Conselheiro substituto no Tribunal de Contas do Estado (TCE) Moises Vieira Labre mandou intimar na segunda-feira, 20, o governador Mauro Carlesse (PSL) e os secretários estaduais Sandro Henrique Armando (Fazenda) e Senivan Almeida de Arruda (Controladoria) sobre as 61 distorções que o tribunal encontrou na prestação de contas do governador, de 2020. O trio tem agora o prazo de 15 dias para se manifestar sobre as ocorrências apontadas no relatório preliminar, que tramita de forma pública no site e-contas do TCE.O Tribunal acatou pareceres do Corpo Especial de Auditores e do Ministério Público de Contas e respaldou a proposta da Comissão de análise de contas e converteu a processo em diligência, o que abre espaço para o governo apresentar documentos e justificativas que entenderem necessárias para contornar as irregularidades apontadas.Uma das conclusões técnicas da comissão de análise, da 1ª Diretoria de Controle Externo do Tribunal de Contas, é que o governo Carlesse não conseguiu aplicar os 25% das receitas de impostos com a educação, tecnicamente chamada de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). Segundo o relatório, o Estado aplicou R$1,6 bilhão em MDE no ano passado, o equivalente a apenas 22,44% da receita líquida de impostos e transferências de impostos. A proporção é inferior ao estabelecido na Constituição Federal e ao apurado pela Secretaria da Fazenda.Segundo o TCE, faltaram mais R$189.5 milhões para o governo aplicar no ensino. Conforme o relatório, o governo jogou no montante da educação as despesas de emendas parlamentares para o Fundo de Erradicação da Pobreza (fonte 238/FECOEP, 104-Emendas Parlamentares) e despesas com obrigações patronais do Plansaúde. Para o TCE, os valores devem ser excluídos porque não ficou demonstrado que estas despesas estão em conformidade com a regra.Ainda na educação, o Tribunal aponta que o governo registrou a aplicação de 97,68% das receitas do FUNDEB no ano: tinha disponíveis R$816 milhões e aplicou R$ 797 milhões. Para atingir o percentual, conforme o TCE, o governo incluiu nos gastos os valores pagos com obrigações patronais do Plansaúde.Mas o TCE afirma, com base em um parecer de 2018, de nº 121/2018, essa despes deve ser excluída e não pode fazer parte do cálculo da manutenção e desenvolvimento do ensino. Sem os valores, o percentual cai para 86,86% de aplicação das receitas do FUNDEB arrecadadas em 2020. O percentual exigido em lei é de 95%.Relatório aponta distorção no cômputo da despesa com pessoalO Tribunal vê indícios de subavaliação da despesa com pessoal. Embora o governo aponte que tenha cumprido o limite legal do gasto com pessoal, no ano passado, o TCE aponta distorção no valor e limite da despesa com pessoais e respectivos limites máximos fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal.Segundo o relatório, o valor da despesa com pessoal no 3º quadrimestre de 2020 somou R$ 3,7 bilhões, ou 45,27% da Receita Corrente Líquida (RCL) ajustada de R$ 8,1 bilhões. Usa-se a expressão receita ajustada por força de uma resolução do TCE, de nº 02, de 2019. Ela permite excluir do cálculo do cumprimento da despesa com pessoal, os valores do terço constitucional de férias (R$ 54,4 milhões), o abono de permanência (R$ 16,7 milhões) e o valor do Imposto de Renda Retido na Fonte (R$ 548,6 milhões).Excluídos os itens, o percentual ficou acima do limite de alerta, de 44,10%, mas abaixo do limite máximo de 49% e do limite prudencial de 46,55%. Se estivessem inclusos no cômputo, o percentual seria de 48,31% de despesa com pessoal em relação a Receita Corrente Líquida.Para o TCE, a falha se dá porque há déficit previdenciário do Fundo Financeiro de R$ 439,4 milhões. Isto é, as receitas não eram suficientes para cobrir as despesas com aposentadorias, reformas, pensões e outros