Em 2019, o Congresso alterou vetos do presidente Jair Bolsonaro em quase 30% dos projetos barrados total ou parcialmente pelo chefe do Executivo. Se esse ritmo se mantiver, o volume de derrotas do Executivo no Legislativo caminha para um recorde. Em números absolutos, em seu primeiro ano de mandato, Bolsonaro já supera a quantidade de vetos alterados nos governos de Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff somados, segundo dados levantados pelo jornal O Estado de S. Paulo e pelo Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.O número de vetos de Bolsonaro derrubados parcial ou totalmente pelo Legislativo até agora só não é maior do que a soma daqueles rejeitados nos dois anos e meio da administração de Michel Temer. No período em que esteve à frente do Palácio do Planalto (2016 a 2018), Temer teve 21 reveses desse tipo.O veto nada mais é do que a discordância do presidente da República em relação a um projeto de lei aprovado pela Câmara e pelo Senado. Na prática, pode ser interpretado como jurídico, quando o texto é classificado como inconstitucional, ou mesmo político, sob a alegação de que a proposta fere o interesse público. Os dois motivos podem servir como justificativa, e cabe ao Congresso a palavra final.Cada veto pode trazer a rejeição do presidente da República a diversos trechos do mesmo projeto. O Congresso e o Palácio do Planalto contam como um único veto o do pacote anticrime, por exemplo, sancionado no último dia 24, embora haja 25 pontos suspensos por Bolsonaro."Na elaboração de leis, quem dá a última palavra sempre é o Congresso, 'derrubando' possíveis vetos. Não posso sempre dizer não ao Parlamento, pois estaria fechando as portas para qualquer entendimento", escreveu Bolsonaro em postagem publicada no Facebook ao comentar, na semana passada, a sanção do projeto anticrime.Bolsonaro não conseguiu manter integralmente os vetos assinados em 17 propostas aprovadas pela Câmara e pelo Senado. Em seis projetos, o Congresso derrubou o veto integral. Nos outros 11 textos, deputados e senadores retomaram 52 de 333 dispositivos que tinham sido retirados pelo presidente.Na comparação com o primeiro ano de governo de seus antecessores, o volume de derrotas do atual mandatário disparou: foram 29% rejeitados total ou parcialmente, ante 6,5% de Temer e 1,6% de FHC. Lula e Dilma não tiveram nenhum revés desse tipo no primeiro ano."É uma nova realidade política", afirmou o cientista político Murillo de Aragão, da Arko Advice. "O governo não tem uma maioria, e o partido (PSL) que apoiava o presidente se partiu pela metade. Atualmente, os bolsonaristas não chegam a 30 deputados", disse Aragão.Os vetos aumentaram a insatisfação do Congresso com o Planalto. Parlamentares acusaram o Executivo de quebrar acordos quando o presidente rejeitou propostas anteriormente negociadas pela liderança do governo. Foi assim em pelo menos dois projetos: o que prevê penas para condutas classificadas como abuso de autoridade e o que mexeu com regras dos partidos políticos.Em setembro, por exemplo, deputados e senadores retomaram diversos pontos da lei do abuso de autoridade que haviam sido vetados por Bolsonaro. Com a decisão, agentes públicos, incluindo juízes e procuradores, poderão ser punidos criminalmente por várias condutas, como obrigar um investigado ou uma testemunha a depor sem intimação prévia.Outro veto revertido pelo Congresso foi a brecha para aumentar o valor do fundo eleitoral, em 2020. Assim, foram garantidos R$ 2 bilhões de verba pública para os partidos usarem nas campanhas municipais do próximo ano.HistóricoEm um ano, Bolsonaro teve apenas quatro derrotas a menos do que Temer em dois anos e meio de governo, levando-se em conta quatro vetos do ex-presidente rejeitados em 2019. Dilma Rousseff, por sua vez, teve sete vetos derrubados nos cinco anos e meio de gestão. Lula, em oito anos, sofreu dois reveses. Fernando Henrique Cardoso viu o Legislativo retomar projetos vetados por ele em três ocasiões. Os dados estão disponíveis no sistema eletrônico do Congresso.Para Antônio Augusto de Queiroz, analista do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o resultado está relacionado ao conflito entre a agenda defendida por Bolsonaro e as demandas dos parlamentares. "O presidente não se empenha para aprovar, e, se modificarem lá, ele veta", disse ele. "Mas também não se empenha para manter o veto. É uma atitude profundamente temerária."O recorde de vetos foi comemorado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na última sessão do Congresso, há dez dias. "Nunca o Congresso Nacional rejeitou tantos vetos em um ano como nesta legislatura", discursou o senador. "Nunca o Congresso deliberou sobre tantos temas difíceis simultaneamente, mas também nunca se produziu tanto."Os congressistas preparam novas derrotas para Bolsonaro, prometendo derrubar veto recente ao projeto que aumenta o pagamento obrigatório de emendas parlamentares para os redutos eleitorais de deputados e senadores."O projeto é que torna o orçamento verdadeiramente impositivo", afirmou o relator do Orçamento de 2020 no Congresso, deputado Domingos Neto (PSD-CE). "A mesma maioria que aprovou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do orçamento impositivo deve derrubar esse veto para efetivar o que foi incluído na Constituição." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.-Imagem (1.897919)