Tatiana Costa Martins 
Orientadora educacional no município de Palmas, pós-graduada em Psicopedagogia, Gestão Escolar e Formação de Lideranças, mestranda em Ensino em Ciências e Saúde pela UFT. 
 
Alongam-se os dias da necessidade do distanciamento social e consequentemente a retomada do convívio nas escolas dos diferentes grupos etários se apresenta como um horizonte que se distancia mais do que esperavam os otimistas. Muitas dúvidas sobre o que faremos em uma sociedade sem escolas, situação que, embora temporária, causa espanto e temor coletivos.
 
A “sociedade sem escolas” insuflada pelo filósofo austríaco Ivan Illich, ainda na década de 70, que ao propor a desinstalação das escolas propôs de fato a quebra de ambientes burocratizantes e reprodutores, escancara até hoje (quem diria... tempos de pandemia) a necessidade da transformação. Há quem diga que a mudança depende das políticas públicas, há quem diga que da disposição dos gestores governamentais, há quem diga que das estruturas e organizações, e os mais neoliberais, que depende somente do indivíduo. Em todas as conjecturas anteriores, o distanciamento da teia complexa que é a Educação, que não suporta que se exalte ou ataque uma dimensão isolada das muitas faces do fenômeno.
 
A pergunta que não pode calar, e que deveria ecoar na sociedade: a escola conseguirá se transformar? Uma boa pista reflexiva seria começar pelo entendimento de que, por escola, entende-se o todo e as partes, entende-se a parceria e o convívio, entende-se a estrutura de assistência e ensino. A escola é também um local de assistência, extremamente necessário e que dá visibilidade a aspectos obscuros do dia a dia social, pois na escola vem à tona a fome, a violência, a alienação parental, o não acesso à cultura da paz em comunidade, e tantas outras questões que negam o direito às infâncias (plural) dignas e saudáveis.
 
A escola, pensada no todo e nas partes, não deixa ninguém de fora frente à responsabilidade da mudança, sendo fundamental o pensamento social sobre a importância deste espaço complexo que não erradica as muitas mazelas, mas que acolhe, reconhece e intervém coletivamente. Nesta perspectiva acontecem dois movimentos importantes: primeiro, a escola vista como essencial; segundo, a escola vista não mais como único espaço de ensino. Quantas lições podem ser pensadas a partir da falta do ambiente formal de educação.
 
E em tantas opções socioculturais de se repensar e refazer a perspectiva da escola, alguns perguntam: O que nossos bebês, crianças bem pequenas e crianças pequenas aprenderão neste fatídico 2020? Uma pergunta extremamente importante a todos os educadores, e que pode gerar a necessária reflexão sobre o que se entende por ritmos das infâncias e o erro de predeterminar as crianças. Será a escola capaz de voltar-se à singularidade das crianças durante e após a pandemia? Será cada professor capaz de inquietar-se com a necessária mudança da escola? A qual, sem dúvida, não o tem como único agente de transformação, e sim como a voz que chama ao debate.
 
Dois exemplos para suscitar a reflexão sobre o reconhecimento e o respeito aos diferentes ritmos na infância (tempo/espaço) das muitas infâncias (sujeitos), momento tão fascinante por se abrir sem reservas ao desconhecido e à incerteza (sentimentos causados pela pandemia aos adultos).  
 
O primeiro exemplo se volta a refletir sobre o debate da alfabetização precoce das crianças, que não é um problema para o adulto (sendo até uma expectativa), mas que pode ser um sentimento de incapacidade desnecessário. A perspectiva de que cada criança possui seu ritmo de desenvolvimento não lhe tira o direito de ter acesso a um ambiente rico e diverso de letramento, mas lhe assegura ser respeitada em seus tempos. Então pensar em um prejuízo quanto à leitura e escrita pela ausência da escola é um equívoco, pois o tempo das infâncias está para muito além da instrução. A alternativa é pensar, dada a ausência da escola, tão essencial nesta construção, em formas de promover um ambiente o mais rico possível e que estimule o desenvolvimento natural da criança.
 
Um segundo exemplo, ligado ao primeiro, é o relato de uma criança de cinco anos, e isso já faz um tempo, que em um momento de brincadeira com quebra-cabeça demonstrou tamanha insegurança frente à possibilidade de errar e preferia nem brincar. O que isso significa? Muitas coisas, principalmente que a vida adulta deve voltar-se atentamente aos sentimentos e emoções das crianças, observando e escutando o que sentem, sem incorrer na situação vazia de lhe dizer como deveria ser, ou o que deveria sentir... afinal, quem sente pelo outro? O sentir faz parte de toda e qualquer aprendizagem.
 
Desta forma, voltar-se para o reconhecimento de que existem aprendizagens o tempo todo não nega o papel fundamental da escola, mas evidencia o papel essencial da cultura e da interação, sendo impossível subestimar os ritmos das Infâncias.