Ramis Tetu

As contramedidas necessárias

O aquecimento global nos coloca em uma nova era cujo signo é o da imprevisibilidade e dos extremos climáticos. As chuvas e secas dos últimos anos Brasil afora, com as tragédias, transtornos e prejuízos delas decorrentes, nos mostram isto com clareza. Isto exige dos governos, instituições e pessoas uma nova postura sobre inúmeras questões que já se encontravam em estágios críticos na maioria das cidades brasileiras e alcançam agora um novo patamar de desafios cada vez maiores. A Engenharia Civil, a gestão e as leis estão em cheque, as cidades e os modelos não funcionam e cada vez mais vão colapsar seus sistemas falhos. A solução passa por atitudes e decisões difíceis porém necessárias: o equilíbrio entre, de um lado, análises e decisões políticas, populares e legalistas; e, de outro, os princípios técnicos universais; o equilíbrio entre as visões de distintas áreas de conhecimento, sem o predomínio unilateral e mecanicista de uma delas; práticas gerais e cotidianas de cidadania, com deveres na mesma proporção dos direitos; e, por fim, a valorização dos sistemas naturais e o respeito às suas leis. A consequência de não evoluirmos nesta direção será muito mais sofrimento, perdas, colapsos das cidades e êxodos nunca vistos. É preciso parar de nos iludirmos com a nossa arrogância.           

Calor

A conjugação do aquecimento global com o urbano (este pelo excesso de concreto e asfalto), torna as cidades insalubres e insuportáveis. Ventos fortes derrubam árvores mal cuidadas (por exemplo as com cupim), aumentam as lendas sobre elas e as cidades são cada vez mais desarborizadas. Fortes programas de arborização e cuidado com as árvores, aumento das áreas verdes (jardins, telhados e paredes verdes, praças, parques e florestas) e redução de muros e pisos de concreto e asfalto revertem este processo, entre outras vantagens. 

Pragas e doenças

Mais calor significa mais doenças tropicais, por exemplo as veiculadas por mosquitos, como a dengue e afins. Extremos de temperatura e umidade também causam mais doenças respiratórias, entre outras. Na agricultura, elevam o surgimento e a severidade do ataque de pragas e doenças, o uso de defensivos, os custos e as perdas de produção, comprometendo o abastecimento e a segurança alimentar em geral.     

Crise das águas

A crise do clima reforça a crise das águas, já muito mal tratadas pelo Brasil, com esgoto, erosão, poluição, desmate e queimadas. Chuvas fortes aumentam os processos erosivos, o que provoca o assoreamento e morte dos corpos d’água. Cada vez mais a Edafologia, ciência da conservação de solo e água, o controle de erosão urbana e rural e o saneamento tornam-se criticamente necessários e interligados.

Secas

Secas diminuem a vazão dos rios, o que aumenta o problema da poluição, pela menor capacidade de diluição e poder tampão das águas. Elas também colocam a extração de água para atividades humanas em um patamar crítico, colapsando abastecimento humano e animal, irrigação, produção de energia, navegação. E também a vida do rio abaixo. Secas severas em tempo e intensidade também aumentam muito o risco e o poder de destruição das queimadas. 

Cheias

A impermeabilização com concreto e asfalto (os mesmos do calor, lembra?) e a falta de planejamento urbano cria cidades alagadas, com suas tragédias e enormes perdas tornadas rotineiras. Não é a vontade de Deus não. Lugar de rio não é lugar de cidade. Tornar fundos de vale parques – pouco afetados por cheias; reter e infiltrar água em todo o território da cidade; adotar o sistema de drenagem sistêmica e de infraestrutura verde; respeitar os territórios das águas – estas medidas facilitam a coexistência das águas com as estruturas urbanas.      

Áreas de risco

Segundo pesquisa de 2018 do IBGE, já são mais de 8 milhões de brasileiros vivendo em encostas, fundos de vale e proximidades de voçorocas, entre outras áreas de risco não adequadas para assentamentos humanos. Chuvas muito fortes, cada vez mais comuns e concentradas, fazem destes locais áreas de certeza de tragédias, perdas e sofrimento. Em um país onde o que mais sobra é terra. Surreal.       

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