O governo Bolsonaro pediu a líderes partidários que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que renova o Fundeb não seja votada nesta segunda-feira (20) e justificou que o novo ministro da Educação, Milton Ribeiro, precisa participar das negociações.O pedido foi feito pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, em encontro com na manhã desta segunda com deputados de partidos do PP, MDB, Republicanos, Avante, Solidariedade, PSC e PSDB.A PEC do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), principal mecanismo de financiamento da educação básica, está prevista para ser votada nesta segunda.Distante das discussões desde o ano passado, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) passou a tentar desidratar o texto.Na reunião com parlamentares, Ramos afirmou que um adiamento da votação seria necessário porque Milton Ribeiro só tomou posse no MEC na semana passada. O novo titular da pasta, disse Ramos, quer participar das conversas.Em nota, a Secretaria de Governo informou que o encontro de Ramos com parlamentares "representou o compromisso do Governo de tentar construir uma solução com o Congresso Nacional o mais rápido possível, pois se trata de uma pauta relevante para o país"."Há de se levar em conta que o ministro da Educação tomou posse há menos de um semana e não pode participar dos debates com profundidade", disse a pasta.Segundo afirmaram parlamentares à Folha, o pedido do Planalto foi bem-recebido e os congressistas não se opuseram em conceder ao governo mais alguns dias, mas a decisão de pautar ou não o texto cabe ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).O conteúdo do texto, no entanto, já causa atritos entre o governo, que conta com o apoio do centrão, e a oposição e a bancada da Educação.Neste sábado (18), dois dias antes da data prevista para a votação na Câmara, o Planalto sugeriu a líderes partidários que o Fundeb só começasse a vigorar a partir de 2022 e que a complementação adicional da União fosse repartida com o Renda Brasil, programa que deve substituir o Bolsa Família.O Fundo é responsável por R$ 4 de cada R$ 10 gastos pelas redes públicas de ensino nesta etapa. Sua vigência expira no fim deste ano.O dispositivo reúne parcelas de impostos e recebe uma complementação da União para estados e respectivos municípios que não atingem o valor mínimo a ser gasto por aluno no ano. O complemento federal atual é de 10% -cerca de R$ 16 bilhões no ano.A PEC da Câmara torna o Fundeb permanente, amplia a complementação da União para 20% de modo progressivo até 2026, e altera, entre outras coisas, o formato de distribuição dos novos recursos.A equipe econômica reclama que o texto não aponta de onde virá o dinheiro novo. Congressistas defendem, por sua vez, que a definição da origem é papel do Executivo.Contrário à complementação de 20%, o ministro Paulo Guedes (Economia) tenta agora destinar metade da complementação da União para um benefício voltado a crianças no Renda Brasil, programa que o governo quer que substitua o Bolsa Família.A ideia do governo ainda vai na contramão do dispositivo constitucional transitório que estabeleceu o Fundeb e que só permite a aplicação dos recursos do fundo na manutenção do ensino e na remuneração de professores. O Renda Brasil seria um benefício de assistência social.O deputado Idilvan Alencar (PDT-CE) disse que a Câmara não vai abrir mão de nem um décimo dos 20%. "Se quiserem 25% de complementação com Renda Brasil, acho que ninguém vai se opor se atrelar o programa à permanência de estudantes", disse.O secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, afirmou que o Congresso é soberano em suas decisões, mas defendeu que os ajustes sejam feitos no texto.Segundo ele, o projeto do Legislativo não tem sustentabilidade fiscal e não apresenta fonte de recursos.O governo, no entanto, ainda não apresentou a fonte orçamentária na contraproposta feita aos congressistas.O Ministério da Economia afirmou ainda que a proposta do governo não deixa de fazer a complementação ao fundo em 2021. No ano que vem, a complementação seria mantida como é hoje, com mudanças sob as regras novas apenas a partir de 2022.O Fundeb nunca esteve entre as prioridades de articulação do governo Bolsonaro, e o ex-ministro Abraham Weintraub (Educação) pouco se envolveu com o assunto. Em 2019, defendeu alta menor na complementação (de até 15%) e fez coro pela prorrogação do formato atual.Com a alta da complementação, é previsto um incremento de R$ 66,9 bilhões de investimentos da União até 2026, a depender do crescimento econômico.O valor mínimo gasto por aluno no país teria uma alta de 39%, passando de R$ 3.427 para R$ 4.778, segundo cálculo da Consultoria do Orçamento da Câmara. O número de municípios beneficiados com a complementação seria 34% maior, das atuais 1.699 cidades para 2.284 em 2026.O texto prevê a adoção de um modelo híbrido de divisão do dinheiro. A distribuição dos atuais 10% continua sob as mesmas regras, com base na realidade dos estados (e respectivos municípios) que não atingem valor mínimo por aluno.Parte dos recursos, referentes a 7,5% (a serem atingidos em 2026), serão distribuídos a partir do valor total investido na área por cada rede. Esse modelo contempla municípios pobres e com baixo investimento em estados mais ricos e que, no sistema atual, não são levados em conta.É esse trecho que Guedes quer desidratar para destinar recursos ao Renda Brasil. A intenção do ministro é reduzir os 7,5% a 2,5% --a diferença iria para o programa que substituiria o Bolsa Família.Em documento enviado a líderes partidários, a relatora da PEC critica a proposta. "Não cabe transformar a PEC do Fundeb em hospedeira de proposta de outra natureza, por mais relevante que seja, porque perde-se em termos de desenho de política educacional."Outra parte dos novos recursos, de 2,5%, será distribuída a redes que obtenham bons resultados em indicadores de aprendizagem. Esse formato ainda não está definido.O texto da PEC já atualizou a progressão da complementação, que aumenta para 12,5% em 2021 --antes eram 15%. Também retirou a possibilidade de usar um recurso que já é da área, o chamado salário-educação.Mas ainda há pontos em disputa, como o veto ao pagamento de inativos e a obrigatoriedade de usar 70% dos recursos com pagamentos de profissionais da educação.O pagamento de profissionais ativos já consome, no entanto, cerca de 80% do fundo em estados e municípios, segundo estudo da organização D3E.A alta na complementação amplia o protagonismo da União no financiamento da educação básica -quase 80% desse dispêndio saem dos cofres dos outros entes. Também busca equalizar o investimento pelo Brasil, uma vez que o gasto com a área varia sete vezes entre os municípios que contam com o menor e maior orçamento.