Divirjo da ordem que impõe ser a consequência, certo modo, um predicado do acidente. Ou seja, a formação de um subsequente axioma de que o consequente decorresse, também, de uma questão acidental.

Pode-se extrair por aqui, com efeito, lição da espetaculosamente criminosa (do ponto de vista econômico) ação da Polícia Federal na antecipação de crimes e culpas, objetivada na forma como tratou questão tão expressiva (os problemas da carne em 21 frigoríficos de um total de mais de 600 no país) trocando a parte pelo todo, seguindo o próprio método dos delegados e promotores da Operação Lava Jato que primeiro atiram para depois ver o que atingiram.

A desastrada operação atinge diretamente o Tocantins que exportou em 2016 o equivalente a US$ 160 milhões de carne bovina/aves/miúdos. Como é carne industrializada, há o valor agregado dos empregos e impostos. A exportação de carne só perde para a soja que não tem valor agregado e nem imposto. Isto tudo ameaçado com barreiras sanitárias e preço despencando no mercado.

Mas não é o ponto. A maioria da carne consumida no Estado não tem fiscalização alguma. Isto porque 80% dos municípios do Estado não tem matadouros/frigoríficos. Se fossem seguir a legislação, teriam que mandar o gado de corte para os nove frigoríficos existentes (já houve quinze). E aí a carne retornaria à cidade com preço mais elevado.

A lei obriga os produtores de carne a abaterem seu gado nos frigoríficos e matadouros com pelo menos Serviço de Inspeção Estadual. Mas não lhes dá condições para isso. Imagina o produtor que tenha um gado em Dianópolis ter que mandar sua carga para ser abatida em Gurupi. Ou de Esperantina para Araguaína. A população morreria de fome se dependesse da proteína. Afinal, ninguém está jogando pedra na lua ou disposto a botar dinheiro fora na nobre causa de levar carne à mesa. Há dois anos o governo assinou um convênio com o BID (dentro do PDRIS) que destinava R$ 5,6 milhões para a construção de matadouros em 13 municípios. Com 20% de contrapartida do governo. Ainda assim, 98 municípios (70%) continuariam sem matadouros. Não se tem notícia do que a burocracia fez com tais recursos. Alguns municípios discutem a compra de caminhões frigoríficos. Simples, mas ainda não viabilizada. Sem o apoio do governo.

A Adapec diz que não há problemas, que a fiscalização é feita. Ora, no Paraná e em Goiás também o era. Corrupção não aceita papel. A razão sugere que num Estado onde quase cem cidades não tem abatedouro/frigorífico três assertivas: ou estão comendo carne sem fiscalização, abatidas no meio do mato ou não estão comendo carne.

Ou ainda uma terceira, implausível: os cidadãos (ou comerciantes) estariam pagando um preço maior pelo transporte do produto até o frigorífico e de volta ao comércio. Produto que já tem uma das maiores pautas de ICMS do país: R$ 1.100,00, quando no mercado um bezerro não custaria mais que R$ 900,00.

Como se nota, não pode ser um acidente, a consequência dessa relação: exigência legal de abater-se o animal num frigorífico/não disponibilização de frigorífico/necessidade da população consumir a proteína animal. Num Estado onde perto de 600 mil pessoas dependem do bolsa família e mais de 10% vivem na condição de extrema pobreza, conforme o IBGE. Uma impossibilidade até lógica bancar o frete da carne até o frigorífico e de lá até cada moradia. E aí nem carne fraca teriam.