O escritor e compositor Aldir Blanc morreus aos 73 anos na madrugada desta segunda, 4, no Hospital Universitário Pedro Ernesto, em Vila Isabel, Zona Norte do Rio. Ele estava com covid-19 e seu quadro de saúde era considerado grave.O artista estava internado desde a semana passada em um hospital municipal na zona sul do Rio, com infecção urinária e pneumonia. Na ocasião, uma das filhas, Isabel, pediu doações para possibilitar a transferência e tratamento do artista.Hélio Delmiro estava fazendo uma live de sua casa, sozinho, na noite de terça, quando um de seus internautas avisou sobre o compositor Aldir Blanc. “Ele está internado”. Visivelmente transtornado com a notícia, o guitarrista Hélio tentou disfarçar, procurou a partitura de uma música de Aldir para tocar, não encontrou, e passou a perguntar “o que houve com Aldir, meu Deus.” Aos 73 anos, Aldir Blanc estava mesmo internado em um hospital na zona sul do Rio de Janeiro com suspeita de covid-19 desde sexta-feira, 10. Havia sintomas de infecção urinária e de pneumonia. Sua filha Isabel, sem recursos para manter o pai internado, chegou a pedir doações para fazer a transferência e o tratamento do artista em uma página de Facebook. Aldir Blanc deixa uma das obras poéticas mais robustas à música brasileira, sobretudo com suas composições a partir da parceria com João Bosco, nos anos 1960, para servirem Elis Regina de material fresco. Vieram Bala com Bala, O Mestre-Sala dos Mares, Caça à Raposa e O Bêbado e a Equilibrista, de 1979, assumida pelo País como uma espécie de hino contra a ditadura militar para celebrar a volta dos exilados políticos ao Brasil com a garantia de que não seriam presos pelos militares. Ela se tornaria sua obra mais conhecida, com versos que ficariam maiores que seu próprio nome, como “A lua, tal qual a dona de um bordel / Pedia a cada estrela fria um brilho de aluguel.” Era uma pequena mostra de como pensava Aldir, juntando gente mundana com a lua das realezas, dando vida à estrela e criando expressões como “um brilho de aluguel.”Aldir ia fundo quando decidia descer aos porões da alma. Quando escreveu Fantasia, fez isso aqui: “Custei a compreender que fantasia / É um troço que o cara tira no carnaval / E usa nos outros dias por toda a vida / Dizendo: "Olá! Como vai?" e coisas assim / O nó da gravata apertando o pescoço / Olhando o fundo do poço e rindo de mim.” Sim, incomodava, porque nós também poderíamos ser o cara da gravata. Sua invasão de verdades inconvenientes fazia com que o olhássemos torto a cada vez que entrava sem bater, colocando um espelho diante de cada um de nós e traficando-se em canções de parceiros como Cristóvão Bastos, que fez com ele Resposta ao Tempo para Nana Caymmi cantar e, de novo, nos invadir de raiva. “Batidas na porta da frente / É o tempo / Eu bebo um pouquinho / Pra ter argumento / Mas fico sem jeito / Calado, ele ri / Ele zomba / Do quanto eu chorei / Porque sabe passar / E eu não sei.” Mais à frente, o jogo vira: “Respondo que ele aprisiona / Eu liberto / Que ele adormece as paixões / E eu desperto / E o tempo se rói com inveja de mim / Me vigia querendo aprender como eu morro de amor pra tentar reviver / No fundo é uma eterna criança / que não soube amadurecer / Eu posso / ele não vai poder me esquecer.”Aldir era Aldir Blanc Mendes, um carioca nascido a 2 de setembro de 1946. Um médico especializado em psiquiatria que deixou de clinicar em 1973 para se dedicar apenas à composição. Antes, já vinha tateando o meio artístico criando A noite, a maré e o amor em 1968, com Silvio da Silva Junior, para o 3º Festival Internacional da Canção da TV Globo. Um ano depois, classificou outras três para outro festival, o Universitário da Música Popular Brasileira. De esquina em esquina (com César Costa Filho), foi defendida por Clara Nunes; Nada sei de eterno (feita com Sílvio da Silva), teve a interpretação de Taiguara; e Mirante (com César Costa Filho), veio na voz de Maria Creuza. Depois de mais festivais, buscou novos parceiros, como o violonista Guinga, com quem fez Catavento e Girassol, Nítido e Obscuro e Baião de Lacan, entre vários outras.As últimas duas décadas foram de pouco convívio entre Aldir Blanc e o mundo que não lhe interessava. Cada vez mais, entrevistá-lo se tornava uma missão improvável, quase impossível, preferindo o e-mail ao contato pessoal ou telefônico.