Carlos Alberto Di Franco
Jornalista. E-mail: difranco@ise.org.br
 
O presidente Jair Bolsonaro e os jornalistas vivem em clima de guerra. Os embates, tóxicos e intransigentes, não têm a cara do Brasil. A perspectiva de quase dois anos de governo permite ensaiar um balanço das perdas e ganhos de um conflito desagradável e nada produtivo.
 
As últimas pesquisas mostram que o presidente da República, armado de seu estilo agressivo e tom de conversa mesa de bar, está levando vantagem nas bolas divididas e fazendo mais gols.  Bolsonaro ataca muito. Mas também apanha para valer. A percepção da sociedade refletida nas pesquisas é a de que Jair Bolsonaro, mesmo com o desgaste da “rachadinha”, está mais para vítima do que para vilão.
 
O grande equívoco da imprensa é deixar de lado a informação e assumir certa postura de militância. Os eventuais desvios do governo não se combatem com o enviesamento das coberturas, mas com a força objetiva dos fatos e de uma apuração bem conduzida. 
 
Vamos a alguns exemplos. Eles ajudam a iluminar a argumentação deste artigo. 
 
Não faz muito tempo, uma apresentadora de televisão afirmou, no ar, ao noticiar um evento do governo chamado “Vencendo a covid-19”, que “nem Bolsonaro nem as autoridades presentes prestaram solidariedade às vítimas”. Mas o distinto público pôde ver e ouvir que a médica Raissa Oliveira Azevedo de Melo Soares, uma das participantes da cerimônia, pediu um minuto de silêncio em homenagem aos 115 mil mortos na epidemia – e que todos os presentes atenderam ao seu apelo. Negar um fato comprovado com o som e a imagem é um tiro no pé, um absurdo.
 
Reproduzo recente manchete de jornal: “Bolsonaro monta roteiro para entregar obras de Lula e Dilma”. Pois bem, amigo leitor, a descontinuidade das obras de infraestrutura dos antecessores, com imensas consequências econômicas e perda de eficiência, tem sido objeto de recorrente crítica da imprensa e da sociedade. As inaugurações de Bolsonaro, independentemente do eventual ganho eleitoral, deveriam ser evitadas? É óbvio que não. Na verdade, o presidente está fazendo o que nós sempre cobramos: dar continuidade às obras de administrações anteriores.
 
O erro da imprensa, que a afasta das suas audiências, está em atribuir ao presidente coisas que ele não fez. É óbvio que nós, jornalistas, temos o dever ético de iluminar o lado escuro do governo.  Mas denúncias, necessárias e pertinentes, precisam estar apoiadas na objetividade dos fatos e no verdadeiro interesse público. 
 
Governo e imprensa não podem ter uma relação promíscua. É salutar certa tensão entre as instituições. Mas precisam conversar. São peças essenciais da estrutura democrática. Aguardo –já o disse outras vezes-  que Bolsonaro desça do palanque e assuma o papel de presidente de todos os brasileiros. Espero também que nós, jornalistas, deponhamos as armas do engajamento e façamos jornalismo. 
 
É necessário reconhecer, para o bem e para o mal, que perdemos a hegemonia da informação. Impõe-se, por óbvio, um jornalismo menos anti e mais propositivo. O que não significa, nem de longe, perder a necessária independência e senso crítico. A fiscalização dos governos e das instituições é parte essencial da atividade jornalística. A democracia se fortalece com uma imprensa crítica, mas isenta.
 
Chegou a hora do jornalismo propositivo.