-Imagem (1.2047530)-Imagem (1.2047594)Seleucia FontesEspecial para o JToEra uma noite de janeiro de 2003, precisamente dia 29. O único cinema da Capital, situado no então único shopping da cidade recebia o lançamento em avant-premiére nacional do filme Deus é Brasileiro, do diretor Cacá Diegues. Eu estava lá, para a cobertura do Jornal do Tocantins, encerrando uma jornada que havia iniciado cerca de dois anos antes, desde a primeira visita do diretor ao Estado em busca de locações e apoio financeiro para seu projeto.Uma das presenças, ao lado do diretor, era Wagner Moura, ator baiano apresentado como uma promessa, que seria imediatamente cooptado pela Rede Globo após o sucesso de seu personagem no filme. O resto de sua história e todos os prêmios e reconhecimento já sabemos.O que poucos sabem é do valor desta comédia de costumes despretensiosa para o Tocantins, especialmente para a divulgação do Jalapão como destino turístico e cenário para várias outras produções que vieram ao longo destes quase 20 anos.Pois retomamos a importância de Deus é Brasileiro para nós, tocantinenses, na semana em que o Canal Brasil inicia sua homenagem aos 80 anos de Cacá Diegues, a serem completados dia 19 de maio. Nesta terça, dia 5, às 18 horas, os fãs do cineasta poderão participar de uma entrevista exclusiva com Cacá no perfil do Instagram do canal (@canalbrasil). Na live, ele vai fazer uma retrospectiva de sua carreira, além de analisar o momento do cinema mundial neste período de quarentena.O diretorAlagoano nascido em Maceió, Carlos José Fontes Diegues foi um dos nomes do Cinema Novo. Ainda muito jovem mudou-se com a família para o Rio de Janeiro e entrou no curso de Direito na PUC-Rio, onde fundou um cineclube. Nunca mais deixou a “sétima arte”. Desde então, produziu-dirigiu-roteitizou mais de 30 filmes, conquistando cerca de 20 premiações.Segundo Cacá, seu compromisso sempre foi com a atualidade, independente do período em que ocorreram as filmagens ou de sua temática (caso de Xica da Silva). “Tenho orgulho de dizer que sempre fui um cineasta do presente, sem nenhuma nostalgia do passado, nem desejo de enviar mensagens para o futuro”, disse ao Canal Brasil. “Acho que é por isso que eles seguem sendo sempre atuais, uma vaidade pessoal que tenho sobre eles. O bom cinema continua sendo um espaço em que sonho e realidade podem viver juntos”, completa.Nada mais atual que imaginar o cansaço de Deus diante da reação humana no enfrentamento da pandemia da Covid-19.O filmeA sinopse do filme é muito simples. Deus está cansado da “labuta” com a humanidade e precisa tirar férias. Vem procurar seu substituto justamente no Brasil, onde vive um cidadão de coração “santo”. Mas o que deveria ser algo simples se torna uma longa jornada de desencontros e autoconhecimento para todos que passam pelo caminho do Ser Supremo.A ideia inicial era centralizar toda a trama na ilha de Itaparica, na Bahia, onde se desenrola o conto original, O Santo que não acreditava em Deus, de João Ubaldo Ribeiro, mas acabou se desenvolvendo para um “road movie” com início na Costa dos Corais, em Alagoas, estado natal do diretor, e seu ápice nas areias de tons alaranjados do Jalapão. Circular por regiões distintas do Brasil já era uma experiência conhecida por Cacá, que em 1979 lançou Bye Bye Brasil, que percorreu 15 mil km por cinco estados, culminando no Distrito Federal.Usar locações tocantinenses teria sido sugestão do cineasta Walter Salles e seu assistente, Sérgio Machado, que mostraram uma série de fotos do Jalapão. Ao Estadão, em maio de 2001, Cacá disse que ficou fascinado pela originalidade