Conexões entre História e Literatura são complexas. De um lado, as crises paradigmáticas de Interpretações das realidades e, de outro, o ressurgimento das Narrativas forçam Historiadores e Literatos a se embrenharem num labirinto dialético à procura dos gestos semânticos profundos dos acontecimentos.

Essa perplexidade própria das ciências humanas, visto inexistir uma espécie de teoria geral de Interpretação, requer novos olhares, novos instrumentos, centrados num ecletismo teórico. Destarte, História e Literatura acabam ocupando um lugar deveras fundamental.

Compreender Literatura para além da ideia ingênua de mera manifestação estética, se estribando numa consciência de que se trata de algo através do qual registramos nossos movimentos, no que isto possui de Historicidade, mais ainda, nossos anseios, nossas visões do mundo, é espaço fértil para o Historiador pesquisar.

Estudos abordando tal questão são densos e abundantes. Talvez o primeiro grande sistematizador tenha sido Aristóteles. Para ele, há antítese clara e definida entre História e Poesia. Aquela, trata de verdades particulares, acontecidas, não universais. Esta, se voltaria mais para Filosofia, elevação e universalidade, pois seu objetivo é falar de verdades possíveis ou desejáveis.

Por esse viés, História, Literatura e Verdade são produções da inteligência humana marcadas por dimensões bem particulares. Tal é a influência aristotélica que, ainda hoje, mormente pela força do racionalismo, encontramos apologistas dessa perspectiva. De modo que a Arte, em particular a Literatura, nada mais são do que mundos estranhos habitados por fantasia e metafísica. O resultado, não poderia ser outro, é que surgiu novo enfoque no qual se firmavam postulados como Objetividade e Racionalidade. Portanto, Arte e Ciência são como água e óleo, não se misturam. Conforme Luiz Costa Lima: “um verdadeiro veto ao ficcional, um controle do imaginário, decorrente do racionalismo, pôde ser assistido desde meados do século XVIII, atravessando os mais variados discursos, até mesmo os artísticos”.

Interessante é que essa separação acabou por gerar, a partir do Romantismo, verdadeiros contra-ataques numa tentativa de se impor a Paixão como parâmetro. Reafirmava-se a superioridade da Literatura e veemente repulsa à Ciência.

Com o surgimento da Teoria Literária, em termos institucionais, de certa maneira, se retoma à leitura aristotélica. Nesta ótica, consoante Mendonça: “A literatura exprimiria o verossímil (a impressão de verdade, não necessariamente falsa, que se inclui no espaço ficcional), enquanto a história pretenderia o verdadeiro (no sentido da representação do acontecimento particular)”. Outra vez, invoca-se Aristóteles a fim de demarcação de limites. Somente, pois, a História portaria os registros da realidade e, à Literatura, é negada essa faculdade. Esta ficcionaliza o real, aquela é que realmente estabelece.

Os questionamentos sobre o próprio estatuto da História e a produção de texto literário à luz da experiência literária foram duas grandes consequências como reação crítica aos postulados anteriores. Assim, de um lado, temos a cientificidade da narrativa histórica e, de outro, a relatividade dos conhecimentos nela contidos.

Nota: Posteriormente, publicaremos a segunda parte desta reflexão.