Luiz Armando Costa
 
O país já conta mais de 12 mil mortos na pandemia do Covid-19. Neste 13 de maio acostumávamo-nos desde as séries iniciais a celebrar o fim da escravidão no Brasíl. Hoje deve ser encoberto pelas notícias de mais mortes e casos do corona vírus e de mais declarações estapafúrdias da maior liderança formal do Brasil.
 
Nas escolas chegava-se a rememorar a figura dos escravos, as crianças tinham o rosto pintado com carvão, como faziam-me, de forma recorrente, as professoras no primário do Dom Domingos Carrerot. No desfile de 7 de Setembro, a situação se repetia. Agora com imitações de correntes amarradas aos pulsos.
 
É provável que nesta quarta-feira pouco se dará à libertação dos escravos, muitos anos procrastinada pela elite (grandes fazendeiros de engenhos e comerciantes) do país que fazia dos negros mercadoria e mão de obra gratuita em favor de seus lucros. Libertar os escravos mataria o comércio e a economia por consequência. 
 
Fui ensinado a enxergar nos bandeirantes heróis pelo sertão do Brasil. Na Capital de Goiás, o Anhanguera (Diabo Velho) dá nome à mais extensa avenida da cidade e a uma histórica praça, num lugar que já foi o centro econômico nervoso de Goiânia e por onde tudo passava. 
 
Em Porto Nacional desde o nascimento até mudar-me para Goiânia, cresci na rua Bartolomeu Bueno da Silva, o nome de batismo do bandeirante. Ainda vou ali todos os finais de semana. Aquele que os livros mostravam-nos como sagaz ao enganar os índios, ameaçando tocar fogo no rio Vermelho.
 
Tudo pelo bem do país, quando lutavam para angariar posses, apropriando-se de riquezas dos indígenas e sertanejos. O Anhanguera estava, portanto, em todo Goiás e se alastrava por São Paulo.
 
Livros adiante, vim a entender que o Anhanguera era, na verdade, um saqueador como todos os bandeirantes que entraram pelo sertão brasileiro em busca de ouro e de mais escravos. Agora indígenas.
 
Prendemo-nos, nos dias atuais, numa alienação mais vulgar. A narrativa dos comerciantes contra a libertação dos escravos e dos livros para enaltecer os bandeirantes caiu por terra. Derrubaram-na o progresso do conhecimento técnico e empírico que suplantou as estórias plantadas com a finalidade de agregar o pensamento a uma narrativa ideada com propósitos pensados.
Como hoje contrapõem distanciamento social com o lucro dos empresários.
 
Contra todo esse avanço civilizatório e científico, reportamo-nos, hoje, na crise do corona vírus, a pensamentos de que quanto mais pessoas se desloquem nas ruas, menor possibilidade e probabilidade de uma contaminação virótica. E o professam com a autoridade de um Anhanguera.
 
São os novos escravos de uma pseudo-ideologia sem fundamentos filosóficos ou científicos. Um retrocesso à barbárieal. Conceito defenestrado pela história. De outro modo, pior que a escravidão do corpo é, seguramente, a prisão do pensamento e da alma.