A burocracia tem razões que a própria razão desconhece. A ameaça de que os pacientes de Covid-19 podem, daqui a dois meses, estar sujeitos a ficarem sem 52,4% das UTIs e 40% dos leitos clínicos por inadimplência do poder público, com a mesma intensidade que realça um princípio, expõe uma contradição.

O governo pode ter suas explicações como a necessidade de conferência de fatura de serviços. E nisto não erra. Até porque está full-time sob escrutínio do Ministério Público Federal, Estadual e Defensoria Pública. Ou ter o plano B.

É, entretanto, paradoxal que atrase três meses de pagamento de faturas de serviço essencial na pandemia, arriscando-se, por conseguinte, a consequências mais graves, a fazer uso do superávit financeiro que vem registrando. Como faz prova inconteste a abertura, há dois dias, de créditos adicionais aos poderes à ordem de R$ 288 milhões, remanescentes do excesso de arrecadação do exercício anterior.

Como é evidente, à população interessaria um governo que economize mais e gaste de menos. O recurso público é caro e não há certeza da previsibilidade da receita. Daí que, não raro, trabalharem as administrações ajustadas com recurso que ainda vai entrar nos cofres.

Neste aspecto, o governo do Estado fez o dever de casa: registrou superávit financeiro e orçamentário no primeiro quadrimestre, reduziu passivos patrimoniais, dívida consolidada e o comprometimento das receitas com pessoal caiu mais ainda. Retrocedeu a índices de quase duas décadas. Não é pouco.

Compatibilizar o pagamento de despesas públicas com as receitas, com efeito, tem relevância igual ao seu ajustamento. Isto porque dos fornecedores e prestadores de serviços dependem grande parte dos empregos e da movimentação econômica que, por seu turno, manda de volta o gasto na forma de mais impostos.

Deixando correr frouxa a inadimplência,  a qualquer título e com dinheiro em caixa, o governo se predispõe a ser tratado como insolvente que não é. Ou mesmo sem liquidez, que também não é o caso, como está aí a demonstrar em contrário a elevação das receitas tributárias e de transferências. 

O expediente reduz sua credibilidade, alcançada com o esforço fiscal que tem desenvolvido no triênio sob o comando de Mauro Carlesse. E, por outro lado, ocupa a administração de problema que ela própria poderia evitar já que existiriam gargalos maiores interceptando o desenvolvimento do Estado.

Um deles, o fundo previdenciário dos servidores públicos que registrou em 2020 um passivo atuarial de R$ 47 bilhões. Uma vez e meia o PIB estadual. Um fundo que torrou em dois anos meio bilhão de sua poupança para bancar aposentadorias e pensões. 

E que não ajustado levará a maiores dificuldades a população do Tocantins obrigada por lei a bancar as mesmas aposentadorias de beneficiários com salário da ativa caso o Igeprev vá à falência que parece não estar muito distante com esse passivo de quatro dezenas de bilhões.