Erlan Tavares dos Santos 
Licenciado em Letras (Língua Inglesa) e mestrando em Letras (UFT).
 
Em decorrência das últimas eleições presidenciais, no Brasil, emergiu-se uma nova fé: a bolsocêntrica. Essa fé antibíblica defende “a paz se possível, mas a verdade a qualquer custo”. Os cristãos que a professam cegamente lutam para manter-se inquestionáveis em seu credo ortodoxo, exatamente como fazia a igreja católica durante a inquisição da contrarreforma. Essa nova fé funesta e antibíblica, assim, apoia a tortura, a morte e o silenciamento dos opositores da lei, a exemplo dos fariseus, aqueles que premeditaram a morte de Jesus Cristo.
 
Um novo consenso teológico emergiu entre os cristãos brasileiros, portanto, substituindo, assim, o antigo com mais de 2000 anos de história: Jair Messias Bolsonaro é o senhor dos cristãos, e não mais Jesus Cristo. Logo, parafraseando por conveniência o texto sagrado de forma idólatra, esses pseudocristãos pregam que “feliz é a nação cujo deus é Bolsonaro”.
Utilizando-se da bandeira brasileira, da moral e da defesa da família tradicional como bode expiatório, o cristianismo bolsocêntrico camufla o ódio em nome de Deus. Por meio de um discurso fanático, falseando a fé cristocêntrica através da cega moral cívica, as igrejas cristãs têm sido úteis precisamente por sua qualidade de “embaixadoras” de Deus na terra para propagar o juízo divino do atual senhor redentor dos cristãos brasileiros. Enquanto instituições divinamente autorizadas, essas igrejas defendem as posições políticas funestas do atual governo, demostrando a ausência da misericórdia a que faz menção a própria escrituras sagradas.  De forma farisaica, os cristãos de confissão bolsocêntrica acreditam que a verdade lhe pertence como direito exclusivo, pois julgam-se senhores dela, e como tais não podem ser contestados.  Há, de forma explicitamente clara nesses autoproclamados cristãos patriotas, uma incoerência bíblica, visto que, movidos por um patriotismo cego, demonizam até mesmo seus próprios irmãos na fé que não lhes são coniventes.
 
Há dessa forma, também, nos cristãos brasileiros, uma incoerência democrática. Fica explícito, assim, que esse cristianismo é elitista, autoritário e contraditório à filosofia rabínica pregada por Jesus Cristo. Se vivemos em uma democracia, logo temos o direito de recusar ideias, crenças, ideologias e filosofias as quais julgamos erradas. Mas convenhamos: deve-se fazer tais recusas de forma sempre respeitosa, democrática e ética.
 
Como senhor das igrejas brasileiras, infelizmente, o atual presidente da República Federativa do Brasil tem servido como guia espiritual para os cristãos. Esse cristianismo bolsocêntrico não busca converter os inimigos em cristãos arrependidos. Em sua ótica maquiavélica, é preciso erradicá-los sob o pretexto de purificar a moral brasileira manchada pelo pecado petista. 
 Todavia, enquanto cristãos confessos, precisamos considerar o texto sagrado que diz: “o amor é sofredor, é benigno, ele não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece; não porta com indecência, não busca o seus interesses próprios, não se irrita, não suspeita mal; não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. O próprio cristo disse: “amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem”. Infelizmente, depois das últimas eleições, não são mais os cristãos que são perseguidos, eles tornaram-se perseguidores; eles não são mais os alvos do ódio, são eles próprios que estão exercitando o ódio contra seus inimigos. Não pregam mais a salvação da nação brasileira mediante Cristo, mas através de Bolsonaro. Logo, deve-se aceitar Bolsonaro e não Jesus como messias.
 
É preciso que o que é dito nos púlpitos das igrejas não seja contraditado pelo que é feito fora dela. Se assim ocorre, as pregações sobre amar o próximo, por exemplo, feitas dentro dos templos esvaziam-se, posto que a prática fala mais forte do que o discurso sobre ela. O sermão pregado esvazia-se se a prática cristã desumana e farisaica prova o contrário do que foi verbalizado de forma eloquente.  É inegável que os proclamados cristãos testemunhem mediante sua prática aquilo que leem na bíblia sagrada e pregam nos altares de suas igrejas. Devemos lutar pela verdade, sim, mas não de forma extremamente puritana, pois importa professar a fé genuinamente bíblica e não impô-la sorrateiramente. 
 
Segundo o apóstolo Paulo, doutor da lei mosaica e escritor neotestamentário convertido ao cristianismo, a fé deve ser puramente cristocêntrica: “se alguém ensina outra doutrina e se não conforma com as sã palavras de nosso senhor Jesus Cristo e com sua doutrina que é segundo a piedade, é soberbo e nada sabe, mas delira acerca de questões e contenda de palavras, das quais nascem invejas, porfias, blasfêmias, ruins suspeitas, contendas de homens corruptos de entendimento e privados da verdade, cuidando que a piedade seja causa de ganha.” 
 
Como, então, enquanto confesso seguidor de Cristo, os cristãos apoiam tudo que é antibíblico, anticristão, antidemocrático e desumano? Como conciliar a fala cheia de argumentos bíblicos com a prática totalmente contraditória? Como defender ser um seguidor de Cristo tendo uma posição semelhante aos dos fariseus, seus opositores?     
 
Sentimos a imperiosa necessidade de dizer que Jesus Cristo morreu na cruz até mesmo por aqueles que O odiavam. Ele não pregou extermínio dos seus inimigos, porque mesmo sendo odiado, continuou amando. Em outras palavras, ser cristão não nos dá o direito de demonizar tudo e a todos, isso é puro fanatismo religioso. Além de ser uma postura totalmente antidemocrática, também é antibíblica pois conforme o texto sagrado: “não sejas demasiadamente justo nem demasiadamente sábio; não sejas demasiadamente ímpio nem sejas louco, por que morrerias fora de tempo?” Ou seja, tenhamos mais equilíbrio ao professar nossa fé!
 
Como genuínos cristãos democráticos, devemos considerar a presença do outro, que mesmo opostos a nossa fé é parte integrante da nossa sociedade. Portanto, um cristianismo que apoia tortura, ódio, autoritarismo, rancor e a divisão da própria membresia eclesiástica por causa de uma cega opção partidária, precisa rever sua prática cristã urgentemente. Acreditamos que desta revisão da práxis cristã resultará uma nova maneira de entender e compreender o que é seguir os passos de Jesus.  O verdadeiro cristianismo baseia-se na bíblia como um todo e não em poucos versículos recortados e interpretados cegamente por conveniência, por ávidos patriotas fanáticos.
 
Enquanto cristãos brasileiros de confissão protestante, sentimos medo, pena e preocupação, pois vivemos e convivemos com outros autoproclamados cristãos patriotas, que praticam de forma clara a idolatria cívica, idealizada e defendida por uma figura política totalmente anticristã.  Temos ciência de que ninguém pode proibir uma pessoa de gostar mais de um partido, religião ou mesmo pessoa por inúmeras razões em detrimentos de outras. No entanto, essas opções particulares não podem preterir o direito de escolhas dos outros em prol dessas preferências, pois isso foge dos ensinos bíblicos como o diabo foge da cruz!