A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (1º) em dois turnos a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que adia as eleições municipais de outubro para novembro deste ano e muda outros prazos, em tentativa de adaptar a disputa à pandemia do novo coronavírus.

O texto, que já havia passado pelo Senado, segue agora para promulgação em sessão do Congresso que deve ocorrer nesta quinta-feira (2), às 10h.

O adiamento das eleições foi aprovado após o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), negociar um acordo para romper a resistência de partidos do centrão, que se aproximou nos últimos meses do presidente Jair Bolsonaro.

A PEC adia o primeiro turno das eleições municipais de 4 de outubro para 15 de novembro. O segundo turno, onde houver, passa de 25 de outubro para 29 de novembro.

Para ser aprovada na Câmara, a proposta precisava do voto favorável de três quintos dos 513 deputados (308 votos).

O texto reuniu 402 deputados a favor no primeiro turno (90 contra) e 407 (70 contra) no segundo turno da votação da Câmara.

Somente dois partidos, PL e PSC, orientaram suas bancadas contra o adiamento das eleições. PROS, Patriota e governo liberaram.

O relator da PEC na Câmara, deputado Jhonatan de Jesus (RR), líder do Republicanos, não fez alterações ao texto do Senado. Deputados, depois, retiraram dois trechos do texto-base.

Pela proposta aprovada, as emissoras ficam proibidas de transmitir programa apresentado ou comentado por pré-candidato a partir de 11 de agosto —antes, o prazo começava a contar a partir de 30 de junho.

A PEC também altera datas da realização de convenções partidárias para escolha dos candidatos e deliberações sobre coligações, o início da propaganda eleitoral e a prestação de contas de campanha dos candidatos.

O texto mexe no prazo para desincompatibilização ainda em vigor. Pelo calendário do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o prazo máximo para afastamento de alguns cargos é de três meses antes da eleição —ou seja, 4 de julho.

Segundo a PEC, prazos que ainda não venceram até a publicação da emenda constitucional vão considerar a nova data das eleições. Já os que passaram não serão reabertos.

O texto permite a realização, no segundo semestre do ano, de publicidade institucional de atos e campanhas dos órgãos públicos municipais e de suas respectivas entidades da administração indireta destinados ao enfrentamento da pandemia e à orientação da população sobre os serviços públicos. Mas indica que condutas abusivas serão apuradas.

A proposta original previa que, se não houvesse condições sanitárias em um município para a realização das eleições nas datas estabelecidas pela PEC, o TSE poderia designar novas datas, com data-limite em 27 de dezembro. Os deputados retiraram esse trecho.

No caso de estados, se não houver condições sanitárias, o Congresso determinaria nova data, após provocação do TSE. Os deputados fizeram uma emenda de redação para incluir nesse dispositivo a possibilidade de o Congresso, também após provocação do TSE, definir datas de eleições em municípios que não tiverem condições sanitárias.

Os deputados também retiraram inciso que dizia que o TSE teria que adequar as resoluções que disciplinam o processo eleitoral para atender à PEC.

No entanto, mantiveram dispositivos que autorizam o tribunal a ajustar normas referentes a prazos para fiscalização e acompanhamento dos programas de computador utilizados nas urnas eletrônicas para os processos de votação e também a recepção de votos, justificativas, auditoria e fiscalização no dia da eleição.

Isso incluiria o horário de funcionamento das seções eleitorais e a distribuição dos eleitores no período, para melhorar a segurança sanitária.

Segundo o deputado Alessandro Molon, líder do PSB na Câmara, é preciso garantir que os brasileiros possam votar sem medo de serem contaminados pela doença.

“Queremos garantir o direito democrático do maior número de brasileiros irem votar nessas eleições. Não adiar significa excluir milhões de brasileiros que teriam medo de ir votar por fazerem parte de algum grupo de risco ou pela própria preocupação de contrair a doença.”

Rodrigo Maia negociou com partidos do centrão para vencer a resistência ao adiamento das eleições.

O centrão é formado por partidos como PP, PL e Republicanos, que, juntos, representam a maioria da Câmara e têm oferecido apoio a Jair Bolsonaro em troca de cargos.

O grupo passou a ser contra o adiamento da eleição municipal após Maia e o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, excluírem a possibilidade de prorrogação de mandatos.

Caciques dessas siglas têm o controle de boa parte das prefeituras e, com os atuais prefeitos, avaliavam que uma campanha eleitoral mais curta elevaria a chance de reeleição.

Para essas siglas, Maia costurou acordo que envolve a prorrogação da MP 938, que transfere recursos da União a estados e municípios.

A medida provisória garantiu que, de março a junho, prefeituras e governos estaduais não tivessem perdas no FPM (Fundo de Participação dos Municípios) e no FPE (Fundo de Participação dos Estados), mesmo com a forte queda na arrecadação federal. A intenção é prorrogar os repasses até dezembro.

A MP reservou até R$ 16 bilhões para manter os repasses do FPM e do FPE nesses quatro meses.
Com as três primeiras parcelas, foram usados cerca de R$ 6 bilhões. A expectativa é que, com a última parcela, sobrem cerca de R$ 5 bilhões para serem direcionados às prefeituras.

Por isso, parlamentares defendem que não haveria custo adicional para prorrogar essa medida até o fim do ano, já que os recursos seriam suficientes para atender aos estados e municípios além dos quatro meses estipulados pela MP.

A prorrogação foi uma das contrapartidas oferecidas a prefeitos que buscam a reeleição.

Parte do acordo costurado por Maia para atrair o centrão também envolve a aprovação de um projeto, no Senado, que retoma a propaganda partidária gratuita. A negociação foi feita em conjunto com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Líderes partidários no Senado rechaçaram o acordo. O projeto, de autoria do senado Jorginho Mello (PL/SC), tramita na Casa desde agosto do ano passado. Ele está parado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) à espera de relator.

“O que pegou mal foi essa questão de impor isso [colocar o projeto em votação]. Eu sou contra. Não podem colocar e exigir isso. Não seria nem inteligente por parte da Câmara fazer condicionantes, nem justificável perante a sociedade uma barganha desse tamanho. É um toma-lá-dá-cá, uma negociação de balcão que não condiz com o Congresso Nacional”, criticou a presidente do colegiado, senadora Simone Tebet (MS).

Pesou também para a mudança de humor do centrão a avaliação de que, caso a Câmara não aprovasse o adiamento, ficaria com o ônus de contrariar a avaliação de especialistas, do Senado e de boa parte do judiciário em favor do adiamento da eleição.

O TSE ainda enfrenta outras incertezas no planejamento da disputa municipal deste ano.

A corte já estuda descartar o uso da identificação por biometria, e a ampliação do horário de votação e a divisão de eleitores por faixa etária são decisões pendentes. O TSE também busca formas de acelerar o processo de votação a fim de evitar aglomerações durante a pandemia do novo coronavírus.