“A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi criada para estancar o endividamento externo do Poder Público - prefeituras, governos estaduais e governo federal - com as instituições financeiras e culturalmente não havia no Brasil um histórico de responsabilização dos gestores públicos”, destaca o promotor de Justiça Roberto Garcia, que atua na área do Patrimônio Público na Comarca de Gurupi. Ele detalha que não havia uma legislação forte de responsabilização do gestor público, com a LRF é estabelecido que o seu descumprimento pode gerar processos penal e de improbidade administrativa e a um julgamento político - processo de impeachment do chefe do Executivo no Legislativo.

“A LRF tem um caráter profilático, de prevenir riscos e caso isso ocorra, define algumas medidas de correções para que busque o equilíbrio fiscal e garanta a saúde do erário, dos cofres públicos”, destaca Garcia. Ele exemplifica que a LRF faz menção as principais leis orçamentárias - Lei Orçamentária Anual (LOA), Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) e Plano Plurianual (PPA) - e também define que as obras públicas de longo prazo devem ter continuidade, com inclusão nos planos orçamentários e financeiros. “A ideia é evitar que haja abandono de prédios públicos, onde o gestor A iniciou a obra e não terminou no mandato e o gestor B pensa não vou terminar, a LRF responsabiliza o gestor se não terminar a obra”, frisa.

Garcia alerta que LRF deve ser cumprida por todo o Poder Público, não apenas o Executivo. “O próprio MPE do Tocantins abriu um procedimento para apurar o descumprimento da LRF por parte do TCE, que não tem cumprido o limite máximo de gasto com pessoal. A regra vale para todos, inclusive para os órgãos de controle”, lembra.

Fim do mandato

Para evitar que haja abusos no período eleitoral e último ano de governo, conforme Garcia, a LRF define algumas regras de gastos aos gestores públicos que estão encerrando o mandato. “O gestor não pode deixar dívidas para o próximo gestor sem previsão de como se dará o pagamento e também não pode dar aumento salarial nos 180 dias que antecedem o fim do mandato”, relata. Garcia detalha que o MPE denunciou tais práticas e chegou a garantir decisões judiciais impedindo aumentos salariais no período não permitido.

Transparência

“A LRF dá bastante enfoque à participação popular e transparência das principais peças orçamentárias, definindo que os gestores terão que dar publicidade para esses relatórios na internet de forma resumida e facilitada”, afirma o promotor de Justiça. Garcia avalia que a LRF é ainda melhor regulamentada com a Lei de Acesso à Informação (LAI), que agora possibilita mais mecanismos para ter acesso aos dados da gestão pública e também fazer denúncia do descumprimento da legislação.

Entraves

Garcia conta que a LRF nasceu por determinação da Constituição Federal de 1988, que previu uma lei complementar de gestão fiscal. “A lei em si não teria grande utilidade se as instituições não fossem capazes de fiscalizar pela sua boa aplicação, para que ela saia do papel verdadeiramente”, argumenta. Contudo, o promotor de Justiça destaca que existe dificuldades na aplicação da LRF.

Tramitam no Senado projetos para modificar a LRF, sendo um dos principais pontos de debate para mudança, o limite de gastos com pessoal definido pela lei. Como é a proposta do Projeto de Lei do Senado (PLS) 15/2016, do senador Otto Alencar (PSD-BA). Para o promotor, essas tentativas de mudanças da LRF no Congresso Nacional tem ocorrido contra as leis moralizadoras, citando também as leis da Ficha Limpa e de Improbidade Administrativa, onde poderão virar uma colcha de retalhos. “Com muitas emendas, as leis ficam inviáveis e não cumprirão mais o propósito para que foram criadas”, ressalta Garcia.

 

Com índice de 55,34%, TO lidera ranking nacional

No último dia 30 encerrou mais um quadrimestre e todos os poderes tiveram que divulgar os seus relatórios de Gestão Fiscal (RGF) e o governo do Estado continua descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), com índice de comprometimento da Receita Corrente Líquida (RCL) de 55,34% em gasto com folha de pagamento, sendo que o máximo permitido é 49%. Com base nos dados enviados pelos governos estaduais ao governo federal, o Tocantins continua liderando o ranking nacional com maior índice de desenquadramento, além de ser o único que está acima do limite máximo.

Os dados são da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), onde 19 governos estaduais enviaram o relatório do 2º Quadrimestre via o Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi).

