“Desejávamos que o coração do nosso menino batesse no peito de outro atleta”. A declaração é do psicólogo Luciano Caldas, pai do médico ginecologista Pedro Caldas, que teve morte encefálica confirmada no último sábado. Atleta e saudável, o médico, vítima de atropelamento 34 dias antes, era o candidato perfeito a salvar a vida de pelo menos meia dúzia de pessoas por meio da doação de seus órgãos. “Mas descobrimos que o Estado do Tocantins ainda não estabeleceu o protocolo necessário para efetivar a referida doação”, lamentou o pai do médico, em carta.

Segundo dados da Central Nacional de Doação de Órgãos (CNDO), existem mais de 70 mil pessoas em todo o País aguardando por um transplante de órgãos diversos. A Central de Transplantes do Estado informou que não tem o registro de pessoas que estão na fila para receber coração, pulmão, rim ou outro órgão cujo Tocantins não possui os protocolos, uma vez que para cada órgão a ser doado existe uma série de procedimentos diferentes. O Tocantins só possui credenciamento para doação e transplante de córneas. Este ano 70 pessoas foram beneficiadas com esse tipo de transplante no Estado e outras 25 estão na fila de espera.

Existe também uma estimativa da CNDO de que de cada oito pessoas que declaram ser doadoras, apenas uma consegue ter a doação concretizada. Entre os problemas que frustram as doações está justamente a falta de protocolos específicos. “Protocolo de doação são conjuntos de etapas a serem seguidas para a efetiva doação de órgãos e tecidos”, explicou a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau). Segundo a CNDO, apesar de todos os entraves, o Brasil é o segundo país do mundo em número de transplantes realizados por ano e cerca de 90% dos procedimentos são realizados pelo Sistema Único de Saúde.

A Sesau informou também que vem trabalhando para a efetivação de captação e doação de órgãos. A pasta disse que a Central de Transplantes do Estado está em processo de discussão e fechamento de fluxos para ampliar os protocolos, se habilitando para captação de transplante de outros órgãos. Luciano Caldas informou que a morte do filho serviu também para que o assunto viesse à tona e houvesse mobilização de que o Estado adquira os protocolos necessários para que mais vidas possam ser salvas por meio das doações de órgãos. “Conseguimos colocar em ação um processo embrionário, já com um protocolo desenhado, mas ainda não efetivado. Gostaríamos que este ato pudesse representar o ponto inicial da criação de um serviço efetivo de doação de órgãos”, afirmou o psicólogo.

O presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), Roberto Manfro, foi consultado para falar sobre o assunto, mas disse que por não ter conhecimento das particularidades do Estado, não poderia contribuir com novas informações.