Luiz Armando Costa
 
As cidades, o Estado e o país experimentam em dias sombrios de pandemia o estrilar de forças antagônicas. Desfilam argumentos e retóricas políticas que, sem refutar a verdade científica colocada, combinam insensatez e arbítrio. Explosivo.
 
Não há como não enxergar no jovem Werther (de Goethe) – no Século 18 – expressão antecipada dos tempos atuais. ”A natureza não encontra nenhuma saída desse labirinto de forças intrincadas e antagônicas, e o homem tem de morrer”, desabafava o jovem em seu sofrimento interior que transformou-se num clássico universal, ultrapassando os limites da Alemanha oitocentista.
 
A pergunta é: porque o homem teria que morrer se poderia prolongar sua vida? Werther (o personagem e o autor) foram acusados pela igreja de levarem muitos jovens ao suicídio por emoções mais do coração que de outros males. Numa época em que a igreja era o próprio Estado. 
 
Hoje observamos o contrário: outros males negligenciados por vontades do coração implicariam na mesma chegada. Não há correspondência entre não guardar o distanciamento social por um vírus que não tem vacina e crenças ideológicas.
 
Digo crenças por que passageiras na medida em que o homem retroage ou avança, dependendo do ponto de partida. Ora se acredita num projeto, noutras, em filosofia diversa. 
 
A morte, entretanto, é inexorável. Vai acontecer, só não sabemos o dia. Ainda que pudéssemos abreviar a vida à nossa vontade (e antecipar a morte), não teríamos poder sobre elas, morte e vida, e delas dispormos à nossa conveniência. São pontos de partida e de chegada.
 
Como Werther, convivo com o sentimento voluntário (e involuntário) de há mais de 30 dias não poder abraçar meus pais: um de 88 anos e o outra de 82 anos. Não o faço não por sofrimento, mas por prazer na vida e nos amores que ela me concede. 
 
Quando escrevo este artigo, a Capital já tem 25 casos de Covid-19 confirmados. Quando você o ler, já terá sido mais. Há mais que indícios, evidências, de que já estivesse sendo registrada uma contaminação comunitária na cidade quando o poder público afrouxa as regras do distanciamento social em função da economia. 
 
Como no Hospital Geral de Palmas só existiriam 16 UTIs preparadas para o Covid-19, já haveria um déficit, tomando-se os 25 casos confirmados. Mesmo assim se assiste desde segunda-feira um embate político entre a prefeitura da cidade e o governo que quer instalar um hospital de campanha num espaço municipal.
 
Onde Werther de Goethe não viu saídas, Spinoza decifrou: a falsidade consiste na privação do conhecimento que as idéias inadequadas, ou seja, mutiladas e confusas, envolvem. Mais: as idéias inadequadas e confusas seguem-se umas das outras com a mesma necessidade que as idéias adequadas, ou seja, claras e distintas.
 
Estamos, com o impulso do poder público e forças políticas, diante de idéias inadequadas e confusas que se seguem diariamente conduzindo as pessoas à morte. E que se seguem como se fossem idéias adequadas e claras e que levassem-nas à vida.