Foram-se os anos em que dizia-se do deputado ou senador explicitar a cara do eleitor. A aprovação na Câmara dos Deputado, em votação unânime ontem, do projeto do Palácio do Planalto (modificado no Senado) reduzindo alíquota de ICMS dos combustíveis nos Estados, inverte o princípio: o parlamentar encarnaria as vontades dos governos e não dos governados, e que são, agora, literalmente conduzidos, não ao seu objeto, mas daqueles a quem delegam procurações.
 
Se na defesa de seus projetos, com efeito, os parlamentares já sofismavam elaborações, desta feita aprimoraram:  acreditam terem êxito no “falaciar” de números, uma impossibilidade lógica e insofismável a pouco mais de três meses das eleições. E isto ganha ares de certeza numérica e infalibilidade argumentativa. Voto na veia.
 
Ora, se com o valor da base de cálculo do imposto congelado há seis meses (de novembro/21 a maio/22)  o preço da gasolina foi reajustado em 21%, a inflação no período elevou-se a 6,51% e a arrecadação do ICMS do produto caiu 1,5% (como no caso do Tocantins), claro está que não é o imposto o vilão das bombas.
 
Isto por que sabia-se, até então, que, em valores nominais, o imposto, como toda taxação, incidiria sobre o valor do produto. Preço menor, menos desembolsos. Deputados e senadores decidiram mexer no imposto e não no valor do produto.
 
Uma decisão político-econômica formando base de sustentação constitucional para driblar a competência legislativa dos Estados no ICMS, na natureza de uma suposta essencialidade do produto (combustível).
 
Ignorando os sem-carro e agora os sem-educação e os sem-serviço público de saúde com o corte de R$ 100 bilhões anuais e que no Estado do Tocantins significará perdas de R$ 726 milhões anuais se adicionarmos aos combustíveis o alcance da lei na energia elétrica, comunicação e transportes.
 
De outro modo: o preço vai continuar subindo e, tudo indica, a oscilação internacional do barril de petróleo suplantará os projetados R$ 2,00 de ganho da Lei Complementar 18 aprovada na noite de ontem com uma compensação aos Estados válida apenas até depois da eleição. Isto se o Estado tiver dívida com a União.
 
Por outro lado, deputados federais e senadores mantiveram os dividendos financeiros bilionários do governo com a alta de preços dos combustíveis praticada pela Petrobras que bem poderiam ser utilizados para subsidiar a gasolina, mantendo temporariamente sem reajustes na crise os valores nos postos.
 
Pelos elementos dados nesta equação desavergonhada, é possível concluir (e não mais  supor) que tivessem outro destino para os R$ 37 bilhões entregues pela Petrobras a Jair Bolsonaro este ano de dividendos dos lucros da empresa em 2021 (foram R$ 106 bilhões de lucros) e R$ 447 bilhões nos últimos três anos.
 
Um país com a 12ª maior reserva mundial de petróleo (mais que os EUA), o 9º  maior produtor de combustíveis e o 7º maior consumidor. Maiores reservas e consumidores que não encontrariam empresários de refinarias para um manjá desses: matéria prima e consumo na mesma rua.
 Mas deputados e senadores preferem cortar no bolo que é devolvido à população.