benefícios previdenciários. Pela regra, o este buraco milionário deveria ser coberto com aportes dos recursos do Tesouro, que não foram realizados em 2020, conforme o TCE. A possível irregularidade decorre de um aumento das despesas com inativos e pensionistas de 15,76% em relação a 2019, somado ao fato de o governo ter excluído os R$ 967.4 milhões da despesa com inativos dos cálculos dos gastos com pessoal. Para o TCE, a manobra indica que todo o valor foi custeado com recursos próprios do Igeprev, com a transferência de dinheiro entre os fundos Financeiro e Previdenciário.Ou seja, o custo dos inativos foi quitado sem aporte do tesouro, quando o próprio Fundo Financeiro já estava em déficit de R$ 439, 4 milhões e o Fundo Previdenciário apresentou superávit de R$ 163,8 milhões. "Uma vez cumprida a referida obrigação do aporte financeiro, o valor das despesas com inativos pago com o recurso do Tesouro não pode ser deduzido do cômputo", afirma o relatório.Em outras palavras, para não incluir o gasto com inativos no cálculo da despesa com pessoal, o governo não aportou dinheiro do tesouro no Igeprev, mas transferiu recursos entre os Fundos (Financeiro e Previdenciário), o que traz como consequência, conforme o TCE, "o não impacto na Despesa com Pessoal, evidenciando indícios de distorção no valor e limite da despesa com pessoais e respectivos limites máximos".Ciência e Cultura têm empenho de recursos aquém do exigido em leiDistorções na execução de verba estadual, do tesouro estadual, para Ciência e Tecnologia e para a Cultura também aparecem no relatório. A despesa empenhada na função Ciência e Tecnologia somou R$ 1,5 milhão, o equivalente a 0,05% da Receita Tributária Líquida.Para o TCE, está abaixo do limite de 0,5% estabelecido pela Constituição Estadual.Na função Cultura, o empenhado é de R$ 4 milhões, ou 0,12% da Receita Tributária Líquida. Lei estadual nº 1.402/2003 fixa que o limite é 0,5% e, segundo o TCE, o Estado também executou abaixo do exigido.Desrespeito à LOA ao abrir créditos suplementaresOutro dos achados do TCE é a falta de demonstrativo dos créditos adicionais suplementares. A Lei Orçamentária Anual (LOA), Lei Estadual nº 3.622/2019, fixava o limite de 30% do total da despesa para crédito suplementar.No ano, o total chegou a R$ 2.5 bilhões ou 23,47% do dotal, mas, segundo o relatório técnico, não estão detalhados por esfera orçamentária e outras condições da LOA. O TCE entende que desta forma, não há como mensurar o respeito ao limite.Despesas sem registro no orçamento acumulam dívida de R$ 1,1 bilhãoO TCE aponta indícios de despesas de R$ 227.9 milhões realizadas sem registro na execução orçamentária em 2020. Trata-se de uma despesa que não é reconhecida na execução orçamentária - ou seja, não é empenhada - por falta de recurso, porém são registradas no passivo com a letra "P" de "permanente". Somados aos R$ 891 milhões acumulados nesse tipo de despesa - entre 2003 e 2019-, o total das contas de passivo sem empenho (sem reserva e nem registro no orçamento) passou de R$ 1,1 bilhão no dia 31 de dezembro de 2020. Ou seja, 20,37% do rombo seria do ano passado e 79,63% de anos anteriores, retrocedendo até 2003.Tribunal também vê déficit onde governo aponta superávitCom base nesse registro contábil das despesas sem empenho, o TCE aponta que o superávit orçamentário de R$313.4 milhões apontado pelo governo seria, na verdade de R$ 85.5 milhões.O mesmo raciocínio, o TCE aplica na disponibilidade de R$ 2,2 bilhões registrados pelo governo confrontadas com o passivo financeiro de R$ 1,7 bilhão, do qual o governo extrai um superávit financeiro consolidado de R$ 507.1 milhões.Para o TCE, porém, ao descontar o R$ 1,1 bilhão do passivo permanente de 2003 a 2020, o resultado passa a ser um déficit de R$ 611.8 milhões ao final de 2020.