A força tarefa da Operação Ápia no Ministério Público Federal (MPF) no Tocantins ofereceu nova denúncia criminal nesta quinta-feira, 12, contra os ex-governadores Siqueira Campos (DEM) e Sandoval Cardoso em petição que inclui o filho de Siqueira, o ex-secretário de Relações Institucionais e de Planejamento e Modernização da Gestão Pública Eduardo Siqueira Campos, hoje deputado estadual licenciado. 

Também são denunciados o ex-presidente da Agência de Máquinas e Transportes do Estado do Tocantins (Agetrans) Alvicto Ozores Nogueira, conhecido como Kaká Nogueira, cunhado de Sandoval, e o ex-superintendente de Operação e Conservação de Rodovias da Agetrans, Renan Bezerra de Melo Pereira, filho do ex-procurador-geral de Justiça Clenan Renault de Melo Pereira, que se aposentou ano passado.

A denúncia, assinada pelos procuradores da República Rafael Paula Parreira Costa, Daniel Luz Martins de Carvalho e Jose Ricardo Teixeira Alves imputa aos denunciados, os crimes de peculato, corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro e os acusa de agirem dentro de uma organização criminosa que desviou recursos públicos em proveito próprio e em favor do empresário Wilmar Oliveira de Bastos, dono da empresa EHL – Eletro Hidro Ltda, que firmou os contratos nº 30, 35, 41 e 93, todos de 2014, com a Agetrans, totalizando R$ 35.549.497,00.

No pedido de condenação, o MPF pede o pagamento desse valor de forma solidária, como prejuízo material causado ao Estado mais R$ 10 milhões por dano moral coletivo. Segundo a denúncia, Wilmar e a EHL “estão entre os que mais receberam criminosamente na organização criminosa comandada por Eduardo Siqueira Campos e Sandoval Lobo”. Os procuradores calculam que entre 2013 e 2016, a construtora movimentou em suas contas bancárias, a crédito e débito somados, a quantia de R$ 2.544.304.404,96, apurados a partir da quebra sigilo bancário.

Desse valor, o maior faturamento da existência - R$ 1.308.710.431,15 – segundo a denúncia, ocorreu em 2014, ano de maior atividade da organização criminosa e coincidente com o momento de execução maior dos contratos investigados. O empresário, segundo diálogo incluído na ação, chegou a sugerir um quartel general para o grupo. "Precisamos montar um QG dos cavaleiros da tavola redonda...E montarmos a 'turma' tipo aquela nossa reunião no apto...E de lá os Nortes seram discutidos e implementados".

Propinas

Segundo o MPF para lucrar na organização, o empreiteiro ofereceu e pagou propinas para os mentores do esquema, Sandoval Cardoso, Kaká e Eduardo Siqueira, “agindo em conluio” com Siqueira Campos.

Sobre o ex-governador, afirmam os procuradores que ele teve atuação na busca pelos recursos em “somas estratosféricas” que alimentaram o esquema, além de ter assinado os contratos de financiamentos com o Banco do Brasil, que garantiram recursos de R$ 1,2 bilhão. Também afirmam que ele subscreveu pessoalmente os atos administrativos praticados nas licitações e de execução de contratos fraudados.

Os procuradores lembram ainda da dupla renúncia – dele e de João Oliveira, o vice- para que Sandoval assumisse.  Sandoval, apontado como responsável por contratualizar R$ 260 milhões do Banco do Brasil, indicou o cunhado para comandar a Agetrans e mantinha vinculações com Wilmar, inclusive com determinação direta para a EHL executar obra em um município e tratava o empresário como “sócio”.

Para os procuradores, Eduardo Siqueira é “o grande mentor das fraudes e desvios” e, na condição de ser “praticamente o governador de fato, manteve supremacia” na administração do pai “e buscou a todo custo ‘lucrar’ com máquina do Estado”.

Um dos delatores do esquema, ex-servidor da Agetrans, trazido do Piauí por seu ex-patrão, Kaká Nogueira, contou na delação que havia a cobrança de 10% de propina para Eduardo e os quando os “empreiteiros não entregavam diretamente para ele” quem levava era um homem identificado como Erlon.

