As fortes imagens da abertura de um grande empreendimento atacadista na Capital ontem correram as redes sociais. Entre o impulso comercial (e propagandista) e as circunstâncias, o apelo a aglomerações numa cidade que viu dobrar em 30 dias (8 de agosto/8 de setembro) o número de mortos da Covid-19 emergiu absolutamente insólito. 
 
Foram 54 óbitos em trinta dias contra 55 vítimas fatais de março a 8 de agosto. Idêntica relação nos contaminados: em 30 dias um avanço de 103%. Saiu de 6.819 (8 de agosto) para 13.843 (até ontem).
 
De outro modo: a situação cresceu. É maior do que era. Da mesma forma que, amanhã, certamente, o número de hoje será menor. Fazermo-nos menores do que nos tornamos não é escolha. Ainda que percebamos a simultaneidade do devir, cuja propriedade é furtar-se do presente. 
 
Uma essência de avançar que, no caso da Covid-19, seria fazer retroceder. E não promover adiante que as aglomerações são instrumento cientificamente comprovado.
 
Pelo menos duas questões: 1) passaria na cabeça dos empresários algo mais que a busca do lucro?; 2) o que motivaria as pessoas a abrir mão de sua insegurança/segurança certificadas pelo avanço das mortes e contaminações da pandemia, a atenderem mais ao apelo comercial do que ao apelo à preservação de sua própria vida?
 
A situação remete à oposição colocada entre a economia e a vida. E, certamente, endossaria avaliações econômicas de que a pandemia, além das mortes, tem proporcionado oportunidade de ganho financeiro em desfavor da saúde da força de trabalho e da massa de consumo que sustentam e aumentam o capital. Não faltará certamente aquele que dirá do empresário pessoa que acredita no empreendedorismo em época de crise.
 
A situação é emblemática porque dá às mortes e aos contaminados importância lateral e acessória (quase marginal) em relação à economia. Por outro lado, em condições normais, a polícia fecharia "o boteco" por descumprir leis municipais. Sem justificativas de que o problema fosse do cliente e consumidor, atraído, como manada, pelo próprio estabelecimento, por sua propaganda de venda. Seria risível imaginar que propagandeasse seu feito e produto para atrair menos e não mais pessoas.
 
Também pelo efeito manada, o impulso do atacadista metropolitano se expande (como atacadista que é) para o Estado que registrou em 30 dias um aumento de casos da ordem de 80% e outros 70% de crescimento dos óbitos. Foram 444 mortes até 8 de agosto (seis meses) e 314 óbitos de 8 de agosto a 8 de setembro. Um mês.
 
Uma situação desnecessária para a economia. Isto porque, de janeiro a junho de 2020 foram emitidas notas fiscais no Estado na ordem de R$ 80 bilhões. Uma média mensal de R$ 13,3 bilhões de movimento da economia formal. Somente o comércio recolheu de janeiro a julho (dados da Secretaria da Fazenda) R$ 473.914.623,00. Um valor 4,60% superior aos R$ 453.071.218,00 de janeiro a julho de 2019. Sem pandemia.
 
A economia precisa de empresários e empreendedores. Estes, pela lógica, necessitam de clientes/consumidores. Não é os atraindo a aglomerações na pandemia que garantirão mercado a seus produtos. Mortos não geram demanda de consumo. A não ser do paletó de madeira e dos sete palmos de terra.