geográfica do local e sua mistura de floresta e cerrado. "Como se trata de uma região belíssima, decidi filmar ali a cena de Deus com o candidato a santo", admitiu.Claro que a possibilidade que conquistar apoio do governo de um estado tão jovem e em busca de visibilidade também deve ter pesado na decisão do diretor, que foi recebido de braços abertos.A figura alta, forte, grisalha e máscula de Antônio Fagundes personificou o Deus dos católicos, apenas trocando a famosa túnica por uma despojada camisa xadrez. Completando o elenco, o já citado Wagner Moura, Paloma Duarte, Hugo Carvana, Stepan Nercessian, Bruce Gomlevsky, Susana Werner, Castrinho, Toni Garrido, Chico de Assis e muitos figurantes locais, incluindo indígenas da etnia Xerente.TocantinsO início do século 21 era apontado como uma “nova era”. O Estado do Tocantins buscava a concretização do desenvolvimento econômico e seu turismo era basicamente voltado para as temporadas de praia. Era preciso mostrar seu potencial e o filme de Cacá Diegues se propunha a esse papel. Em função do período de chuvas da região, o diretor corria contra o tempo para finalizar as filmagens até março de 2002, lembrando que aquele também seria ano de eleições gerais e Copa do Mundo.Então presidente da Fundação Cultural do Tocantins, Meire Maria Monteiro lembra da grandiosidade da produção que, além de aporte financeiro e logístico do Estado contou com grande envolvimento da comunidade e a genialidade do diretor. “Com todas as adversidades, Cacá Diegues sempre tinha uma tirada, criação, uma direção muito diferente e inusitada, sempre aproveitando tudo que estava ao seu redor. Ele era muito observador e aproveitada tudo que estava a sua volta para se tornarem elementos do filme”, conta ela que também atuou como uma das “moças” do cabaré.“Eu era cadastrada como atriz, coloquei meu cadastro a disposição e fui chamada pela produtora, que não sabia que era presidente da Fundação Cultural”, revela divertindo-se ao lembrar da reação de Cacá ao vê-la no set. “O cabaré foi construído na margem direita da Praia da Graciosa original, foi um trabalho gigantesco para montar esse cabaré”, relembra, enfatizando ainda a simpatia de Antônio Fagundes, que almoçava no shopping e chegou a assistir produções teatrais locais no Espaço Cultural, além do encanto do diretor com o Tocantins. “O lançamento do filme foi maravilhoso, movimentou o Estado inteiro, foi uma época de ouro. O Cacá Diegues alavancou o Tocantins na época, pouco se sabia da região e ele fez cenas lindas”, completa.O filme também marcou a primeira atuação do ator e diretor teatral Cícero Belém no cinema. “Foi uma surpresa extraordinária e um privilégio minha primeira experiência num set de filmagens pelas mãos de Cacá Diegues”, conta. Tudo começou no Teatro do Sesc Tijuca, no Rio, onde o grupo Chama Viva estava em cartaz com o espetáculo O Jogo do Amor. Cacá e a sua esposa estavam na plateia. “Ao final ele se apresentou, cumprimentou o elenco e nos disse que havia tomado conhecimento sobre nós através de uma matéria especial veiculada no Jornal do Brasil. Avisou que filmaria no Tocantins e que gostaria que fizéssemos testes.”Após os testes, ele e sua irmã e também atriz, Marcélia Belém, foram chamados. “Na véspera da gravação ele se reuniu conosco, fez uma leitura rápida do texto e disse ‘é isso, não tem mistério, é só vocês fazerem igualzinho no teatro’, e saiu. Ficamos em pânico”, revela Cícero, ao lembrar a tranquilidade do diretor no dia da filmagem, enquanto ele tentava se concentrar em meio ao movimento e quantidade de equipamentos.