Além do recebimento de valores indevidos, o MPF imputa a Eduardo o uso de aeronaves do empresário Wilmar para viagens com a família e de recorrer ao empreiteiro para que quitasse dívidas pessoais do gestor.

Kaká Nogueira é apontado como responsável por nomear os membros das comissões de licitações, ordenar e chancelar as fraudes nas licitações e, como ordenador de despesas, assegurar o pagamento dos aditivos fraudulentos e serviços não prestados. Ele se reunia, antes das licitações, para acertar propinas com os empresários, segundo o MPF.

Renan na condição de superintendente de Operação e Conservação Rodoviária supervisionou as atividades e aprovou a suposta necessidade dos aditivos que, uma vez fraudados, são apontados por delatores como mecanismo de desvio. Também teria atestado relatórios de aprovação e planilhas de medições fraudadas para respaldar pagamento por serviços não executados.

Outro lado

A defesa de Wilmar e EHL afirma que só vai se manifestar após ter acesso integral dos autos e da denúncia.

Sem contato de Renan, acionou uma parente dele, na tentativa de localizá-lo, sem sucesso. A reportagem não conseguiu localizar o ex-governador Sandoval Cardoso nem conseguiu ouvir o ex-governador Siqueira Campos.

O deputado licenciado Eduardo Siqueira disse que depois que os autos retornaram ao 1º grau, sem que a denúncia tenha sido recebida antes de ser remetida para o Tocantins, ele não foi notificado e não teve acesso aos autos e, segundo ele, se não em acesso e não é notificado não pode se manifestar.

Ressaltou que não houve recebimento da denúncia e quando isso ocorrer irá provar sua inocência e reputa. “Lamento profundamente não ter recebido a informação da denúncia de um oficial de justiça, mas da imprensa e espera, no tribunal, responder todas as acusações, que reputo com veemência. “Como sempre, responderei o que tudo o que me for perguntado, atribuído e constante de processo diante do juiz. Repouso na certeza da minha inocência, como em todos os processos dos quais fui inaceitavelmente acusado e, diante das acusações que o jornal diz que são imputadas à minha pessoa, responderei e provarei minha inocência diante do juiz”, afirma.

O esquema contrato por contrato

Contrato nº 030/2014/8 de abril de 2014
- Conservação e manutenção do asfalto entre Formoso do Araguaia/Sandolândia/Araguaçu – 151,82 Km; Divinópolis/Marianópolis/Caseara – 134,06 Km e Lagoa da Confusão/Dueré/Gurupi – 139,36 Km.
- Licitada por R$ 41.332.495,59, mas contratada por R$ 44.828.553,59 (8,46% a mais ou R$ 3.496.058,00) e aditivada em 21,07% após 6 meses.
- Segundo o MPF, Eduardo Siqueira, Sandoval, Kaká e Renan, valendo-se de três servidores, desviaram em proveito de Wilmar R$ 9.446.219,25 equivalentes a 21,07% do contrato, além de R$ 17.000.00 através de superfaturamento por quantidades não executadas.

Contratos nº 035 e Contrato nº 93/2014
- O de nº 35/2014 era i Programa Pró-Município para serviços de conservação e manutenção de asfalto nos 139 municípios Tocantins, com 5 milhões de m2, mas a medição paga alcançou 6.061.455,40 m².
- O edital previa R$ 70.301.146,59, mas o contrato saiu por R$ 78.261.036,17, acréscimo de 11,32% e custo superior de R$ 7.959.889,58.
- O contrato 93/2014 era a 2ª etapa em vários municípios com área total de 4 milhões de m2. Nesse caso, o edital era de R$ 69.856.372,05, mas o contrato saiu por R$ 69.841.719,89.
- Os delatores confirmaram à investigação que houve ajuste prévio e combinação dos vencedores. No final, execução do contrato atestada alcançou 10.072.120,39 m² de lama asfáltica.

Contrato 041/2014
- Destinado à complementação de terraplanagem e asfalto da Rodovia TO-239, entre o entroncamento com a BR-153 e Tupiratins.
- Edital previa R$ 29.908.445,83 e venceu proposta de R$ 33.957.742,85 - 13,53% mais caro, equivalente a R$ 4.049.297,02 -, além de aditivo de 23,81%, ou R$ 8.086.277,77, que seria o valor desviado, além de R$ 27.000,00 de serviços não executados.