Atualizada às 12h33

Depois de 25 anos de luta, os povos Apinajé têm agora a esperança de demarcação das terras. Nesta quinta-feira, 25, a Justiça determinou que a  Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União concluam, em um prazo de dois anos,  o processo administrativo de ampliação dessas terras. 

Segundo o MPF, a sentença é resultado de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) em novembro de 2019. Já o processo de identificação, delimitação e demarcação da área foi iniciado em 1994. Para o ministério, a inação do Estado viola direitos indígenas, gera conflitos fundiários e torna necessária a intervenção do Poder Judiciário.

A sentença, assinada pelo juiz Victor Curado Silva Pereira, da Seção Judiciária de Araguaína, destaca que a morosidade da Funai em concluir a análise sobre os limites da área pertencente aos indígenas viola o direito à razoável duração do processo e contribui para o aumento da violência na região. “O povo Apinajé tem que conviver com a invasão e exploração pelos não-índios das terras que entendem ser de sua posse por destinação constitucional, cenário que provoca embates armados na região e que poderia ser dissipado pela atuação tempestiva da Funai na execução do seu mister”.

A decisão também destaca que, apesar da demarcação de territórios indígenas ser um procedimento de alta complexidade, que demanda tempo e recursos diversos, não há justificativa para a inércia da Funai, que já dura mais de duas décadas. 

A sentença ainda aponta que a União falhou no controle finalístico da autarquia, deixando de adotar medidas administrativas adequadas à proteção da posse dos índios sobre as terras que habitam.

O ministério ressaltou     que a decisão enfrenta a alegação das rés de que o Poder Judiciário não pode interferir em políticas públicas de responsabilidade do Executivo, sob risco de violação do princípio da separação dos Poderes. Porém, conforme o juiz, “tal debate não encontra terreno quando se estão em jogo direitos fundamentais constitucionalmente tutelados, como o direito à razoável duração do processo e a posse dos indígenas às suas terras tradicionais”. 

Através da assessoria de imprensa do MPF, o procurador da República Thales Cavalcanti, autor da ação, afirma que a sentença é uma vitória importante na luta da instituição em defesa dos direitos indígenas. De acordo com o procurador, a construção de estradas como a Belém-Brasília e a Transamazônica, além de promover a desestruturação social do povo Apinajé, em razão da chegada de milhares de migrantes na região, resultou na exclusão de parcela de seu território tradicional durante o processo de demarcação oficial. "A retomada do processo de ampliação da Terra Indígena Apinajé representa um passo importante para devolver à comunidade a posse das terras por eles tradicionalmente ocupadas", analisou.

Luta

As terras Apinajé estão localizadas entre a margem esquerda do Rio Tocantins e a margem direita do rio Araguaia, no norte do estado do Tocantins, Brasil, na região conhecida como Bico do Papagaio.

Conforme o site do Instituto Socioambiental, os Apinajé estão classificados como Timbira Ocidentais e caracterizam-se por uma sofisticada organização social composta por vários sistemas de metades cerimoniais e aldeias relativamente populosas. 

O portal também informou que na segunda metade do século XX sofreram uma grande depopulação e desestruturação social, quando seu território foi invadido por centenas de famílias de migrantes e tiveram suas terras cortadas por estradas, como a Belém-Brasília e a Transamazônica. Após essas rodovias, houve a exclusão de uma parcela de seu território tradicional na demarcação oficial de sua terra, a qual eles vêm buscando recuperar.

Demarcação 

O doutor em antropologia Odair Giraldin, professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT), do campus de Tocantinópolis, norte do Estado, que pesquisa os povos Apinajé desde 1995, ressalta que a demarcação dessa área, definida como indígena ainda na década de 80, quando quando foi feito  o reconhecimento do território e na hora de fazer a demarcação essa área foi retirada. Segundo ele, os militares na época alegavam que haveria um problema porque já o traçado da Transamazônica que margeava o território Apinajé, ou seja, se demarcasse também a área 2, que é a área do Mumbuca, a BR-230 Transamazônica passaria por dentro da área indígena. “Eles alegam  questões de segurança nacional para não ter uma estrada cruzando a área indígena. Então eles excluíram a área 2 e aumentaram um pouco na área da região, próxima ao Rio Tocantins”, explica. 

Porém, ele diz que os Apinajés são dois grupos, que sempre tiveram território tradicional de caça e de coleta de materiais importantes como, por exemplo, para fazer arco e flecha. “Então aquele argumento antigo de que haveria uma estrada que cruzaria a área indígena não existe mais. E sendo um território tradicionalmente já reconhecido desde a década de 90, não faz de fato nenhum sentido a Funai e os órgãos do poder Executivo responsáveis pela demarcação não cumprirem essa decisão. Então a justiça está agindo de forma correta e esperamos que isso possa, de fato, que essa demarcação ocorra o mais breve possível. Ela atenderá muito as necessidades e os direitos dos povos neste território tradicionalmente ocupado”, finaliza. 

O Jornal do Tocantins aguardo posicionamento da Funai a respeito do assunto.