A construção de uma chapa que reúna o apresentador de TV Luciano Huck e o ex-ministro da Justiça Sergio Moro é vista como uma discussão embrionária por líderes de partidos de centro, que avaliam que a dupla precisaria de apoio no Congresso para se tornar viável.Uma aliança entre os dois forjada para se contrapor ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em 2022 começou a tomar forma depois de um almoço entre o apresentador e o ex-juiz da Lava Jato em Curitiba no fim de outubro.Logo que o encontro se tornou público, a articulação foi bombardeada por importantes nomes de partidos do centro, entre eles o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), muito influência na sigla.À colunista Mônica Bergamo, Maia afirmou na segunda-feira (9) que Moro é de extrema direita e descartou qualquer apoio a uma chapa composta pelo ex-juiz.No mesmo dia, Maia e Huck almoçaram no Rio. Segundo o colunista Lauro Jardim, Huck teria dito que sua "turma" era a do presidente da Câmara e lembrado que já se reuniu com outros nomes além de Moro, como os governadores do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB).Por ora, Maia é voz praticamente isolada nas críticas públicas a uma chapa formada por Huck e por Moro.Líderes e presidentes de partidos de centro adotam cautela e dizem que ainda é cedo para analisar uma eventual aliança de ambos contra a reeleição de Bolsonaro."Acho muito cedo para dizer se terão ou não nosso apoio", afirma o líder do Solidariedade na Câmara, deputado Zé Silva (MG). "Prestígio e fama não asseguram competência para fazer gestão pública com eficiência e eficácia."A avaliação é a mesma em outros partidos. O senador Esperidião Amin (PP-SC), líder do bloco formado por congressistas do PP, MDB e Republicanos, afirmou que a chapa Moro-Huck ainda se mostra uma "especulação sem qualquer consequência" e não "um projeto"."Nós estamos em uma pandemia. Temos um período eleitoral que vai até o dia 29. Então eu nem tenho coragem de discutir a sucessão no Senado quando me perguntam, quanto mais 2022", disse."Não estou criticando quem queira discutir, [mas] o Huck almoçar com o Rodrigo Maia... O Rodrigo Maia deveria estar preocupado em organizar a comissão do Orçamento", afirmou.Congressistas também afirmaram que o "timing" do encontro entre Huck e Moro demonstra falta de conhecimento da política nacional, que avaliam ser um ponto negativo para a aliança.Um senador que não quis se identificar disse que os dois foram ingênuos se consideraram que o encontro não seria descoberto. Ou então, se sabiam que seria divulgado pela mídia, escolheram o momento errado para se reunirem, semanas antes do primeiro turno das eleições municipais --com a atenção de políticos e do público voltada para esse tema.Além disso, nos bastidores, a interpretação é que, se quiserem se tornar uma chapa viável, ambos precisam buscar apoios partidários e evitar incorrer no que é visto como um erro de Bolsonaro: vencer a eleição sem uma base consolidada e, agora, depender do apoio de partidos do centrão para aprovar projetos no no Congresso.Bolsonaro se elegeu pelo PSL, mas rompeu com o partido em novembro de 2019. Isso rachou a sigla e diluiu a rede de congressistas que respaldam os textos do Executivo.Meses atrás, diante da ameaça de processos de impeachment, precisou recorrer à política do toma lá dá cá e oferecer cargos ao centrão (bloco de partidos como PP, PL e Republicanos) em troca de votos."Eu sempre acho que, por trás de uma candidatura, tem que ter uma base partidária forte de sustentação, para não acontecer o que aconteceu com o Bolsonaro, que chega ao poder, criticou a vida inteira a política velha, a política do centrão, e hoje é ícone do centrão", disse o senador Otto Alencar (PSD-BA), líder da legenda.Para não correr risco de ficar sem base no Congresso, uma aliança entre Moro e Huck precisaria do apoio não só do centrão, mas de partidos com grandes bancadas, como MDB e DEM, que somam 63 deputados.Congressistas avaliam que alianças apenas eleitorais pouco contribuiriam para criar situação de governabilidade. Por isso, consideram que o tempo de dois "outsiders" na mesma chapa se encerrou com a eleição de Bolsonaro. Acham mais viável uma chapa com uma figura de alta popularidade fora da política compondo com algum político de partido estabelecido.A viabilidade da chapa esbarra em outros entraves.Um deles é a interpretação de que Huck e Moro não representariam uma candidatura de centro, como argumentou o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), presidenciável que terminou em terceiro lugar na eleição de 2018."No dia em que [o governador de São Paulo, João] Doria, Huck e Moro forem de centro, eu sou de ultraesquerda, o que eu nunca fui", disse na segunda-feira.O senador Otto Alencar tem posição parecida, afirmando que Moro é uma figura política de direita. "Se o Moro foi ser ministro de Bolsonaro é porque ele concorda com o Bolsonaro. Se a demissão mudou o juízo dele, aí é outra história", provocou o senador.Em setores do Congresso, o discurso anticorrupção de Moro abre portas, enquanto há dúvidas sobre quais pautas seriam prioritárias para Huck --para alguns, o apresentador é pouco liberal e inclinado a uma agenda social.Mas o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro também tem rejeição forte, principalmente de deputados que criticam a forma como ele conduziu a Lava Jato.A aproximação de Luciano Huck e Sergio Moro seria, na leitura de congressistas, um balão de ensaio para testar a recepção aos dois nomes. Nesse contexto, alguns interpretam a decisão de Huck de almoçar com Maia logo depois das críticas do presidente da Câmara ao ex-ministro como uma tentativa de reorganizar o apoio.Assim, em vez de compor chapa com o ex-juiz, Huck poderia se filiar ao DEM. Isso abriria caminho para uma aliança com o governador tucano João Doria.Isso eliminaria um dos argumentos fortes usados contra o discurso de que a aliança é uma alternativa ao governo. Afinal, Sergio Moro fez parte do governo Jair Bolsonaro até abril deste ano.