Prestes a enviar ao Congresso o projeto de lei para mudar o sistema previdenciário, o presidente Michel Temer afirmou que o governo de Dilma Rousseff não impulsionou a reforma por covardia e que não se preocupa com a possibilidade de sua popularidade cair ainda mais com a medida.

O texto deverá ser encaminhado aos parlamentares após a eleição neste domingo (2). O presidente mudou o horário em que havia programado votar em São Paulo para escapar de protestos de estudantes.

"Se chegar ao final do governo com 5% ou 2% de popularidade, mas conseguir colocar o país no eixo, estarei satisfeito. Não me preocupo com a popularidade", disse Temer aos jornais argentinos "Clarín" e "La Nación" em entrevista concedida em Brasília e publicada neste domingo.

Temer chegará à Argentina na manhã de segunda-feira (3) para sua primeira visita bilateral. Deverá ficar cerca de cinco horas no país e seguir para o Paraguai.

Aos jornais, frisou que a situação brasileira decorre da covardia de se tomar decisões difíceis e impopulares. "Eu não tenho essa covardia. Tenho coragem para adotar as medidas."

Sobre a necessidade de ter o apoio da população para enfrentar desafios como o reajuste fiscal e as reformas trabalhista e previdenciária, acrescentou que precisa é do suporte dos parlamentares.

"Tendo o apoio do Congresso, vou ter naturalmente o apoio popular. Conforme essas medidas comecem a ser aprovadas no Congresso, vou popularizando minha imagem."

O presidente afirmou ter se reunido com cerca de 1.000 empresários em São Paulo quando ainda era interino, além de ter tido encontros em Brasília com vários representantes de setores econômicos, para ter respaldo ao programa de reformas.

Os correspondentes dos jornais argentinos, porém, destacaram que essas audiências não eram com o povo, ao que Temer respondeu não ser positivo "dividir o Brasil entre nós [o empresariado] e eles [os trabalhadores]".

"Estou tratando de pacificar o país. Não podemos fazer essa divisão entre brasileiros."

Questionado sobre uma entrevista que Fernando Henrique Cardoso deu ao "Clarín" há dez dias, na qual afirmou que Temer não era um líder nacional e que deveria construir essa imagem para fazer as mudanças impopulares, o presidente disse dar "graças a Deus" por não ter esse perfil.

"E mesmo não sendo [um líder nacional], fui presidente da Câmara dos Deputados."

IMPEACHMENT
De acordo com Temer, seu afastamento de Dilma começou em outubro do ano passado, quando o PMDB publicou o documento "Uma ponte para o futuro". O texto defendia uma série de medidas econômica contrárias ao receituário petista e, à época, foi visto como um modo de o partido marcar a decisão de ter candidato próprio à eleição presidencial de 2018.

"Sugerimos por onde o Brasil deveria ir. (...) Não era um documento de oposição, ao contrário, era de auxílio ao governo, mas foi tomado como de oposição."

No mês passado, em um almoço com empresários em Nova York, o presidente disse que o processo que culminou no impeachment foi consequência de o governo Dilma não ter adotado as teses sugeridas no documento peemedebista.

Aos jornalistas argentinos Temer justificou que se referia às questões trabalhistas, pois um dos pontos do documento tratava do assunto. "Quando o governo viu isso, resolveu não aceitar nossas propostas, e isso foi um dos fatores que mobilizou a sociedade contra a presidente."

LAVA JATO
Temer disse ainda que seu governo não intervirá nas investigações de corrupção e que as recentes declarações do ministro de Justiça, Alexandre de Moraes, que anunciavam uma nova operação da Lava Jato, não significam que a pasta tenha um controle prévio do que a Polícia Federal vai fazer.

Sobre a delação do ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, Temer destacou que ainda não há uma investigação formal contra ele e que se trata de uma "menção irresponsável" de Machado.

Segundo o delator, o presidente pediu propina para financiar a campanha de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo em 2012.

Temer afirmou também que incentivou a Lava Jato, já que seu ex-ministro de Planejamento, Romero Jucá, deixou o cargo após a divulgação de gravações em que falava que o impeachment serviria para barra as investigações.

MERCOSUL
Em relação à crise do Mercosul, o presidente disse que a intenção não é tirar a Venezuela do bloco, mas que o país de regularize. Suas falas foram mais diplomáticas do que as de seu par Mauricio Macri.

Na última quarta, em entrevista a jornais brasileiros, entre eles a Folha, o argentino afirmou que a Venezuela não acrescenta nada ao Mercosul e que o grupo seguiria melhor sem ela.