Wagner Rodrigues Silva
Doutor em Linguística Aplicada e Docente da Universidade Federal do Tocantins (UFT), Câmpus de Palmas.
 
Contrapondo-me a discursos levianos responsáveis por imagens equivocadas sobre as universidades públicas e sobre os docentes das referidas instituições, relato algumas atividades profissionais que tenho realizado como professor universitário, ao longo da pandemia da Covid-19. Caracterizo este texto como uma prestação de contas aos brasileiros, especialmente aos críticos desinformados.
 
Na universidade, realizo atividades de ensino, pesquisa e extensão. Durante aproximadamente seis meses, o ensino na graduação foi interrompido na instituição em que trabalho devido à pandemia, mas, nesse período, dentre inúmeras atividades, ministrei uma disciplina não presencial para uma aluna concluinte de uma licenciatura, curso responsável pela formação de professoras. 
 
Como as aulas em universidades públicas não se restringem à graduação, ministrei três disciplinas na pós-graduação com aulas síncronas, ou seja, interagindo diretamente com os alunos utilizando ferramentas digitais em ambientes virtuais. As aulas dos mestrados e doutorados não foram interrompidas devido ao perfil diferenciado dos pós-graduandos.
 
Na pesquisa, precisei ajustar algumas atividades e o cronograma do projeto científico por mim coordenado, evitando a interrupção das investigações. Tive um livro reeditado, cinco artigos científicos aceitos para publicação em revistas especializadas e finalizei outros cinco textos, entre artigos científicos e capítulos de livros em coautoria com discentes da graduação, pós-graduação e pesquisadores vinculados a universidades públicas. 
 
Também continuei orientando meus quatro mestrandos, oito doutorandos e três alunas de iniciação científica. Na pandemia, uma aluna defendeu a tese de doutorado e quatro alunas da graduação apresentaram pesquisas de conclusão de curso sob minha orientação. Acrescento que participei de bancas de conclusão de trabalhos de graduação e, especialmente, pós-graduação em diferentes universidades públicas.
 
Na extensão, desenvolvi um projeto com alunas da graduação, resultando na troca de cartas em áudio com idosos vinculados ao projeto da Universidade da Maturidade (UMA), coordenado por outros docentes e reconhecido pela comunidade tocantinense. Escrevi um artigo de opinião denominado “Quando a linguagem alivia o sofrimento”, relatando essa experiência intergeracional. Foram três artigos publicados neste jornal, garantindo-me a interação com a comunidade externa.
 
Após a retomada das aulas da graduação na modalidade remota, realizada com aulas síncronas e assíncronas e, ainda, com uma série de atividades escritas a serem realizadas pelas alunas sob a orientação atenta do docente, ministrei uma disciplina durante três semanas em dias corridos. Precisei ficar à disposição das alunas em três turnos para garantir a qualidade na formação das futuras professoras, em meio a condições adversas enfrentadas por elas. 
 
Mesmo com esforços docentes e discentes, algumas acadêmicas precisaram cancelar a matrícula na disciplina por não conseguirem acompanhar as atividades na modalidade remota, ao passo que outras nem apareceram nas aulas, apesar dos nomes registrados no diário da disciplina. Além das adversidades trazidas pela pandemia, minhas alunas trabalham dois turnos, precisam cuidar dos filhos e, nem sempre, usufruem de uma infraestrutura doméstica que lhes garanta condições para o ensino remoto.
 
Ao concluir a disciplina na graduação, fiz uma avaliação positiva do trabalho desenvolvido, apesar dos recorrentes embaraços durante o processo. Os desafios do ensino remoto foram enfrentados, construídos saberes e desenvolvidas novas competências a partir do uso de ferramentas tecnológicas ignoradas no ensino presencial. 
 
Não posso ignorar as acadêmicas que ficaram para trás, da mesma forma que ocorreu com inúmeros alunos desprestigiados da escola básica. Desejo que o sonho do magistério despertado nessas alunas seja renovado e que uma formação profissional qualificada seja garantida a todas. Finalmente, resta-me a esperança de que este texto contribua para informar os leitores sobre o verdadeiro cotidiano de um docente em universidade pública.