Os gastos de saúde dos parlamentares e ex-parlamentares no Senado têm crescido nos últimos anos e alcançaram R$ 14,9 milhões somente em 2020, sendo que R$ 6,89 milhões correspondem a ressarcimentos.

Os valores superam os gastos dos nove anos anteriores. No ano passado, houve crescimento de 38% nos valores reembolsados na comparação com 2019, por exemplo.

Em 2019, foram R$ 13,89 milhões de serviços médicos-hospitalares, odontológicos e laboratoriais, sendo R$ 4,98 milhões de ressarcimentos.

Os dados globais estão disponibilizados no site do Senado, mas a Casa se recusa a passar as informações detalhadas por parlamentar.

Há seis meses a Folha solicita, por meio da Lei de Acesso à Informação, os gastos individualizados por senador.

"Esses dados individualizados representam informação diretamente relacionada ao estado de saúde do indivíduo, sendo protegida pelo Código de Ética do Conselho Federal de Medicina por envolver o sigilo profissional, e também em respeito à intimidade das pessoas”, informou o Senado em resposta à reportagem.

No entanto, Maria Dominguez, pesquisadora da Transparência Internacional Brasil, discorda que partes dos dados não possam ser disponibilizados. Ela disse que as informações sobre gastos parlamentares devem ser públicas, como alimentação, combustíveis, saúde.

Segundo ela, informações de saúde são consideradas dados pessoais sensíveis e relacionados à intimidade, de acordo com a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Mas a atenção seria na divulgação das condições médicas ou da natureza dos tratamentos médicos a que os parlamentares foram submetidos.

Nesse caso, tais dados devem ser publicados com os processos de anonimato previstos na lei.

Entretanto, os valores dos gastos com saúde não podem ser omitidos, na avaliação da pesquisadora. Para ela, esses dados auxiliam o controle social, aumentam a transparência e são essenciais para a detecção de possíveis fraudes, desvios e mau uso.

“Ainda mais por serem gastos tão elevados, é necessário que esses recursos públicos investidos sejam divulgados pela Câmara e pelo Senado, inclusive desagregados por parlamentar, atualizados, em formato aberto, e com séries históricas que permitam a comparação.”

Guilherme France, advogado e consultor em transparência, disse que o fornecimento de informações sobre tratamentos e procedimentos médicos realizados por parlamentares comporta uma preocupação com seu direito à privacidade e à intimidade.

No entanto, é necessário que todo esforço seja feito para que boa parte dessas informações fique disponibilizada ao público sem violar esses direitos, seja por transparência ativa ou passiva.

Ele acrescenta que existem ferramentas como tarjas e anonimização que permitiriam o fornecimento de informações sobre as despesas arcadas pelos cofres públicos, sem que se divulgue qual foi o tratamento médico a que se submeteu o parlamentar.

“No caso de despesas com saúde e pagamentos de reembolsos pela Câmara e pelo Senado, os órgãos poderiam fornecer informações sobre os tipos de serviços médicos que são objeto de pedidos de reembolso por parlamentares ou sobre os prestadores que os oferecem. Essas informações permitiriam, por exemplo, que se avaliasse a política de reembolso e a adequação da rede médica dos planos de saúde.”

Sob a presidência atual de Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o Senado informou, em nota, que a Casa custeia parcialmente as despesas realizadas com exames e tratamentos médicos, odontológicos, fisioterápicos ou psicoterápicos de senadores e seus dependentes, assim como de ex-senadores e seus cônjuges.

Os parlamentares e dependentes, ex-parlamentares e cônjuges fazem parte do plano médico e odontológico SIS/Saúde, cuja contribuição mensal varia de acordo com a faixa etária.

Segundo o Senado, o SIS contempla hospitais como Albert Einstein e Sírio-Libanês. Nesses locais, o beneficiário tem direito a atendimentos de urgência e emergência, atendimento ambulatorial, realização de exames, internação e cirurgia. Contudo, fica responsável pelos honorários médicos, dos quais pode obter ressarcimento parcial.

O beneficiário também pode utilizar serviço não credenciados à rede, sendo assegurado ao beneficiário-titular o reembolso parcial da despesa. O pedido deve ser feito em até 60 dias.

Nesta terça (20), a Folha mostrou que o presidente Jair Bolsonaro​ obteve em junho de 2019 um reembolso de R$ 435.347,23 da Câmara dos Deputados relativos a despesas com saúde.

O valor foi ressarcido em seu primeiro ano como presidente da República e nove meses após ter levado uma facada em Juiz de Fora, Minas Gerais, em tentativa de assassinato na campanha eleitoral de 2018.

A Câmara, porém, se recusa a informar sobre quando se refere essa despesa. Informou apenas que é relativo ao período que ele ainda era deputado federal.