O médico Estevam Rivello Alves, conselheiro pelo Tocantins no Conselho Federal de Medicina (CFM), avalia a situação do combate ao novo coronavírus e estima que em 10 dias o sistema de saúde no Tocantins poderá ser estrangulado pelo aumento dos casos. No domingo, 10, o Tocantins chegou a 688 casos confirmados de Covid-19 e 11 mortes pela doença. O Conselheiro defende a valorização dos profissionais que estão na linha de frente da Covid-19 e não de equipamentos. Também aponta que o Tocantins tem decidido as medidas de enfrentamento da pandemia sem ouvir nenhuma entidade médica e explica como deve ser o uso da hidroxicloroquina inclusive em pacientes, como decidiu o município de Araguaína. Veja os principais pontos da entrevista, por telefone.

Exclusão das entidades médicas
A gente (do Conselho Federal de Medicina) tem ponderado de uma forma muito séria, inclusive com a imprensa, no sentido de mostrar que a gente queria estar participando desse processo, porque são pessoas que estão morrendo e, às vezes pequenos detalhes podem ser suficientes para a gente tomar o máximo de resultado. A gente está no pior momento de saúde pública que o mundo já viveu. Nunca uma pandemia agrediu tantas nações, já agrediu em número de população, mas essa atingiu mais de 180 países. No Brasil, estamos falando em casos de mais de 11 mil mortes em menos de três meses.

No Tocantins ninguém está ouvindo as entidades médicas. Nenhuma entidade médica foi ouvida nesse processo [de enfrentamento da doença no Tocantins]. Isso é extremamente grave, porque o Ministério da Saúde conta com a gente (CFM), solicita da gente todo tipo de postura e conduta. E a gente tem contribuído, mas no meu Estado, as entidades médicas não podem contribuir porque é chamada a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil], é chamado o Tribunal de Contas, a Assembleia Legislativa, a Polícia Rodoviária Federal, mas não são chamadas as entidades médicas. 

Situação o Tocantins
Eu conversei com o secretário de estado saúde [Edgar Tolini] já tem 60 dias. Naquele tempo quando falei parece que não acreditavam [na gravidade da Covid-19] não tinha programação nenhuma de hospital de campanha. Quando eu publiquei nas minhas redes, muitas pessoas me criticaram, fizeram chacota. E hoje a gente vê que não é assim. O secretário disse que dentro de 30 dias vamos atingir 1.500 casos, mas eu acho que vamos atingir muito mais rápido. Araguaína já estrangulou. E eu prevejo que no máximo em 10 dias vamos estrangular o Estado inteiro. 

Desprezo pelo profissional na linha de frente
Não estão valorizando as pessoas. Estão valorizando equipamentos, estão valorizando EPIs (Equipamento de Proteção Individual), estão pagando caro por ventilador e máscaras, mas o profissional que tem a possibilidade de morrer, não estão valorizando. São contratos temporários sem qualquer tipo de garantia e pagando salário baixíssimo para prestar atendimento de altíssima complexidade."

Os médicos do Brasil e do Tocantins já aceitaram o desafio de comandar a frente de batalha contra um inimigo desconhecido e poderoso, que está colapsando os sistemas de saúde no mundo, inclusive vitimando as próprias equipes, o que exigimos é ue os gestores ofereçam e garantam as condições necessárias de segurança para que gente fazer o que sabemos fazer, que é tratar os necessitados e salvar vidas."

Se a gente tem ações coordenadas e uma equipe sabe onde quer chegar as coisas funcionam de uma forma muito mais tranquila, mas quando a gente está nesse ambiente onde se nota que não existe uma coordenadoria de serviço, gente que não sabe fazer saúde, não sabe lidar com doentes graves, estrelismos numa eleição de prefeito e vereadores, o dualismo entre direita e esquerda no país e o crescente números de casos e de escassez de leitos no SUS, tudo são conjunto de fatores que nos assustam. 

Uso da hidroxicloroquina 
A gente, enquanto Conselho Federal, baseado nos conhecimentos existentes relativos ao tratamento de pacientes portadores de Covid-19 com cloroquina e hidroxicloroquina, classificou o uso em três níveis. Em pacientes com sintomas leves, para uso nesse paciente, eu preciso descartar que esse paciente não tenha influenza (gripe), não tenha H1N1 e não tenha dengue. Por que? Porque essas situações elas muito se assemelham com o paciente leve. Confirmei que é Covid-19 eu posso fazer o uso dessa medicação, porém eu preciso informar o paciente que essa medicação não tem uso de evidência robusta, mas que estão sendo usados em vários pacientes. 

O outro caso é quando o paciente não tem o sintoma leve mas começa a sentir sintomas mais importantes, mas ainda sem cuidados intensivos (internação em UTI), quando está mais cansado, com mais coriza, mais limitação de movimento e uma certa dispneia (falta de ar) o médico precisa informar obrigatoriamente para uso compartilhado dessa medicação, que não existe até o momento nenhuma comprovação do benefício da droga, para que ele tenha ciência do que se está fazendo. 

Já nos casos críticos, o pensamento do médico, pode ser o uso compassivo, eu tenho que ter compaixão do meu próximo, e entender que há estudos em andamentos, mas é o que eu posso fazer por ele, porque é o que eu tenho diante de uma guerra como essa. Vai ter efeito? Poder ser que sim, pode ser que não.  É o soldado que foi para a guerra, tinha uma metralhadora, acabou a bala e agora ele só tem o 38, agora ele é obrigado a usar o 38.