O aumento da participação de militares nos altos cargos do governo federal indica mais uma fraqueza política do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) do que uma tentativa de articular um golpe no País, avaliou o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso (PSDB) durante live organizada pela Abitrigo nesta quinta-feira, 23.

FHC comparou a situação de Bolsonaro com a do ex-presidente chileno Salvador Allende. "Quando ele chamou os militares para o governo, não foi para dar um golpe. Foi porque era o que restava", disse.

Para Fernando Henrique, a condução que Bolsonaro faz da crise preocupa, já que, na avaliação do tucano, o presidente não consegue mostrar tranquilidade e sinalizar um rumo para sair da crise.

"O presidente fala mais do que pensa, sempre. E eu não aprecio algo que está acontecendo no Brasil, rixas crescentes entre as instituições, a disputa entre o presidente da Câmara e o presidente da República", afirmou FHC.

O ex-presidente também criticou o posicionamento de forças políticas que pedem o impeachment de Bolsonaro. Fernando Henrique afirmou que não está claro que o presidente tenha infringido a Constituição Federal.

"Disseram que eu estava conspirando com o Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados), mas eu não vejo o Maia há anos. Não está claro que tenha havido infringência constitucional. Eu não votei no Bolsonaro, mas a população votou no Bolsonaro, ele está aí", disse FHC.

O tucano disse, ainda, que será necessária coesão entre as lideranças políticas do País para enfrentar a crise do coronavírus e para transformar as instituições. "Precisaremos de estadistas, de coesão, não de disruptura. Nós precisamos ter paciência histórica, entender que as coisas levam tempo", declarou.

Bolsonaro candidato
Para FHC,  não se deve menosprezar o potencial de uma candidatura à reeleição de Bolsonaro em 2022. "Ele tem forças, tem apoio, não dá para menosprezar. E ele vai ser candidato", disse. O ex-presidente avalia, no entanto, que a crise pode ajudar a colocar um fim no que classificou como "polarização entre Bolsonaro e o PT".

FHC disse que o PT deve ter dificuldade em apresentar um candidato competitivo, em especial porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teria mais condições de disputar. "Até por uma questão geracional, de abrir espaço para quem é mais novo. Mas o PT vai ter candidato, ele tem governadores no Nordeste e alguns deles não são mau", disse. No que classificou como "centro", FHC elogiou a atuação dos governadores tucanos de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que, de acordo com ele, estão se movendo e mostram que sabem usar a comunicação.

Fora do espectro do PSDB, ele disse que Luciano Huck é prejudicado pela crise do coronavírus, porque fica sem alavanca de poder. O tucano mencionou também o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung (MDB), que apoia o apresentador. Para FHC, qualquer um desses nomes conseguiria, possivelmente, implementar uma agenda que situe o centro político. "O centro tem que ter lado, a favor do crescimento, emprego e igualdade. É preciso ter um centro com compromisso de reduzir a desigualdade e fazer crescer a economia."

Roberto Jefferson
Fernando Henrique Cardoso reagiu na terça-feira, 21, às críticas feitas pelo ex-deputado federal Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB, em entrevista publicada pelo Estado. Jefferson afirmou que o ex-presidente é o “maestro” de uma suposta trama do Legislativo para derrubar o presidente da República, Jair Bolsonaro, que teria a participação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

O ex-presidente respondeu em uma postagem no Twitter. “Um ex-deputado fala em complô meu com Maia e (o governador de São Paulo, João) Doria para derrubar Bolsonaro. Nada mais errado: não quero tal. Melhor ter paciência histórica. Respeito o voto popular. Discordar é normal, sem derrubadas. Coesão contra o vírus, é preciso. Não intrigas”, escreveu FHC, sem citar nominalmente Roberto Jefferson.