Ruy Castro

RIO DE JANEIRO - Um amigo me perguntou ao telefone: "E aí, vendendo saúde?". Respondi: "Não. Comprando saúde. Vou mais a farmácias do que a botequins". Ele suspirou, "Eu também", e me contou suas aventuras com o estojo de remédios que, uma vez por semana, os maiores de 200 anos têm de encher –um quadradinho para cada dia e hora, com a maior atenção, para não se tomar o remédio errado. Sei o que é isso. Encher esse estojo é um exercício que também pratico semanalmente.

O segredo é esquecer por algumas horas os nomes dos personagens de Dostoievski, se o estivermos lendo –Raskolnikov, Smerdyakov, Razumikhin, Marmeladov, Svidrigaïlov–, para nos concentrarmos nos nomes dos remédios que temos de organizar. Alguns são fáceis de aprender, como a lamotrigina, a espironolactona, o ácido acetilsalicílico. Mas o que dizer do succinato de metoprolol? E da rosuvastatina cálcica? E da levotiroxina sódica? E do bissulfato de clopidogrel? Meu amigo contou que, precisando de uma caixa de cloridatro de metformina, pediu, por força do hábito, uma de citrato de sildenafila –nome sob o qual se esconde o viagra.

E esse é um dos problemas. Podemos conhecer um remédio pelo nome de guerra –aspirina, synthroid, plavix–, mas, ao pedi-lo, as farmácias nos sugerem o genérico e informam que, por uma dessas coincidências, ele está em oferta naquela semana e que tal levarmos três caixas em vez de uma? Acontece que os genéricos, como o nome indica, são chamados por sua complexa composição química. E, com isso, entra em nossa vida, de repente, o esomeprazol magnésico tri-hidratado.

Um laboratório fabrica certo remédio em pilulinhas brancas e redondas. Em outro, o mesmo remédio vem em pilulonas amarelas e quadradas. E, num terceiro, em forma de ameba e azuis. Se você se distrai ao compor o estojo, candidata-se a uma overdose.

Ler Dostoievski é mais seguro.