O juiz da 3ª Vara Criminal de Palmas, Rafael Gonçalves de Paula, encaminhou para a 4ª Vara Criminal de Palmas a denúncia do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público do Tocantins contra o ex-governador Mauro Carlesse (Agir), o delegado Enio Wálcacer Oliveira Filho, 42 anos, e os policiais civis Antônio Martins Pereira Júnior, o “A. Júnior” (38), Carlos Augusto Pereira Alves, o “Bolinha” (38), Santhiago Araújo Queiroz de Oliveira (40), o escrivão da Polícia Civil Victor Vandré Sabará Ramos (39) e os agentes José Mendes da Silva Junior (38), Marcos Augusto Velasco Nascimento Albernaz (44), e Ricardo José de Sá Nogueira, o “Pernambuco” (49) por , vários deles, inicialmente lotados na Delegacia de Narcóticos (Denarc ) de Palmas, que tinha como delegado titular Enio Wálcacer.Eles são acusados de formar uma organização criminosa entre abril e junho de 2020, para conduzir uma investigação policial clandestina sobre um suposto caso extraconjugal da então ex-primeira-dama do Estado e de traficar cocaína de Palmas a Gurupi, para forjar um flagrante, por tráfico de drogas, contra um DJ apontado como responsável pela divulgação do vídeo com cenas da suposta traição.A denúncia e o pedido de prisão preventiva de todos eles, feitos na quinta-feira, 1º de dezembro, estava endereçada pelo Gaeco à 1ª Vara Criminal, mas "ao ser autuada no e-Proc/TJTO [o sistema processual eletrônico], acabou vinculada ao inquérito policial da Operação Caninana, que investiga um grupo de extermínio formado por policiais civis, que tramitam na 3ª Vara Criminal, do juiz Rafael de Paula.Com base no endereçamento da denúncia, o juiz havia redistribuído o processo para a 1ª Vara Criminal de Palmas, mas no dia 5 de dezembro, o juiz Cledson Jose Dias Nunes, se declarou incompetente para o caso. O magistrado apontou as conexões com o inquérito da Operação Éris e lembrou que as instâncias superiores reconheceram a prevenção da 3ª Vara Criminal para os processos com conexão com os fatos apurados na Operação Éris, da Polícia Federal. A denúncia sobre o falso flagrante forjado na operação clandestina voltou para a 3ª Vara Criminal, mas, na sexta-feira, 16, o juiz Rafael Gonçalves de Paula mandou redistribuir a denúncia para a 4ª Vara Criminal, com base na acusação de tráfico de cocaína de Palmas até Gurupi, que recai sobre quatro dos alvos do Ministério Público.Na decisão, o juiz usa como fundamento a Lei Complementar 10, de 1996, a Lei Orgânica do Judiciário do Tocantins. Esta lei, prevê que a 4ª vara criminal de Palmas tem a competência exclusiva para processar e julgar os delitos relativos ao uso e tráfico de drogas. "Embora se tenha imputado a eles e aos outros denunciados o cometimento de outros crimes, há aparente conexão entre os fatos, a exigir, prima facie, que aquele juízo processe e julgue todas essas pessoas", decide o juiz Rafael de Paula.Denúncia imputa aos alvos falso flagrante e tráfico de drogas O caso apareceu durante a Operação Éris, da Polícia Federal, que investigou o aparelhamento da Polícia Civil no governo de Carlesse, em outubro de 2021. Esta é a segunda denúncia criminal decorrente daquela operação. Na primeira, ainda sem decisão de admissão pela Justiça Estadual, Carlesse, ex-secretários e a antiga cúpula da Secretaria da Segurança Pública (SSP) são acusados de obstruir investigação de organização criminosa, falsidade ideológica de documentos públicos e denunciação caluniosa de funcionários públicos.Assinada por cinco promotores, a denúncia afirma que após a divulgação do vídeo da ex-primeira-dama, Carlesse usou o aparelhamento estatal para descobrir os responsáveis pela produção e divulgação do vídeo em redes sociais. Conforme a denúncia, por determinação do ex-governador, policiais militares ligados à Casa Militar, um agente da Polícia Civil lotado na Governadoria e agentes distribuídos pela Secretaria de Administração, Secretaria da Segurança Pública, Núcleo de Inteligência do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) e Delegacia de Narcóticos (Denarc) iniciaram a investigação para descobrir o autor do vídeo, sem nenhum procedimento oficial, ou seja, de forma clandestina.Na deflagração da Operação Éris, policiais federais encontraram celulares do suposto amante e a mulher dele, moradores de Gurupi, ilegalmente apreendidos na operação clandestina, além de relatórios e outros documentos relativos ao caso, em poder de Mauro Carlesse em um cofre dentro do Palácio