Salatiel Soares Correia

Três bruxas, entre trovões e relâmpagos, esperam os generais Banquo e Macbeth, oriundos da campanha vitoriosa na qual derrotaram as forças aliadas da Noruega e da Irlanda, lideradas pelo rebelde Macdonwald. Macbeth, parente próximo do rei, é louvado por sua bravura e habilidade nos campos de batalha.

As bruxas profetizaram um futuro promissor para o general Macbeth. A primeira prevê esse herói com o título de Barão de Glamis; a segunda afirma que o general Macbeth será o Barão de Cawdor. A terceira bruxa explicita que Macbeth será o Rei da Escócia.

Ao revelar suas profecias, as bruxas desapareceram. Desapareceram por um par de horas, até chegar o mensageiro do rei com o título previsto pela segunda bruxa: a de que sua majestade havia concedido ao general Macbeth o título de Barão de Cawdor.

Cumprida a segunda profecia, ainda faltava a previsão de ele se tornar Rei da Escócia. A partir daí uma ambição descontrolada passou a atormentar o espírito do general, que, para se tornar Rei da Escócia, tramou o assassinato do antigo rei.

Rei morto, rei posto. Macbeth, novo Rei da Escócia, viu seu trono ser ameaçado pela sede de vingança dos inúmeros inimigos que ele cultivara. Nesse contexto, o fantasma do general Banquo (que ele mandara assassinar) é uma fonte constante de perturbações. O Barão de Macduff (que teve as filhas e a esposa assassinadas a mando de Macbeth) é outro inimigo que não descansará enquanto não se vingar da chacina de sua família. Para isso, teria de matar o rei.

Atormentado pela possibilidade de ser assassinato, Macbeth recorreu mais uma vez à magia de previsão das bruxas; e estas, por sua vez, fizeram uma última profecia: de que ele não será assassinado por qualquer homem que tenha nascido de uma mulher.

Ao ouvir essa profecia, o rei se sentiu seguro contra a ação de seus inimigos. Afinal, todo homem vem do ventre de uma mulher. Ledo engano. O inimigo visceral do Rei da Escócia, o Barão Macduff, fora retirado do útero materno antes do tempo, pois ela já estava morta. Por essa razão, Macduff veio ao mundo não do ventre de uma mulher, mas sim de um cadáver. Moral da história: as bruxas enganaram Macbeth, que foi morto por Macduff. A vingança, enfim, estava concretizada.

A história é longa. Paro por aqui, pois já temos os elementos suficientes para responder por que o mais universal escritor do mundo inventou o humano. Quem se dispuser a ler as extensas peças do maior dramaturgo das letras universais verá que elas dissecam os labirintos da alma humana. Em o Mercador de Veneza, o gênio inglês explora a avareza; em Romeu e Julieta, expõe a tragédia de um amor entre dois jovens pertencentes a duas famílias que se odiavam; em Hamlet, o filho e sua obsessão de vingar a morte do pai; e, em Macbeth, revela a falta de limites da ambição humana.  

Recorrer ao talento único de William Shakespeare foi o caminho que trilharam os maiores escritores do mundo na busca incessante de mergulhar nas profundezas da alma humana. Do americano William Faulkner ao colombiano Gabriel Garcia Márquez. Do brasileiro Machado de Assis ao peruano Mario Vargas Llosa. Do francês Gustave Flaubert ao também francês Marcel Proust. Todos, absolutamente todos, construíram suas obras-primas tendo como referência as peças de William Shakespeare, o inventor do humano.

Salatiel Soares Correia
é engenheiro, bacharel em Administração de Empresas, mestre em Ciências pela Unicamp. É autor do livro Cheiro de Biblioteca.