Decisão do juiz eleitoral Antiógenes Ferreira de Souza, da 29ª Zona Eleitoral de Palmas, devolveu para a Justiça Federal em Palmas julgar uma das principais ações criminais da Operação Ápia. A ação é a terceira denúncia feita à Justiça Federal, em 2019, por uma força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF). O caso tramitava na 4ª Vara Federal do Tocantins, mas após reclamação dos réus, o Supremo Tribunal Federal (STF) encaminhou o caso para 29ª Zona Eleitoral, que recebeu o processo da Justiça Federal, após o declínio de competência, no dia 14 de dezembro de 2020.Em fim março deste ano, o juiz sentenciou que não havia evidências da ocorrência e conexão de eventuais crimes eleitorais com a denúncia e remeteu o caso de volta para a Justiça Federal, mas houve recursos contra esse entendimento.Os autores dos recursos são o ex-governador Sandoval Cardoso (SD), o empresário Wilmar Bastos, dono da Eletro Hidro (EHL) e o deputado estadual Eduardo Siqueira Campos (DEM).Nesta decisão de agora, o juiz rejeitou estes recursos e confirmou a devolução da ação para a a 4ª Vara da Justiça Federal.Quem são os réus desta açãoSão réus nesta ação os ex-governadores Siqueira Campos (PL) e Sandoval Cardoso (SD), o ex-presidente da antiga Agetrans, atual Ageto (Agência Tocantinense de Transportes e Obras), Alvicto Nogueira, o Kaká, cunhado de Sandoval e o deputado estadual Eduardo Siqueira Campos (DEM). Eduardo ocupava o cargo de secretário Estadual de Relações Institucionais e de Planejamento e Modernização da Gestão Pública no governo do pai, entre 2011 e 2014.Outro réu é o ex-superintendente de Operação e Conservação de Rodovias da antiga Agetrans, Renan Bezerra de Melo Pereira, filho do ex-procurador-geral de Justiça Clenan Renaut de Melo Pereira. O quinto réu da ação é o empresário Wilmar Oliveira de Bastos, dono da EHL (Eletro Hidro), conhecido como “Chatão”.O Ministério Público Federal (MPF) acusa os cinco réus de peculato, corrupção passiva, corrupção ativa, crimes contra o sistema financeiro nacional e dos crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores. Segundo a denúncia, em associação com “empresário corruptor contratado pelo Poder Público”, eles teriam desviado recursos públicos com atesto fraudulento de cumprimento de contrato administrativo em percentual irreal e causou pagamentos indevidos por serviços não executados. O dinheiro desviado era integrado ao patrimônio dos envolvidos por meio de atos de lavagem de capitais.Valores envolvidos passam de R$ 1,3 bilhãoNa denúncia os procuradores do MPF calculam que entre 2013 e 2016, a construtora EHL movimentou em suas contas bancárias, a crédito e débito somados, a quantia de R$ 2.544.304.404,96, apurados a partir da quebra sigilo bancário. Desse valor, o maior faturamento da existência - R$ 1.308.710.431,15 – segundo a denúncia, ocorreu em 2014, ano de maior atividade do grupo denunciado e coincidente com o momento de execução maior dos contratos investigados. Segundo o MPF, o empresário teria repassado propina para Sandoval Cardoso, Kaká e Eduardo Siqueira, “agindo em conluio” com Siqueira Campos. Um dos delatores do esquema, ex-servidor da Agetrans, trazido do Piauí por seu ex-patrão, Kaká Nogueira, contou na delação que havia a cobrança de 10% de propina para Eduardo e os quando os “empreiteiros não entregavam diretamente para ele” quem levava era um homem identificado como Erlon. Além do recebimento de valores indevidos, o MPF imputa a Eduardo o uso de aeronaves do empresário Wilmar para viagens com a família e de recorrer ao empreiteiro para que quitasse dívidas pessoais do gestor. Além de Renan, outros dois irmãos dele, Fábio Bezerra de Melo e Juliana Bezerra de Melo e o pai dele também são réus em outras ações decorrentes da Operação Ápia.O que os alvos pediram no recursoEduardo Siqueira pediu a declaração da nulidade de todos os atos praticados na Justiça Federal, alegando se tratar de juízo incompetente. Também pediu a remessa desse processo para o Ministério Público Eleitoral para análise e eventual oferecimento de nova denúncia. Wilmar Bastos pediu que o processo seguisse para a justiça comum de Palmas.Razões para a devolução à Justiça FederalUm dos motivos para o caso ter ido para a Justiça Eleitoral é a menção, no contexto dos supostos crimes, de direcionamento de contratos para municípios comandados por prefeitos identificados como apoiadores do então governador Cardoso. Desse modo, a execução de obras públicas na região produziria “dividendos políticos” em seu favor.A PF afirmou ao juiz, no processo, que não há no relatório do Inquérito Policial o indiciamento pela prática de crime eleitoral, nem a PF concluiu sobre ocorrência de ilícitos penais eleitorais, também não imputou qualquer conduta que configurasse delito eleitoral a nenhum dos alvos e não há no processo quaisquer “elementos que indiquem a ocorrência de delitos eleitorais”.O juiz Sousa concluiu que nenhuma das hipóteses de conexão foram caracterizadas a ponto de justificar a permanência do caso na Justiça Eleitoral e mantinha o entendimento de que, no atual estágio processual, devolvia o processo à Justiça Federal para “o prosseguimento do processamento dos crimes comuns.”O que diz a denúncia sobre os réusSobre "Chatão"Chatão é apontado na ação como “o agente corruptor responsável pelo oferecimento de vantagem indevida para agentes políticos e servidores públicos, com vista a organizar um método de desvio de recursos públicos que consistia no atesto de percentual fictício de execução de obras contratadas, o que redundaria na autorização indevida de pagamentos pelo Estado do Tocantins, porquanto, o serviço contratado e pago não teria sido efetivamente prestado”.Sobre SandovalDe acordo com o processo, Cardoso dava sustentação política ao suposto esquema de desvio de recursos públicos, que dependia da indicação do presidente da Agetrans, responsável pela condução do serviço público de pavimentação e conservação asfáltica no Estado. Também foi dele a decisão de nomear o superintendente de Operação e Conservação de Rodovias, “ambos agregados ao esquema criminoso, de modo a comprometer a fiscalização e o controle interno da Administração Pública.”Sobre Eduardo SiqueiraSegundo o processo, a PF e o MPF afirmam que Eduardo “possuía elevada proeminência e projeção política no Estado do Tocantins, integrando o mesmo grupo político do então Governador e orquestrando com ele o suposto esquema delituoso de desvio de recursos públicos.”Sobre Kaká NogueiraSupostamente, escreve o juiz Maia, teria sido nomeado “com vista a colaborar no funcionamento do planejamento criminoso de desvio de recursos públicos, garantindo a falsa fiscalização e atesto fraudulento de cumprimento de contrato de pavimentação asfáltica em percentual fictício.”Sobre Renan Bezerra“Supostamente corrompido, comprometeu-se e realizou medições fraudulentas de pavimentação asfáltica desempenhada pela empresa contratada EHL, no interesse de proporcionar pagamentos superiores e sem correspondência com o serviço efetivamente prestado”, escreve o juiz, com base nas peças do processo.