“Fiquei muitos anos inquieto e insatisfeito com a minha atuação, achava que se tivesse conhecido o roteiro inteiro, teria feito muito melhor. De três anos pra cá, depois de aprofundar meus estudos sobre interpretação para cinema e televisão foi que me tranquilizei, agora vejo o filme e me divirto. Acho que o Cacá só queria aquilo mesmo, o mínimo de atuação”, conclui.A redação do Jornal do Tocantins também seguiu o ritmo frenético das filmagens, levadas a vários pontos do Estado, alguns hoje impossíveis de distinguir no longa. Entre os repórteres escalados para cobrir a produção, o jornalista Tom Lima conta que foi uma honra acompanhar esse minucioso trabalho. “Me chamou a atenção a rapidez nas montagens dos cenários, um trabalho de formiguinha de dezenas de profissionais para que tudo saísse perfeito”, revela.Entre muitos momentos, Tom Lima lembra da dificuldade para cobrir de terra um trecho de avenida asfaltada em Monte Santo, para dar a ideia de vilarejo por conta de uma pequena e rústica igreja que serviu de locação. “A reportagem estampada no Jornal do Tocantins e também no Popular, de Goiânia, atraíram o interesse da mídia nacional para a cobertura das filmagens a partir dessa matéria”, diz, enfatizando que as matérias serviram como um diário da passagem do filme pelo Tocantins. “Uma experiência viva na minha memória até hoje”, conclui.Mostra Cacá Diegues - 80 anosDe 5/05 a 19/06, às 23h45, no Canal Brasil5/05 - Xica da Silva (1976)Sinopse: A trajetória de uma escrava que se tornou a primeira dama negra da história brasileira, seduzindo o milionário João Fernandes. Ao promover luxuosas festas, Xica da Silva ficou conhecida na corte portuguesa. Classificação: 16 anos.12/05 - Bye Bye Brasil (1979)Sinopse: Uma trupe de artistas ambulantes viaja pelo interior do Brasil. Um caminhão transporta a Caravana Rolidei e suas atrações: Salomé, a dançarina; Lorde Cigano, o mágico e Andorinha, o Rei dos Músculos. Classificação: 18 anos.19/05 - O Grande Circo Místico (2018)Sinopse: A história de cinco gerações de uma família circense, da inauguração do Grande Circo Místico em 1910 aos dias de hoje. Celavi, mestre de cerimônias que não envelhece, mostra as aventuras dos Knieps. Classificação: 16 anos.26/05 - Orfeu (1999)Sinopse: O mais conhecido compositor dos morros cariocas, Orfeu trabalha nos últimos preparativos para o desfile da Marquês de Sapucaí quando conhece Eurídice, por quem se apaixona perdidamente. Classificação: 18 anos.2/06 - Deus é Brasileiro (2001)Sinopse: Cansado dos erros cometidos pela humanidade, Deus resolve tirar umas férias a fim de descansar de seus aborrecimentos. Mas, para isso, precisa encontrar um santo que se ocupe de seus deveres enquanto Ele estiver ausente. Classificação: 12 anos.9/06 - A Grande Cidade (1965)Sinopse: Buscando uma vida melhor, Luzia abandona o Nordeste e vai para o RJ para encontrar o noivo. O sonho de viver na metrópole se torna um pesadelo quando Luzia descobre que seu ele se tornou um temido bandido. Classificação: 16 anos.16/06 - Chuvas de Verão (1978)Sinopse: Afonso (Jofre Soares), ao se aposentar, decide viver com tranquilidade no subúrbio onde mora. Em sua primeira semana de ócio, em um tórrido verão, ele se envolve com os problemas de sua filha, de seus amigos e de sua vizinhança, aprendendo com eles a viver novamente, quando até Isaura (Mirian Pires), sua vizinha de tantos anos, se modifica, começando uma relação de amizade, amor e respeito. Classificação: 16 anos. (Seleucia Fontes/Especial para o JTo)Confira fotos dos sets de gravação do filme no Tocantins registrados por equipe do JTo:-Imagem (1.2047533)-Imagem (1.2047532)-Imagem (1.2047531)