Na rua Luís Orsini de Castro, na zona sul de São Paulo, o barulho dos aviões que chegam e deixam o aeroporto de Congonhas pode ser ouvido a cada minuto.

E entre os moradores, o ruído reacende a memória de um dos maiores acidentes aéreos da aviação brasileira, a queda do Fokker 100 da TAM, que matou 99 pessoas e completa 
20 anos nesta segunda-feira (31).

"Depois daquele dia, qualquer barulho um pouco mais alto já me amedronta", conta a moradora da rua do acidente, Maria Nilda Paschoal, 55. "Muita gente se mudou da rua porque não conseguiu continuar morando aqui."

Maria e sua família haviam acabado de acordar quando às 8h26 de uma quinta-feira, 24 segundos após sua decolagem, o jato da TAM com destino ao Rio de Janeiro caiu sobre sua casa.

O marceneiro Edison Comin, 54, é outro que ainda se assusta com a proximidade dos jatos. "A gente fica sempre de cabelo em pé. Se acontecer de novo, escapar pela segunda vez vai ser difícil", diz. "A gente até quer que o aeroporto saia daqui. Mas sabe que é difícil."

Segundo a Agência Civil de Aviação, a Infraero e a Aeronáutica, o aeroporto na zona sul de São Paulo respeita todas as diretrizes de segurança para seu funcionamento.

A Queda

Segundo a investigação da Aeronáutica, ainda durante a decolagem uma falha ativou o reverso do motor direito do Fokker. Foi como acionar o freio exatamente no momento em que a aeronave precisava acelerar para ganhar mais sustentação.

Sem perceber essa falha, os pilotos não conseguiram controlar o avião que caiu sobre as casas da rua Luís Orsini de Castro. Na queda, o Fokker ainda matou três pessoas que estavam na rua.

"O trem de pouso veio parar no meu quarto", lembra Arnaldo Silva. Jorge, filho de Arnaldo, conta que seus pais escaparam por segundos. Eles foram resgatados de dentro de casa com a ajuda de vizinhos.

"Da calçada, acompanhei a remoção de corpos das vítimas. A precariedade do procedimento foi uma barbaridade. Era muito mais voluntarismo dos envolvidos do que o atendimento de protocolos", lembra Jorge.

Os corpos, retirados das fuselagens e escombros, foram enfileirados ao longo da rua. "Os moradores do bairro é que forneceram sacos de lixo para ao menos cobrir as vítimas", conta Jorge.

A cenas dos sacos com os corpos dentro, todos enfileirados no asfalto, ficou sendo a imagem da tragédia.
Toda a operação de resgate foi transmitida ao vivo pela TV.

Sandra Assali, 58, está entre as pessoas que assistiram às cenas. Seu marido, José Abu Assali, era uma das vítimas da tragédia. "Não sei o que é o inferno de Dante, mas é impossível que seja pior do que aquelas cenas. Em nenhum momento as famílias foram poupadas de nada."

Como Sandra, a advogada Cibele Monteiro, 47, também conviveu com o luto.

"Foi um processo muito doloroso. Eu achei que Deus tinha se esquecido de mim. Foram anos de terapia. Sem ajuda profissional, você não consegue sair bem dessa."
Para Sandra, a queda da aeronave foi um marco na aviação brasileira porque mostrou a necessidade de desenvolver o atendimento às famílias das vítimas de acidentes.

A partir de sua experiência, Sandra e Cibele ajudaram a criar a Abrapavaa, a primeira associação de parentes de vítimas de acidentes aéreos do país, instituição ainda em atividade.

A LATAM, em nota, declarou que se solidariza com todos afetados pelo acidente e que, desde o primeiro momento, emprenhou-se em apoiar os familiares e concluir o mais rápido possível as indenizações.