Araguaia, sede do Executivo. Um dos relatórios, segundo a Polícia Federal, foi criado pelo escrivão Victor Sabará. Um HD também apreendido continha pelo menos 9 arquivos de áudio, de escutas ambientais, com os “interrogatórios” de alvos dos policiais, entre eles a mulher e o marido dela, suspeito de ter tido o caso, o pai dele.Conforme a denúncia, os agentes utilizaram uma caminhonete reservada pela Governadoria para ir a Gurupi diversas vezes para monitorar o DJ, afirmam os promotores. O veículo era abastecido com a senha do policial Bolinha. Em uma dessas viagens, os envolvidos levaram drogas e ocultaram porção de cocaína na carenagem da motocicleta do DJ e porções de cocaína, de maconha e uma balança de precisão, em um vaso de planta no quintal da casa do DJ.Por esta ação, para o Ministério Público Carlesse, Enio Wálcacer, Bolinha e Júnior “associaram-se para o fim de praticar o crime de tráfico de drogas”.De acordo com a denúncia, o agente Antônio Júnior comunicou a Polícia Militar em Gurupi sobre o suposto traficante e o DJ acabou abordado pela Força Tática. No relatório, citado pelos promotores, os militares informaram que o flagrante se baseou em informações da Denarc de Palmas.Ernandes da Silva Araújo Júnior, o DJ Juninho, ficou preso por 13 dias, após o flagrante, concretizado dia 11 de junho de 2020, um mês depois da criação do núcleo de inteligência do Detran.O flagrante também foi investigado pela Polícia Civil em Gurupi. Neste inquérito, além do laudo sobre as substâncias, que concluiu ter pó que não era cocaína, documentos indicando que o muro da casa do DJ havia sido escalado, os vizinhos do DJ afirmaram aos investigadores que conheciam Ernandes há muito tempo e nunca tiveram conhecimento do envolvimento dele com tráfico de drogas.Estes vizinhos fotografaram os veículos usados pelos policiais para monitorar o DJ. Com os dados, policiais descobriram que eram carros a serviço da Denarc e da Governadoria.A Polícia Civil de Gurupi desconfiou de que o flagrante era forjado e questionou a Denarc de Palmas. Segundo os promotores, o delegado-chefe e antigo diretor de Estratégia e Inteligência da SSP, Enio Wálcacer informou que Ernandes Júnior “teria uma possível ligação com o tráfico de cocaína em Gurupi, cujo envolvimento teria sido identificado em levantamentos de campo no interesse da Operação Bobfall”, em andamento na Denarc.A partir deste episódio do falso flagrante, o Ministério Público acusa os nove de se unirem para formar uma “organização criminosa com a finalidade de praticar crimes de abuso de autoridade, tráfico de drogas e denunciação caluniosa”.Após os trabalhos da investigação clandestina, de acordo com a denúncia, José Mendes da Silva Júnior, Carlos Augusto Pereira Alves e Antônio Martins Pereira Júnior, foram prestigiados financeiramente pelo governador com lotações melhores e acesso à gratificações, no Núcleo de Inteligência do Departamento de Trânsito, e na Secretaria da Administração, caso do escrivão Victor Vandré Sabará Ramos, em desvio de função.Pedido de prisão preventiva é apresentado para todos os denunciadosEm uma petição a parte, de 11 páginas, o Gaeco representa pela prisão preventiva dos nove denunciados. Os promotores citam como fundamentos a garantia da ordem pública; a garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal.Segundo os promotores, no caso concreto, há necessidade de decretação da segregação cautelar para garantia da ordem pública.Além da “gravidade dos crimes denunciados”, o grupo de promotores lembra que Carlesse e mesmo os demais policiais respondem a outras ações penais, a exemplo decorrentes das operações Hygea (propina Plansaúde), Éris (aparelhamento da Polícia Civil) e Caninana (Grupo de extermínio).“Suas prisões cautelares se justificam para a garantia de que todas as organizações criminosas integradas por esses agentes sejam desarticuladas”, justificam os promotores, no pedido.O Gaeco também defende que os denunciados “possuem personalidades altamente voltadas para a criminalidade” e as prisões são “absolutamente necessárias para estancar a sangria delitiva por eles promovidas, bem como para trazer tranquilidade social”.“Manter em liberdade agentes com tamanho histórico criminoso, é fator que causa imenso descrédito ao Poder Judiciário. Registre-se, ainda, de maneira clara e evidente, que a liberdade de todos os denunciados colocará em risco extremo e elevado a conveniência da instrução criminal”, concluem.