José Lauro Martins
Doutor, professor adjunto do Curso de Jornalismo (UFT) do Campus de Palmas
 
As mudanças não são fáceis. Vamos ganhando confiança com aquilo que conhecemos e torna-se difícil abandonar algum conhecido em função de algo novo. Para algumas pessoas as mudanças soam como desnecessária até que os benefícios fiquem muito claros. Em geral, essas pessoas não participam das mudanças, são elas que apresentam os argumentos para dissuadir qualquer processo de transformação. 
 
Temos uma expressão bem brasileira que soa como prudência: ‘Em time que está ganhando não se mexe’. Bem, se na boa fase não criar as condições para continuar o sucesso, quando as coisas virarem, qualquer mudança vai ficar mais complicada. Então é melhor enquanto está “ganhando” fazer os ajustes para continuar ganhando. 
 
Em todas as crises precisamos improvisar e buscar alternativas. Todas as crises provocam situações desconhecidas e nos desafiam a criar. Às vezes não é apenas uma situação difícil que nos leva a criar alternativas culturais ou tecnológicas. 
 
Um exemplo foi a necessidade de resistência dos negros escravizados e a capoeira, que parecia uma dança, era uma forma de preparação para o enfrentamento sem armas. Os escravos americanos cantavam para amenizar a dor do trabalho forçado e deu origem ao Blues e Jazz. 
 
A dificuldade de cuidar de tantos feridos durante a Primeira Guerra Mundial motivou os estudos das infecções e Alexandre Fleming desenvolveu suas pesquisas e em 1928 termina por anunciar o descobrimento da penicilina. 
 
Um jornal de grande circulação publicou sobre a intenção de algumas corporações manter o trabalho remoto e mostrando que os prédios de escritórios da Avenida Faria Lima em São Paulo, numa das regiões mais cara do mundo os escritórios esvaziados nesse tempo de pandemia. 
 
As crises colocam em xeque os saberes e as condições do presente. Desafiam a sociedade criar novas condições para que a vida possa seguir seu curso. Vemos a resistência das corporações em permitir o trabalho remoto de seus colaboradores. Claro que podemos fazer grande parte das atividades profissionais a partir da residência, sem os deslocamentos desnecessários. 
 
Em algumas profissões não há escolha, é o caso dos jornalistas, fundamentais para que a informação circule, e dos professores. Temos uma dificuldade em incorporar na educação qualquer coisa que vá além das tecnologias digitais como ferramenta. 
 
Os professores têm dificuldade em entender que é possível ser educador por meios virtuais e não é por falta de existirem estudos sobre esse tema! A resistência é muito grande tanto nas escolas públicas quanto escolas particulares. Investir em tecnologia para disponibilizar em plataformas virtuais os conteúdos ensinados na sala de aula tradicional é apresentado como risco. 
 
O que fez a pandemia foi abreviar os processos burocráticos e foram obrigados, ainda que sem recursos financeiros ou pessoal capacitados, a encontrar soluções improvisadas. As escolas públicas tiveram que inventar as condições para que pudessem continuar sua função social, ainda que de forma precária.  
 
Governos estaduais e municipais tiveram que inventar soluções, professores que nunca tinham gravado um vídeo, de repente, estão improvisando vídeo ao vivo ou web conferências com uso de simples smartphones. 
Secretaria de educação que não tinha sequer o setor que cuidasse disso, de repente tornou-se obrigada a adotar uma plataforma virtual para que pudesse chegar aos seus alunos. Dessa maneira também escancarou as nossas incompetências para lidar com as tecnologias digitais, a diversidade de pessoas com as quais temos que envolver no processo, e a disparidade econômica e social dos nossos alunos. 
 
Sabemos que nem tudo pode ser ensinado por meio virtual, poucos professores estão preparados para a docência ambiente virtual, da mesma forma que nem todos os estudantes sequer sabem estudar sem a batuta do professor. 
 
Estudar por meio em virtuais não é algo natural, não é porque essas crianças e adolescentes vivem conectados nas redes sociais que eles saibam estudar por meio dessas redes. O contato com os professores em meios virtuais é muito diferente e o auto estudo precisa ser muito mais que realizar tarefas escolares. 
 
Os alunos não foram as crianças ou adolescentes treinados para realizar seus estudos com autonomia e a dependência dos alunos aos professores é uma marca da escola tradicional. São treinados desde o seu primeiro dia de aula a esperar as ordens do professor em sala de aula. Essas crianças e adolescentes não aprenderam a ter iniciativa no processo de aprendizagem, não são educados para terem autonomia no processo educativo. 
 
A construção da Autonomia é um processo um processo de construção cultural e nem as famílias que estão acostumadas com isso. Afinal, é mais fácil ter os alunos em sala de aula fechada, do que ter o trabalho da organização e acompanhamento, ainda que seja um sistema de intranet da escola. 
 
Além de tudo, conteúdos para o ambiente virtual não podem ser improvisados. Não é uma aula de “consumo” imediato, outros profissionais podem ter acesso e não fica bem, nem para os professores nem para as escolas, apresentar conteúdo com qualidade duvidosa. 
 
A gestão da aprendizagem é um desafio não só para os alunos, mas para os docentes e para as famílias, desde a gestão do tempo à produção de metodologias. As famílias estão sendo desafiadas a cumprir o seu papel e não deixar por conta da escola toda a organização do processo de escolarização. 
 
A sala de aula, o território sagrado dos professores, é desconstruído, pois a produção de conteúdo em para uma plataforma virtual deve ser um trabalho multiprofissional. A docência por meio das plataformas virtuais transformou-se num xeque-mate para a educação. Mostra quanto os educadores não estão preparados para lidar com as tecnologias digitais, com as linguagens para atuar nas plataformas virtuais e desconhecem as metodologias para a docência virtual. 
 
A lição que fica é que não precisamos da sala de aula para tudo, como se essa fosse a única maneira de disponibilizar conteúdos para os aprendentes; que é possível trabalhar com qualidade em plataformas virtuais; que todos os envolvidos no processo educativo precisam aprender com as lições da pandemia. Se isso nos ajudar, essa crise nos deu uma oportunidade de aprender que a educação escolar precisa preparar as pessoas para o Século XXI e um deixa legado importante para transformar da Educação.