Ao anunciar que permanece no PSDB e renuncia ao Governo do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite afirmou nesta segunda-feira (28) que está se apresentando em eleições que considera críticas.

Leite afirmou que viabilizar uma alternativa para o Brasil é algo mais importante do que as prévias do PSDB.

Como revelou a Folha, o governador gaúcho decidiu não aceitar o convite do PSD de Gilberto Kassab para ser candidato a presidente da República, mas deixará o Palácio Piratini até dia 2 de abril, prazo legal, para tentar viabilizar sua candidatura ao Planalto pelo PSDB e como representante da terceira via.

O PSDB, no entanto, já escolheu o governador de São Paulo, João Doria, como presidenciável da sigla, em prévias que Leite perdeu em novembro passado.

Na última pesquisa do Datafolha, divulgada na semana passada, Leite apareceu com 1% as intenções de voto no cenário em que ele substitui Doria como candidato. O governador paulista marca 2%.

Aliados de Leite no partido, liderados pelo deputado Aécio Neves (PSDB-MG), trabalham para que o nome do gaúcho seja chancelado por outros partidos da chamada terceira via, sob o argumento de que ele seria um candidato mais viável que Doria.

A aposta é a de que Doria não deve decolar nas pesquisas até o meio do ano, o que levaria o PSDB a buscar alternativas. Como mostrou o Painel, o plano é que Leite viaje pelo país e inicie sua pré-campanha após deixar o governo.

Aliados de Doria, porém, rechaçam a troca da candidatura, argumentando que as prévias foram um processo legítimo e chancelado pelo partido e pela Justiça Eleitoral. Neste domingo (27), Doria afirmou que desrespeitar as prévias seria um golpe.

"As prévias valem. Qualquer outro sentimento diferente disso é golpe. Uma tentativa torpe, vil, de corroer a democracia e fragilizar o PSDB", disse Doria.

O governador também retuitou uma mensagem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). "As prévias do PSDB foram realizadas democraticamente. Assim sendo, penso que devem ser respeitadas", publicou FHC nesta segunda.

Em vídeo para as redes sociais, Leite afirmou que vai "renunciar ao poder para não renunciar à política". "Preciso participar ativamente desse momento tão decisivo do nosso país e no meu estado", completou.

"A minha escolha impacta bem mais do que a minha vida, [...] e por isso foi tão ponderada, tão demorada e tão difícil", disse. No vídeo, ele exalta a mudança geracional e líderes mundiais jovens. Também defendeu a diversidade.

Durante meses, Leite chegou a conversar com o PSD e ensaiar uma migração, vendo aliados como os secretários estaduais Agostinho Meirelles e a ex-senadora Ana Amélia Lemos se filiando ao partido. Por fim, decidiu permanecer no partido pelo qual se elegeu vereador e prefeito em Pelotas e governador em 2018.

Leite foi convencido por aliados tucanos de que sua candidatura no PSD seria isolada, sem a coligação com siglas aliadas, e pressionada por membros da sigla aliados ao presidente Jair Bolsonaro (PL) ou ao ex-presidente Lula (PT).

Depois de tentar lançar Leite e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) sem sucesso, agora Kassab mira no ex-governador Paulo Hartung (ES) como nome do partido para o Planalto.

O próprio Leite divulgou em suas redes sociais a carta em que caciques do PSDB, como os senadores José Serra (SP) e Tasso Jereissati (CE), o presidente nacional, Bruno Araújo, e outros pediam que reconsiderasse a filiação, dizendo que não poderiam perdê-lo.

A última assinatura no documento, do presidente estadual do PSDB em São Paulo, Marco Vinholi, secretário do governo Doria, chamou a atenção. Doria disse mais tarde que foi um pedido seu.

Em entrevistas, Leite falou sobre ter sido abordado para uma candidatura nacional e pontuou sobre a dificuldade de Doria em crescer nas pesquisas, mesmo no próprio estado, além dos índices de rejeição do paulista.

Leite já havia descartado a disputa pela reeleição ao governo gaúcho durante seu mandato, apesar de pedidos de aliados para reconsiderar.

Crítico da reeleição, o governador já havia prometido não concorrer a um segundo mandato --ele também não disputou a reeleição na prefeitura de Pelotas. Leite avalia que conseguiu apoio a projetos importantes do seu governo na Assembleia Legislativa, de partidos como o MDB, por ter esse compromisso.

No entanto, encontrar um nome para a sucessão de sua gestão e definir a costura política entre partidos da base tem se mostrado difícil. Enquanto Leite pontua bem nas pesquisas estaduais, seus indicados não.

Apesar de nomes levantados em bastidores, Leite já defendeu em público seu vice, Ranolfo Vieira Júnior, que trocou o PTB pelo PSDB depois de críticas de Roberto Jefferson à gestão, como candidato natural. A prefeita de Pelotas, Paula Mascarenhas (PSDB), também é uma opção.

Leite fez o anúncio acompanhado de Ranolfo, Mascarenhas e de outros tucanos, como o presidente do PSDB-RS, deputado federal Lucas Redecker, e o ex-prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan.

Nascido em Pelotas, Leite foi eleito vereador na cidade natal aos 23 anos, sendo ainda secretário municipal e presidente da Câmara.

Em 2012, foi eleito prefeito, aos 27. Ao fim do mandato, com aprovação alta e abrindo mão da reeleição, conseguiu eleger sua vice, Paula Mascarenhas.

Em 2018, ele chegou ao segundo turno da disputa para o governo gaúcho contra o então mandatário José Ivo Sartori (MDB) -o Rio Grande do Sul nunca reelegeu um governador. Foi eleito com 53,6% dos votos válidos.

No governo, Leite encaminhou privatizações, incluindo a Corsan (Companhia Riograndense de Saneamento), voltando atrás em uma promessa de campanha, avançou em reformas e conseguiu a adesão do estado, que tem uma das situações mais críticas de dívida no país, ao RRF (Regime de Recuperação Fiscal).

No ano passado, em entrevista ao programa Conversa com Bial, da TV Globo, ele falou pela primeira vez publicamente sobre sua sexualidade, afirmando ser "um governador gay" e assumindo o relacionamento com o médico Thalis Bolzan.

A declaração levou Leite a ser questionado sobre o voto em Bolsonaro, em 2018, apesar de falas homofóbicas do presidente ao longo dos anos.

O gaúcho tentou se descolar da imagem de Bolsonaro, com quem teve um racha durante a pandemia. Leite afirma que seu apoio se deu por entender que a volta do PT seria pior, mas que nunca misturou seu nome ao de Bolsonaro.

A referência é uma crítica a seus adversários -Doria fez isso em campanha, com o "BolsoDoria", assim como Sartori, que adotou o "Sartonaro".

À Folha Leite lembrou que sua orientação sexual fora usada por adversários para chantageá-lo no passado e queria entrar na disputa nacional sem que houvesse insinuações de que teria algo a esconder.

"No momento em que eu vou dando passos em direção a um projeto nacional, se intensificam ataques homofóbicos, com insinuações que eu teria algo a esconder", disse ele.

"Quero deixar claro que eu não tenho nada a esconder. Tantos outros políticos que escondem coisas erradas, mensalão, petrolão, 'rachadinha', superfaturamento de vacina. Ao me apresentar nessa inteireza, fico feliz de inspirar outras pessoas para que não cortem mais um pedaço de si, por conta de bullying pela orientação sexual."