O Ministério da Educação (MEC) criou nesta quarta-feira, 20, uma comissão com três pessoas para avaliar as questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O grupo inclui um ex-aluno do ministro Ricardo Vélez Rodríguez e terá acesso ao ambiente de segurança máxima onde ficam as perguntas da prova para “verificar sua pertinência com a realidade social, de modo a assegurar um perfil consensual do exame”, segundo o ministério.

A comissão tem dez dias para dar um parecer e dizer quais questões ficam e quais serão retiradas do maior vestibular do País. O MEC nega que se trate de censura. Segundo a portaria publicada hoje, será feita uma “leitura transversal”, que “é uma etapa técnica de revisão de itens”.

Se o grupo considerar que a questão dever ser eliminada, o diretor de Avaliação da Educação Básica do Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais do MEC (Inep), Paulo Cesar Teixeira, junto com a equipe técnica especialista em exames do órgão, ainda poderá discordar. Nesse caso, o presidente do Inep, Marcus Vinícius Rodrigues, decidirá se a questão sai ou fica. Teixeira é ligado a Igreja Católica. Rodrigues foi indicação dos militares.

Os membros da comissão são Marco Antônio Barroso Faria, ex-aluno de Vélez, que é secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior no MEC, o representante do Inep, Antônio Maurício Castanheira das Neves e um membro da sociedade civil, Gilberto Callado de Oliveira, procurador de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina, também indicado por Vélez.

Callado de Oliveira, em entrevista dada a uma revista da Igreja Católica, afirmou que há uma ação ideológica na comunidade do pensamento jurídico brasileiro. “Os motivos são vários, mas destaco a contaminação ideológica nas universidades, que vêm formando juristas e políticos com mentalidade cada vez mais liberal e esquerdizante”, afirmou.

Barroso Faria é formado em Filosofia. Teve mestrado e doutorado em Ciência da Religião orientados por Vélez na Universidade Federal de Juiz de Fora. Castanheira é psicólogo, com doutorado em Filosofia, e atualmente é diretor no Inep.

O presidente Jair Bolsonaro já criticou algumas vezes as questões do Enem e disse que ele mesmo veria a prova antes de ser feita pelos alunos. Ele não gostou de uma pergunta no último exame que falava de um dialeto usado por transexuais.

Segundo a portaria do Inep, os membros da comissão assinarão Termo de Compromisso de Confidencialidade e Sigilo sobre o que verão no ambiente seguro onde ficam as questões. Para entrar na área, que fica no prédio do Inep, é preciso passar por um scanner de corpo, deixar celulares fora e ter o nome autorizado.

Um dos nomes que inicialmente havia sido pensado para a comissão era de Murilo Resende, hoje assessor no MEC. Ele chegou a ser nomeado para comandar a diretoria no Inep que faz o Enem, mas após repercussão negativa, foi retirado do órgão.

O Estado apurou que o Inep não queria Resende na comissão e por isso ele acabou ficando de fora. Em uma audiência pública no Ministério Público Federal, em 2016, sobre “Doutrinação Político-Partidária no Sistema de Ensino” ele afirmou que professores brasileiros são desqualificados e manipuladores, que tentam roubar o poder da família praticando a “ideologia de gênero”. Resende também não tem experiência em avaliações.

Quando ele foi indicado para o cargo no Inep, o filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro defendeu a nomeação. Ele disse que os alunos não precisariam mais saber “sobre feminismo, linguagens outras que não a língua portuguesa ou História conforme a esquerda” já que o Enem estaria “sob a égide de pessoas da estirpe de Murilo Resende”.

O Enem será realizado neste ano nos dias 3 e 10 de novembro. No ano passado, teve cerca de 6 milhões de inscritos. A prova seleciona para vagas nas universidades púbicas e particulares do País.