Delatores da Operação Lava Jato, o contador Roberto Trombeta e seu sócio Rodrigo Morales afirmaram em depoimento que combinaram a entrega de R$ 3 milhões, em dinheiro vivo, da montadora Caoa ao empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené -ligado ao governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT).

Bené, preso pela Operação Acrônimo, é acusado de ser o operador de propinas do governador petista.

O depoimento, se comprovado, corrobora a denúncia do Ministério Público Federal contra Pimentel e o empresário, apresentada em maio deste ano, que os acusa de corrupção e lavagem de dinheiro por fatos investigados na Acrônimo.

Trombeta e Morales dizem ter atendido a pedido do presidente do Grupo Caoa, Antonio Maciel Neto, feito durante reunião na casa do controlador da empresa, Carlos Alberto Oliveira Andrade, em agosto de 2014.

Trombeta diz que "chamou a atenção" a presença de Pimentel na casa do dono da Caoa, no mesmo dia da reunião, mas que não fez nenhum contato além do visual com o político -na época, candidato ao governo.

Os dois, que admitiram ter usado empresas de fachada para lavar dinheiro de propina na Lava Jato, afirmam ter trabalhado como consultores tributários da Caoa por "mais de 20 anos", e auxiliado o grupo na constituição de empresas no exterior -cujas contas, segundo eles, não eram declaradas à Receita Federal.

De acordo com Trombeta, foram feitos três pagamentos de R$ 500 mil a Bené, em setembro de 2014. O dinheiro era retirado no departamento financeiro da Caoa, que pediu "sigilo" sobre o assunto. O montante total não foi pago, segundo o documento, porque Bené foi preso antes de finalizados os repasses, em outubro daquele ano.

Os delatores admitem que não foram informados sobre o motivo dos pagamentos, mas, "pelo que [Benedito] deixou transparecer, se tratava de compromissos políticos".

Bené fechou recentemente um acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República, em que acusa o governador Pimentel de ter recebido propina superior a R$ 10 milhões. O governador nega e diz que as acusações são "absolutamente falsas".

Outro lado

Em nota, o advogado de Fernando Pimentel, Eugênio Pacelli, diz "não haver sombra de dúvida" de que "nada do que foi relatado liga Pimentel a essas supostas tratativas", e chamou o depoimento dos delatores de "uma flagrante leviandade".

"[Não há nada] além de 'ter avistado' alguém que poderia, em sua avaliação, ser Fernando Pimentel", diz o advogado.

O defensor ainda coloca em dúvida a integridade da delação de Trombeta, que já foi acusado de mentir e ocultar documentos pelo Ministério Público Federal. Os procuradores chegar a pedir para investigar e rescindir o acordo, mas o pedido foi negado pelo juiz Sergio Moro.

O Grupo Caoa nega irregularidades e disse desconhecer o conteúdo das delações de Trombeta e seu sócio.

Em nota, a empresa sustenta que sempre atuou de forma lícita, e que "desconhece os negócios e as empresas de Trombeta e Morales no exterior, as quais não fazem ou fizeram parte dos negócios internacionais da CAOA".

Lulinha

No depoimento à Procuradoria, os delatores também afirmam que a Caoa pagou R$ 300 mil à empresa Gamecorp, de Fábio Luís da Silva, o Lulinha -filho mais velho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O valor, segundo eles, apareceu em notas fiscais do departamento financeiro da montadora, mas que não tinham comprovação de "execução de serviços, contratos e/ou relatórios".

O episódio ocorreu em 2012. O fato ainda será apurado pela Procuradoria da República, que irá verificar se havia justificativa para os repasses.
A montadora nega irregularidades e afirma que os pagamentos foram legais, e se devem a inserções publicitárias em programas de TV, desenvolvidas pela Gamecorp.

O mesmo argumenta a defesa de Fábio Luís, que diz que recebeu o dinheiro legalmente e recolheu impostos sobre o valor.

"Somente o ambiente de perseguição ao ex-presidente Lula e seus familiares, por parte de algumas autoridades, poderia explicar a sua referência nessa delação premiada", afirmaram os advogados Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira, em nota.