A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ouvir o presidente Michel Temer em um inquérito sobre suspeitas de irregularidades em um decreto do setor portuário. Raquel solicitou também o registro de entrada e saída no Palácio do Planalto ao longo deste ano de citados em investigações, entre eles o ex-assessor especial da Presidência José Yunes e o coronel João Baptista Lima Filho, ambos amigos de Temer.

Para Raquel, as investigações sobre o Decreto dos Portos devem ser concluídas em 60 dias. O inquérito no Supremo apura se a Rodrimar, empresa que opera no Porto de Santos, foi beneficiada pelo decreto assinado por Temer em maio, que ampliou de 25 para 35 anos as concessões do setor, prorrogáveis por até 70 anos. Além do presidente, são investigados Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-assessor de Temer e ex-deputado federal, e Antônio Celso Grecco e Ricardo Conrado Mesquita, respectivamente, dono e diretor da Rodrimar.

O ex-procurador-geral Rodrigo Janot pediu a abertura das investigações em junho após análise de documentos apreendidos na Operação Patmos, que deflagrou o caso J&F em maio, e interceptações telefônicas de Loures com Temer tratando sobre o decreto. Os investigados são suspeitos dos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e corrupção passiva. O relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, autorizou o inquérito no dia 12 do mês passado e caberá a ele decidir se Temer deve depor e se será por escrito ou pessoalmente.

Além do presidente, de Loures, Grecco e Mesquita, Raquel pediu o depoimento do subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha; do executivo da J&F Ricardo Saud; e de Edgar Safdie, suspeito de intermediar o recebimento de propinas. Yunes e Lima Filho, citados em relatório da Operação Patmos, também estão entre as solicitações de oitivas da procuradora-geral.

“A decisão que autorizou a instauração consignou que a interceptação dos diálogos travados entre Rodrigo Loures e outros interlocutores apontou para a possível prática de crimes de lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva, pois, em diversas das conversas, seria possível depreender que Rodrigo Loures teria apontado os nomes de Ricardo Conrado Mesquita e Antônio Celso Grecco, ambos vinculados à empresa Rodrimar, como intermediários de propinas que seriam pagas ao próprio Loures e ao presidente da República, Michel Temer”, escreveu Raquel, em despacho.

A procuradora-geral requereu ainda a obtenção do registro de doações eleitorais feitas pela Rodrimar e seus sócios para Temer, PMDB nacional e PMDB paulista em 2014 e 2016.

“Nova postura”

Nesta segunda-feira (02), Temer usou uma rede social para dizer que Raquel fez o que ele sempre pediu: “Permitir que pudéssemos nos manifestar previamente no procedimento, respeitando o estado democrático de direito”. E completou: “Muito bom que a PGR agora tenha uma nova postura, sem querer parar o Brasil com denúncias vazias e irresponsáveis”.

A Secretaria de Comunicação Social da Presidência informou hoje, em nota, que Temer vai responder aos questionamentos sobre o Decreto dos Portos. Auxiliares do presidente classificaram o pedido como “natural” por respeitar procedimentos jurídicos. Segundo um interlocutor de Temer, o caso é fantasioso e a procuradora-geral está cumprindo o seu papel.

A Rodrimar informou que, em 74 anos de história, “nunca recebeu qualquer privilégio do poder público” e seus executivos “estão, como sempre estiveram, à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento que se fizer necessário”.

A defesa de Rocha Loures informou que só vai se manifestar depois de notificação oficial. A reportagem não obteve resposta da Casa Civil nem de Yunes. O coronel Lima Filho não foi localizado.

Senado desafia STF e vota afastamento de Aécio

Em um desafio ao Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), manteve para esta terça-feira (02) a votação que deve derrubar o afastamento do mandato e o recolhimento noturno impostos pela Corte ao senador Aécio Neves (PSDB-MG). A decisão foi tomada mesmo após a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, sinalizar com um acordo para evitar uma crise institucional e marcar para a semana que vem o julgamento de uma ação que pode pacificar o assunto.

A questão, que será julgada no dia 11 pelo plenário do Supremo, é se o Congresso deve ou não dar aval a medidas cautelares contra parlamentares, como as que foram impostas a Aécio. Eunício, que até o fim de semana estava propenso a adiar a votação e esperar o resultado do STF, mudou de ideia e comunicou a decisão a Cármen hoje. Ao final do encontro, voltou a pregar o entendimento. “A presidente Cármen tem pensado parecido com o que eu penso. Que não adianta os poderes fazerem enfrentamento. Os poderes são independentes, mas têm de ser harmônicos”, disse Eunício.

Apesar do discurso conciliatório, Eunício defendeu a prerrogativa do Senado de deliberar sobre o tema. “Os poderes são independentes entre si. Nem o Congresso que faz as leis é superior a qualquer outro poder. Nem qualquer outro poder é superior ao Congresso, que avalia também inclusive impeachment de outras autoridades, como ministro do Supremo, procurador-geral da República, cassação do presidente da República.”

Hoje, o PSDB e a defesa de Aécio ajuizaram um mandado de segurança em que pedem a suspensão do julgamento que determinou as medidas contra o tucano.

O ministro Edson Fachin, que havia sido designado relator do mandado, decidiu encaminhar a Cármen Lúcia o caso para redistribuição. A decisão ocorreu depois de um questionamento da defesa pelo fato de Fachin ter sido o relator do primeiro afastamento do tucano. 

Uma decisão favorável a Aécio evitaria o desgaste de o Senado derrubar as restrições impostas pelo Supremo. 

Juiz não homologa acordo de Mantega

O juiz Ricardo Leite, da 10.ª Vara Federal de Brasília, negou a homologação de um acordo com o Ministério Público Federal (MPF) em que o ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, poderia evitar contra si um eventual decreto de prisão. A informação foi confirmada hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Mantega foi titular da pasta nos governos dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. O ministro é alvo da Operação Bullish, investigação sobre supostas irregularidades em empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do BNDES Par, à JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista.

Em junho, durante depoimento à Polícia Federal, Joesley afirmou que Mantega agiu em benefício da JBS em operações ligadas ao BNDES. Depois, em setembro, o ex-ministro foi preso temporariamente, mas a prisão foi revogada na tarde do mesmo dia pelo juiz Sérgio Moro.

O ex-ministro e o Ministério Público Federal do Distrito Federal (MPF-DF) haviam firmado acordo, por meio do qual Mantega passaria informações sobre operações do BNDES em troca de evitar sua prisão. Esse termo é diferente de uma delação premiada, na qual o colaborador admite o cometimento de crimes em troca de benefícios, como a redução de pena ou progressão de regime.

No Termo de Compromisso, a pessoa não precisa reconhecer crimes ao fornecer informações, assim não havia obrigatoriedade de Mantega confessar nenhuma prática ilegal. A decisão do juiz, ainda sob sigilo, de não homologar o acordo, invalida esse processo.
O criminalista Fábio Tofic Simantob, que defende o ex-ministro, disse que a decisão não altera o acordado. “Na prática não muda muita coisa. Pois permanece o compromisso escrito do Ministério Público Federal em não pedir a prisão.”