoje tenho a dizer faz com que me lembre do filme “Vidas Amargas”, estrelado por um ícone da rebeldia norte-americana: James Dean.

A história do filme retrata a disputa de dois irmãos — Cal Trask (James Dean) e Aaron (Richard Davalos), este considerado o “menino de ouro da família” e, por essa razão, o filho favorito. Desde a infância, Cal luta para obter a atenção do pai, que praticamente o ignora. O pai perde muito dinheiro em um negócio malsucedido. Cal descobre que a mãe, que ele pensava estar morta, na verdade, vivia da prostituição. A genitora empresta o dinheiro e Cal salva as finanças da família. O pai, desconfiado de que o dinheiro viesse de negócios escusos da guerra, insulta o filho.

Desesperado, Cal conta a Aaron que a mãe não morreu e vive da prostituição. Atormentado, Aron alista-se no exército e vai para guerra. Pouco tempo depois, o pai tem um derrame cerebral e fica inutilizado. A cena final do filme foi uma das mais emocionantes que já assisti. 

Lá estava a futura esposa de Aaron, que, na verdade, amava Cal, implorando que o pai demonstrasse um sinal de amor pelo filho. O pai acabou perdoando o filho. Era tudo que Cal precisava. Assim, sentou-se ao lado da cama e cuidou dele até a morte.

Emocionante. Vidas como a de Cal existem por aí aos montes. No caso dele, ela se manifestou no seu modo rebelde ser, no caso de Fiuk, ela se revelou no vazio que ele sentia por ter um pai ausente na sua vida. A luz que a experiência me traz sobre esse assunto remete à maior herança que o pai pode deixar ao seu filho, que é a autoconfiança, construída dia a dia, com o elogio e a constante presença paterna (e materna) na vida dos filhos. Através dela nossos filhos estarão aptos a partilhar alegrias e lidar com as frustações da vida.

Autoconfiança é a maior herança que poderei dar, ao deixar este mundo, para o meu pequeno Pedro.

Salatiel Soares Correia
É engenheiro, administrador de empresas, mestre em Energia pela Unicamp. É autor de oito livros relativos às áreas de energia, economia, política e desenvolvimento regional