Com as interferências na Polícia Civil e o esquema de propina investigado no Plansaúde ainda na fase de inquérito revelados no dia 20, o uso de, pelo menos, 145 servidores fantasmas na campanha das eleições suplementares em 2018, pelo governador afastado Mauro Carlesse (PSL), já está consubstanciado em uma denúncia da subprocuradora da República, Lindora Araújo, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), como o JTo já mostrou. A novidade é que a ação penal, que tem base na Operação Catarse, da Polícia Civil do Tocantins, pede a decretação do cargo do governador ao ministro relator, Paulo de Tarso Sanseverino. A ação pede ainda a perda do cargo da deputada Valderez Castelo Branco (PP) e inclui mais dois réus, a chefe de gabinete da deputada, Noélia Terezinha Vieira de Carvalho e do ex-secretário estadual da Administração, Neyzimar Cabral. O ministro, que chegou a comparar a gravidade do caso sob sua relatoria com as investigações que afastaram Mauro Carlesse já remeteu uma carta criminal para a Justiça Federal no Tocantins notificar o governador afastado para apresentar sua defesa prévia.Advogado do governador afastado, Juvenal Klayber disse ter ciência do envio das cartas para notificação pelo andamento do processo no STJ e apresentará a defesa assim que Carlesse receber a notificação. Carlesse está afastado desde o dia 20 de outubro por ordem do ministro Mauro Campbell Marques, relator dos inquéritos das operações Hygea e Éris.A deputada Valderez disse que vai aguardar o andamento processual, com a sua regular citação, para se manifestar, mas afirma estar “tranquila” em relação à denúncia e acredita “que todas as questões serão esclarecidas à justiça".Acusação é de peculato e organização criminosaA sub procuradora acusa os quatro de peculato-desvio e de organização criminosa. A imputação de peculato recai sobre o desvio de R$ 277,4 mil, valor correspondente às remunerações de “servidores públicos” contratados pelo Executivo estadual, de forma fraudulenta, para trabalharem como empregados particulares nas campanhas eleitorais do governador e da deputada. Sobre a acusação de organização criminosa, Lindora Araújo afirma que atuavam de forma estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas para obter vantagem econômica com a prática criminosa de peculato. A denúncia reporta ao mandato interino de Carlesse, que assumiu o governo após a cassação de Marcelo Miranda (MDB). Segundo o processo, cerca de 145 servidores nessa condição de nomeação estatal para atuação eleitoral entre os 1.929 servidores que tiveram os contratos extintos durante as eleições suplementares, pelo ato 139, do dia 24 de abril de 2018. Mas a subprocuradora afirma que as buscas e apreensões cumpridas em março do ano passado, no Palácio Araguaia e na residência de Carlesse, na Operação Assombro, encontraram mais de 700 pedidos de contratação para servidores feitos pela deputada, na sala do ex-chefe de gabinete de Carlesse, Divino Allan Siqueira. O celular da deputada, apreendido na operação, revelou, segundo a denúncia mais de 1.180 conversas explicitando como são tratadas as questões relacionadas às contratações, à estrutura de comando, à divisão de tarefas e à participação direta da parlamentar e da servidora do gabinete dela, Noélia Terezinha Vieira de Carvalho. 11 casos de fantasmas embasam petiçãoDe acordo com a denúncia, no dia 16 de maio de 2018, o novo secretário de Administração Neyzimar Cabral de Lima baixou portaria excluindo daquele ato os 145 servidores que seriam fantasmas e tiveram os contratos restaurados, todos lotados na Superintendência de Administração e Finanças da então Secretaria Geral de Governo. Para Lindora, a extinção exclui os servidores aliados do governador cassado Marcelo Miranda e manteve apenas os que firmaram apoio a Carlesse. A denúncia afirma que, sob o mando do governador, a motivação de Cabral para reativar os contratos era “ideologicamente falsa” na medida que contratou os servidores para serem cabos eleitorais e não para as funções que foram contratados.Cerca de 11 desses casos, analisados para esta denúncia (confira a infografia), estão com pedido para que sejam remetidos à Polícia Civil e ao Ministério Público para apuração de crimes e improbidade, sob a supervisão da Justiça Estadual, porque não possuem foro privilegiado.Os nomes são Danilo Ugles Soares Ferreira; Elainy Hani da Silva; Mahmoud Wadih Elkadi; Maria Félix da Rocha; Paulo Raul Souza Ferreira; Maria Mirely Alves do Nascimento; Hayra Luanna Rodrigues de Moura Luz; Maria Batista de Almeida; Mário César Ferreira da Silva; José Neto Tavares de Miranda e Rosimar de Souza e Silva.Para cada um dos 11 casos de fantasmas que embasam a denúncia, há dezenas de print de diálogos, eventos, todo o histórico de cada contratação e a forma de atuações dos servidores relacionados na denúncia, para mostrar que atuavam na campanha e não no governo. A subprocuradora pede que eles sejam processados na Justiça estadual.Para a subprocuradora, Carlesse fraudou contratações de empregados, forjando contratos temporários com o Estado do Tocantins, do qual é gestor, mas quer eram seus cabos eleitorais. A deputada, então líder do governo, tinha a função de a articulação política com o governador e arregimentava os funcionários com promessas de vantagens. A chefe de gabinete é apontada como a responsável pela gestão e controle dos funcionários fantasmas, agir como intermediária da deputada, controlar folhas de frequência e os pagamentos dos assessores.A denúncia se baseia nos interrogatórios dos “ex-servidores” temporariamente contratados confessando que conseguiram os cargos públicos após pedidos à deputada e em troca trabalharam como “cabos eleitorais” na campanha dos dois políticos. Os celulares, dos servidores e dos políticos, apreendidos judicialmente, continham fotos e conversas realizadas pelo aplicativo WhatsApp. Segundo a subprocuradora, as provas comprovam a contratação sob fraude para atuação na campanha. A Procuradoria Geral da República perde a decretação da perda dos mandatos eletivos, cargos, empregos ou funções públicas de Mauro Carlesse, Valderez Castelo Branco, Noélia Carvalho e Neyzimar Lima. Lindora pede ainda que sejam condenados ao pagamento de indenização mínima de R$ 277.432,35, correspondente ao montante desviado e pagos ilicitamente aos contratados e e mais R$ 277.432,35 como danos morais, num total de R$ 554.864,70.Esse valor total também está em um pedido cautelar de bloqueio antecipado feito pela subprocuradora. Ela quer a proibição dos denunciados de manter contato com as testemunhas e declarantes indicados na denúncia e de todas as outras pessoas envolvidas. Outro pedido é que seja requisitado à Polícia Civil do Tocantins todas as cópias dos inquéritos que apurem a prática de fantasmas no serviço público que potencialmente contaram com a participação do governador e da deputada.