Além do governo do Estado, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) também continua irregular na LRF, com um índice de gasto com pessoal de 1,31%, sendo que o máximo é de 1,23%. A Assembleia Legislativa fechou exatamente no limite máximo permitido pela LRF, 1,77%, em gasto com folha.

No 1º quadrimestre, relatório divulgado no final de maio deste ano, o gasto com pessoal do governo estava em 58,22%. Já no 3º quadrimestre de 2017, o índice foi de 54,99%. O TCE também está desenquadrado na LRF desde o 3º quadrimestre de 2017, sendo que nesse período fechou com um índice 1,27% da RCL. No quadrimestre seguinte, o índice foi de 1,31%.

Por meio de nota, o governo respondeu que a gestão caminha em retorno para o equilíbrio fiscal, com uma economia de R$ 161 milhões de maio a agosto. “Vale ressaltar que nos últimos sete quadrimestres, o governo do Estado não registrava queda tão acentuada no gasto com o pagamento de servidores”, destaca nota, onde pontua que a gestão quer enquadrar o Estado na LRF em 2019.

Já a Assembleia Legislativa destacou a queda no índice, que ocorreu em razão dos cortes de gastos realizados - como o Programa de Aposentadoria Incentivada (PAI) e redução da verba de gabinete.

O TCE também detalhou que está adotando medidas para reduzir os gastos, como o PAI, porém não estaria conseguindo normalizar o índice em razão da frustração da RCL.

O MPE informou que desde maio vem adotando medidas para reduzir os gastos, entre elas a redução do adicional de férias de 50% para 1/3.

Despesa com pessoal

Relação dos governos estaduais

  • Tocantins - 55,34%
  • Santa Catarina - 48,87%
  • Amazonas - 48,70%
  • Bahia - 47,46%
  • Pernambuco - 47,38%
  • Acre - 47,26%
  • Rio Grande do Sul - 47,21%
  • Mato Grosso - 47,02%
  • Pará - 46,78%
  • Rio de Janeiro - 46,69%
  • Piauí - 44,87%
  • Paraíba - 43,86%
  • Rondônia - 42,76%
  • Ceará - 42,73%
  • Maranhão - 42,69%
  • São Paulo - 42,63%
  • Espírito Santo - 42,59%
  • Goiás - 41,19%
  • Amapá - 37,78%

Fonte: Siconfi/STN​

ANÁLISE
Irresponsabilidade fiscal, umatragédiasocial!

Jorgam Soares, é pós-graduado em Direito Administrativo pela UFT.

Prefacialmente, impende destacar, que promulgada em 5 de maio de 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/2000), conforme se infere do seu art. 1º, § 1º, teve por escopo, instituir normas de gestão fiscal responsável, mediante ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, a exemplo de renúncia fiscal e despesa exorbitante com pessoal.
Ocorre que, a despeito de ter atingido a sua maioria legislativa em 05/05/2018, do ponto de vista prático, ainda se percebe que o mencionado diploma legislativo é bastante incompreendido pela maioria dos gestores públicos, que, de forma insistente, quando não o descumprem deliberadamente, se valem de artifícios contábeis para se eximirem de cumpri-la, tornando-a ineficaz.
Nessa esteira de pensamento, vale destacar, que esse comportamento violador da LRF, se torna evidente no âmbito do Poder Executivo do Estado do Tocantins, em decorrência da extrapolação do limite de gasto com pessoal, que, no primeiro quadrimestre de 2018, chegou ao estarrecedor índice de 58,22% da RCL – Receita Corrente Líquida, conferindo-lhe o troféu nacional de campeão da irresponsabilidade fiscal, ultrapassando o Rio de Janeiro, em um quadro de colapso fiscal acrescido de penúria financeira, fruto de populismo legislativo eleitoreiro, por se conceder benefícios funcionais ao arrepio da LRF.
Não por acaso, essa irresponsabilidade fiscal, compromete a execução de serviços básicos essenciais, como saúde, educação e segurança pública, violando a eficiência administrativa e penalizando àqueles que mais necessitam do auxílio do poder público, que são os hipossuficientes econômicos/carentes, provocando-se uma tragédia social, violadora de direitos fundamentais. Diante desse quadro preocupante, o ajuste fiscal, torna-se imprescindível para se restabelecer a responsabilidade fiscal, social e a probidade administrativa.