Eu gostaria de começar falando sobre a polêmica em torno do artigo publicado pela Folha. Como é que o senhor está se sentindo a esse respeito? O tempo que passou por aqui foi suficiente para formar uma opinião sobre Palmas?

Me arrependi muito de ter escrito aquele texto. Não reflete o que penso e sinto a respeito da cidade e das pessoas, por quem sinto um enorme carinho. Escrevi, na maior pressa e com a cabeça totalmente focada nas filmagens, um texto leviano. Peço desculpas àqueles que se ofenderam. Filmar em Palmas – e no Tocantins – tem sido uma experiência maravilhosa e inesquecível para mim e para a equipe.

 

Como o senhor está lidando a repercussão e o que escreveria sobre Palmas se tivesse outra oportunidade?

Fiquei chateado comigo mesmo. Nosso País passa por um momento difícil e eu contribui, com um texto superficial e leviano, para aumentar o mar de lama e os desentendimentos. Aproveito a oportunidade desta entrevista para lembrar o carinho que recebemos filmando em Palmas, dos atores maravilhosos com quem trabalhamos e dos lugares lindos e inesquecíveis onde filmamos. Espero ser perdoado e poder voltar aqui novamente para reencontrar os amigos dos quais, mesmo antes de partir, já sinto saudades. Quero também agradecer ao Paulo Vieira que, apesar de ficar contrariado com a minha coluna, escreveu uma carta respeitosa.

 

Eu queria perguntar agora sobre o filme. Como é retratar a história de um matador como Júlio Santana sem que ela se torne uma apologia?

Não acredito que exista uma possível apologia para um matador de aluguel. Mas existem razões em nossa sociedade para que a pistolagem exista. A impunidade, a corrupção política, a proliferação de armas de fogo e a desigualdade social, entre outras. Mas nosso filme não quer explicar o mundo - ele questiona o mundo, através das atribulações do nosso protagonista pistoleiro. O filme fala tanto da sacralidade da vida e do amor quanto fala da morte e da violência. Para falar da luz temos que entender a escuridão.

 

O fato do texto de Klester Cavalcante, autor do livro que originou o filme, ser rico em detalhes, com uma narrativa quase cinematográfica, facilita o trabalho do roteirista e da direção? O senhor já tinha trabalhado antes com o roteirista George Moura?

Sim, o livro foi um excelente ponto de partida. O livro nos trouxe os fatos e as minúcias a partir dos quais começamos a trabalhar para construir o universo do filme. Esta foi a minha primeira experiência de trabalho com o George Moura, com quem escrevi o roteiro.

 

Como vocês conseguem organizar o caos em torno da vida do protagonista?

Quem deveria organizar o caos são as autoridades. Nós somos só contadores de histórias, querendo mostrar complexidades e paradoxos. O filme é um retrato dessa expiação, deste conflito interior dostoievskiano.

 

Quais são os limites entre a ficção e a história?

Acredito que toda história - inclusive a própria ‘história' - seja pelo menos em parte fictícia. A vida e as mortes do nosso matador pertencem tanto a uma dimensão histórico-social como a uma dimensão mitológica e universal.


As cenas são violentas?

Muito. Mas também tem muita ternura, amor e compaixão.

 

Por que a produção escolheu o Tocantins para as gravações do filme sendo que Júlio é maranhense?

Essa é uma história que poderia se passar em qualquer parte do Brasil. Escolhemos Palmas e o Tocantins porque aqui encontramos cenários maravilhosos, variados e pouco explorados como o Jalapão selvagem e o Brasil novíssimo de Palmas. Esses dois extremos nos ajudam a contar a trajetória visualmente.

 

O senhor tem trabalhado com alguns atores jovens e outros muito experientes nesse filme. Essa geração de agora, o que o senhor acha dela?

Encontramos em Palmas excelentes atores. Gente motivada, inspirada e corajosa.

 

Na sua opinião, qual é o melhor filme produzido no Brasil até hoje?

Temos em nossa cinematografia alguns excelentes filmes. Agora me vem em mente alguns, como por exemplo Cabra Marcado Para Morrer, do Eduardo Coutinho; os dois Tropa de Elite, do José Padilha; O Céu de Suely, do Karim Aynous.

 

Mudando um pouco de assunto, qual é a análise que o senhor faz do desenvolvimento do quadro cultural brasileiro? Que sugestões daria para melhorar a situação de abandono total que está a cultura no Brasil?

Entendo pouco de política e moro fora do Brasil há 34 anos. Prefiro não opinar. Mas somos uma sociedade muito doente. Basta olhar os dados da violência em nosso País para entender isso.