Mais de 300 pessoas - na maior parte deles, bispos, padres e freiras - lotaram a capela de Nossa Senhora Aparecida, dentro do Pontifício Colégio Pio Brasileiro, em Roma, na tarde deste sábado, 12 de outubro. Ali ocorreu a tradicional missa, em português, em honra à santa, considerada a padroeira do Brasil. 

Uma comitiva de políticos brasileiros, que está em Roma desde sexta-feira para acompanhar a canonização de Santa Dulce dos Pobres, marcada para domingo, foi convidada - mas ninguém compareceu.

Liderados pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, os políticos estiveram no Colégio Pio Brasileiro na manhã de sábado. Participaram de uma oração, a Liturgia das Horas. Foram convidados à missa da padroeira - e, ao longo do dia, religiosos ligados ao Vaticano comentavam que eles eram aguardados na cerimônia.

“Quero que esta saudação chegue ao coração das autoridades convidadas para a celebração, que foram recebidos aqui pela manhã”, comentou o arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, durante a homilia. Atual presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ele foi o celebrante da missa festiva. A bandeira do Brasil permaneceu hasteada à esquerda do altar durante toda a cerimônia. 

Com duração de 1h45, a missa teve a presença de boa parte da cúpula brasileira da Igreja Católica, entre eles o cardeal dom Geraldo Majella Agnelo, arcebispo-emérito de Salvador, antigo Primaz do Brasil, e o cardeal Dom Odilo Pedro Scherer, arcebispo de São Paulo. Participaram também dezenas de padres sinodais - que estão em Roma por conta do Sínodo dos Bispos Sobre a Amazônia. 

No fim da missa, Irmã Dulce também foi saudada. Um ícone dela, impresso, foi levado ao altar e ela foi chamada já de Santa Dulce dos Pobres, com ênfase no fato de que "será canonizada amanhã". 

Scherer chegou meia hora antes da cerimônia e circulou entre os bancos da assembleia, sendo cumprimentado e conversando animadamente com diversos padres e freiras. A maior parte dos presentes eram brasileiros que residem em Roma. 

Chamado pelos religiosos de “pedacinho do Brasil em Roma”, o Colégio Pio Brasileiro foi fundado em 1934. É uma instituição mantida pela CNBB a cerca de 4 quilômetros do Vaticano. Dedica-se à formação de presbíteros. Azevedo é um exemplo e ex-aluno: estudou ali logo que se ordenou padre, aos 23 anos - e fez questão de ressaltar a qualidade do ensino em uma de suas falas durante a missa.

Ao longo da celebração, o presidente da CNBB fez vários comentários indiretos sobre a atual situação conturbada da política brasileira. “É um momento desafiador para o mundo, mas sabemos, especialmente para a sociedade brasileira”, disse, no início da homilia. “Estamos em um caminho de altos e baixos, de dificuldades pessoais e de toda a sociedade e ela [referindo-se à Nossa Senhora Aparecida] caminha conosco”, afirmou, minutos mais tarde. “A Igreja tem, por razão de fé, e não por política ou ideologia, a missão de ser presença profética, de sabedoria e compromisso com a justiça”, ressaltou o religioso. 

Durante a oração da comunidade, uma das preces apresentadas pela leitora pedia especialmente para que o povo brasileiro não desanime frente às adversidades do momento atual.

Azevedo também citou, em vários momentos, o Sínodo Sobre a Amazônia. “Aquilo que conseguimos intuir no caminho será modelar para toda a Igreja, e não apenas para a Amazônia”, disse. Ele usou a metáfora dos “pulmões”, tão presente quanto as pessoas se referem à floresta, ao enfatizar as necessidades de ânimo dentro do catolicismo. “A Igreja do Brasil precisa de muitos pulmões para respirar e dar conta de sua caminhada. E o Pio Brasileiro é um pulmão importante”, afirmou.

O governo brasileiro e o Vaticano têm batido de frente, sobretudo em questões ambientais. Especula-se inclusive que esta tenha sido a principal razão pela qual o presidente Jair Bolsonaro resolveu não ir à missa de canonização.

Dentro do atual contexto de polarização agressiva da política brasileira, o atual presidente da CNBB foi vítima menos de 24 horas após assumir o cargo, em maio. Um vídeo viralizou em grupos de WhatsApp afirmando que ele era “mais um que segue a Teologia da Libertação e seus desdobramentos, como a ideologia de gênero (sic)”.

Azevedo também foi acusado de não ser “mais um petista, dilmista”. Uma das primeiras ações dele ao assumir o cargo, para o qual foi eleito até 2023, foi visitar o presidente Jair Bolsonaro, em 29 de maio - segundo ele afirmou na época, um encontro “cordial e de cortesia”.

Na manhã de sábado, quando a comitiva visitou o Pio Brasileiro, Azevedo não estava. Participante do Sínodo, ele viajou às pressas para o Brasil nesta semana para celebrar as exéquias do cardeal e arcebispo emérito de Belo Horizonte dom Serafim Fernandes de Araújo, morto dia 8. Ele retornou a Roma no início da tarde de hoje - a tempo de presidir a missa da padroeira. 

No site oficial do Palácio do Planalto, a última informação a respeito da agenda do vice-presidente foi a chegada a Roma, ontem, sexta-feira. No comunicado divulgado à imprensa na tarde deste sábado pela Santa Sé, o general Hamilton Mourão consta como representante do governo brasileiro esperado pelo Vaticano na cerimônia de canonização de Santa Dulce dos Pobres, na manhã de domingo.